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Estado

O Ministério Público Federal no Tocantins apresentou à Justiça Federal uma ação por improbidade administrativa contra o atual governador do Tocantins, Marcelo Miranda, por irregularidades na transferência da gestão de 14 hospitais comunitários à iniciativa privada. Mais sete pessoas são citadas na ação. A fraude culminou com um termo de parceira firmado em agosto de 2003 com a Oscip Brasil, para prestação de serviços de administração nos hospitais pelo valor de trezentos mil reais mensais.

A Oscip Brasil foi contemplada sem qualquer justificativa plausível, e se transformou apenas numa prestadora de serviços e não numa parceira do estado. O termo de parceria assumiu a essência de um contrato administrativo, sobretudo porque o valor de trezentos mil reais era destinado somente aos gastos administrativos da própria Oscip, não estando incluídas neste valor a manutenção dos hospitais. Para estas despesas, foram firmados convênios para repasse de verbas federais de mais de 9,5 milhões de reais, além de a Oscip ser cadastrada como entidade filantrópica perante o sistema SUS/FNS, e ter passado a receber diretamente os recursos sem mais necessitar de convênios.

O único certificado de serviços prestados apresentado pela Oscip Brasil refere-se a um contrato com o Banco do Estado do Espírito Santo para realizar ações na área de tecnologia de processos bancários e solução de problemas operacionais. Não detinha experiência na área da saúde ou qualquer elemento que pudesse recomendar sua contratação. Mesmo assim, o Estado preferiu contratar a Oscip de forma temerária, sem garantia que os hospitais do Tocantins seriam geridos com o profissionalismo que exige o direito social da saúde.

Durante o período em que a Oscip esteve à frente dos hospitais, houve desabastecimento por falta de pagamentos aos fornecedores, o que gerou a prática de outras irregularidades constatadas em auditoria por técnicos do Tribunal de Contas da União, inclusive a incompetência gerencial que levou à inadimplência para com fornecedores, inviabilizando a manutenção da rede hospitalar estadual. Esse motivo levou à rescisão unilateral do contrato de terceirização, sendo a Secretaria de Saúde obrigada a assumir a gestão da saúde, como deveria ter feito desde o princípio. A gestão catastrófica foi reconhecida pelo próprio procurador geral do Estado à época, José Renard, que em despacho para viabilizar a contratação de empresa para a prestação de serviços ao Hospital de Referência de Gurupi, justificou a medida com a situação de quase colapso em que entrou a rede pública hospitalar do estado em face dos problemas advindos com a Oscip.

Desaparelhada e com problemas deixados pela entidade terceirizada, a Secretaria Estadual passou a gerir as despesas necessárias à manutenção da rede hospitalar com abuso de suprimento de fundos de valores elevados, contratação sem licitação, contratação verbal e celebração de convênios com entidades privadas para a realização de objetos típicos de licitação. Em janeiro de 2006, a Secretaria da Saúde tinha mais de 70 milhões de reais em recursos de convênios, cujas contas ainda não haviam sido prestadas.

Recomendação ignorada

Diante de várias irregularidades constatadas no processo de contratação da Oscip Brasil, em 2004 o Ministério Público Federal enviou recomendação ao secretário de Saúde do Tocantins para que fosse rescindido o termo de parceria. A suposta rescisão foi anunciada pelos veículos de comunicação, mas posteriormente o MPF tomou conhecimento que a rescisão não tinha passado de um desconcertante engodo pregado à população tocantinense e uma estratégia para o estado repassar recursos públicos federais/estaduais para os cofres da Oscip sem maiores alardes, já que, para todos os efeitos, não mais existia o termo de parceria. Os termos do documento deixam claro que o Estado do Tocantins pretendia continuar a fazer repasses ilegais de recursos públicos oriundos do Fundo Nacional de Saúde, mesmo após ter sido recomendado pelo MPF e após ser divulgado através de publicação oficial a rescisão da parceria.

Depois de quatro anos do fim do termo de parceria, a Oscip ainda não prestou contas dos recursos recebidos, o que impede aos órgãos de controle aferirem se os recursos repassados foram desviados ou aplicados nos hospitais. Não se sabe até hoje qual o real destino dos recursos repassados à Oscip, tendo a Secretaria de Saúde informado, em ofício datado de 10 de junho de 2008, que não constam relatórios de prestação de contas da Oscip Brasil, no que se refere aos autos citados. Apesar da obrigação da prestação de contas recair sobre a Oscip, os gestores da saúde pública contribuíram para este estado de coisas, já que não cobraram a comprovação dos gastos efetuados, e continuaram o repasse de milhões de reais mesmo sem a prestação de contas dos recursos anteriormente transferidos.

Além de Marcelo Miranda, são demandados pela ação Petrônio Bezerra Lola e Henrique Barsanulfo Furtado, que exerceram ambos o cargo de secretário de Saúde em algum momento em que a Oscip Brasil este à frente da gestão dos hospitais. Márcio Junho Pires Câmara, Bruno Barreto Cesarino, José Renard Pereira de Melo e Thaís Ramos Rocha também são responsáveis por dar suporte jurídico a transações ilegais. Eduardo Henrique Saraiva Farias e a pessoa jurídica Oscip Brasil foram os verdadeiros beneficiários dos atos praticados, tendo atuado desde o início das fraudes. Competem a eles, também, responderem pela não prestação de contas dos recursos recebidos, dever básico de todo aquele que gere bem alheio.

Além da improbidade administrativa,os demandados também devem ser responsabilizados pelo dano moral coletivo causado ao Estado do Tocantins e à população tocantinense, que tiveram na direção de seus hospitais uma organização sem a menor credibilidade e competência, que só assumiu a função por subjetivismo dos gestores da saúde pública. Este ato das autoridades estaduais gerou inúmeros danos à gestão da saúde pública, pois a gerência os hospitais do Tocantins foram administrados de forma desastrosa, com malversação de recursos públicos, o que gera danos morais coletivos que devem ser indenizados.

O Ministério Público Federal requer a condenação de todos os citados na ação ao ressarcimento integral do dano, à perda da função pública que estejam exercendo à época do proferimento da sentença, à suspensão de seus direitos políticos, à proibição de contratar com os poderes públicos, à proibição de receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, e pagamento de multa civil. O valor dado à causa, pelos quatro procuradores da República que assinam a ação, é de 20 milhões de reais.

 

Fonte: MPF/TO