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Pesquisadores investigam como melhorar a qualidade da carne bovina produzida no Brasil

Pesquisadores investigam como melhorar a qualidade da carne bovina produzida no Brasil Foto: Wikimedia Commons

Foto: Wikimedia Commons Pesquisadores investigam como melhorar a qualidade da carne bovina produzida no Brasil Pesquisadores investigam como melhorar a qualidade da carne bovina produzida no Brasil

O Brasil tem o maior rebanho comercial de gado bovino no mundo, com mais de 225 milhões de cabeças, mas apenas 20% da produção brasileira é destinada à exportação. Isso faz com que a carne bovina seja apenas o décimo produto exportado pelo Brasil, depois da soja, minério de ferro, petróleo, açúcar de cana, automóveis, frango, celulose, farelo de soja e café.

Especialistas apontam que as exportações poderiam ser muito mais expressivas caso a carne bovina brasileira tivesse qualidade similar à dos produtos australianos, argentinos ou uruguaios. Para melhorar a qualidade do gado de corte, entra em cena a ciência. Além de se conseguir carne mais macia, outro objetivo das pesquisas é melhorar a produtividade. Para isso, empregam técnicas de melhoramento genético e a criação de animais que ganhem peso mais rapidamente ou que resistam melhor a doenças.

“O Brasil é o segundo maior produtor mundial de carne bovina, em um setor com faturamento superior aos US$ 5 bilhões em 2016. O custo de produção do bovino brasileiro é um dos mais baixos do mundo, mas, para ampliar sua importância no mercado, é necessário adequar a produção de carne aos padrões estabelecidos pelos importadores. Entre os quesitos de qualidade, a maciez, a quantidade e o tipo de gordura intramuscular podem influenciar as características sensoriais e o valor nutricional da carne bovina”, disse Luciana Correia de Almeida Regitano, pesquisadora da Embrapa Pecuária Sudeste ( Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária) e docente do programa de Pós-graduação em Genética Evolutiva e Biologia Molecular da Universidade Federal de São Carlos.

Regitano explicou que, no Brasil, mais de 80% do gado de corte é nelore. A raça, da subespécie Bos taurus indicus, é originária da Índia, mas não produz carnes tão macias quanto raças como a angus (Bos taurus taurus), de origem europeia, que apresenta mais gordura intramuscular. “O nelore tem menos peso e menor produtividade, carne menos macia e, consequentemente, preços mais baixos”, disse.

“Uma preocupação importante da indústria de carne é a despesa com alimentação do rebanho, que pode chegar a 40% do custo de produção. Aumentar a eficiência na alimentação é uma maneira de evitar a expansão da área ocupada pela criação de gado de corte, que no Brasil é de mais de 168 milhões de hectares. Ou seja, uma maior eficiência tem impacto tanto no custo de produção quanto no meio ambiente”, disse Regitano na Fapesp Week Nebraska-Texas, que ocorre até 22 de setembro nas cidades de Lincoln e Lubbock.

Regitano coordena o Projeto Temático “Bases moleculares da qualidade da carne em bovinos da raça Nelore”, apoiado pela Fapesp. O projeto de pesquisa dá sequência a um anterior, que permitiu identificar regiões genômicas associadas a características de produção e de qualidade da carne.

“Inicialmente, criamos cerca de 800 animais durante três anos em cinco fazendas, do nascimento ao abate, e medimos características fenotípicas, como crescimento, produção e qualidade da carne e eficiência alimentar. Também coletamos amostras de DNA e submetemos essas amostras à genotipagem de alta densidade, para verificar mutações específicas que cobrem todo o genoma. Analisamos mais de 700 mil mutações pontuais espalhadas pelo genoma, o que nos forneceu informação sobre a segregação dos segmentos cromossômicos”, disse.

“Em 2012, tivemos outro projeto aprovado pela Fapesp que permitiu expandir o projeto inicial e analisar, em amostras de tecido, a sequência completa do RNA mensageiro e de todos os microRNAs presentes no tecido. MicroRNAs são pequenas moléculas de RNA que modulam como os RNA mensageiros serão traduzidos em proteínas”, explicou Regitano. Também foram analisadas as proteínas dos tecidos coletados.

“Conseguimos obter um conjunto de dados sobre 45 fenótipos diferentes e sequenciamos o RNA mensageiro e o microRNA de 200 amostras de músculo e 30 de fígado, além de proteínas em 65 amostras de músculo. Com apoio do CNPq [Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico], também conseguimos sequenciar o genoma completo, cada nucleotídeo do genoma, de 20 animais. Isso forneceu um conjunto de dados muito importante, no qual obtivemos para um mesmo animal, camadas múltiplas de informação genômica”, disse.

Ferramentas genômicas

“Entre os objetivos da pesquisa atual, estão complementar as análises de associação genômica para incluir novos fenótipos, integrar as análises do genoma funcional (RNA, microRNA e proteínas), avaliar o significado de CNVs e capacitar recursos humanos nas áreas de bioinformática e genômica”, explicou Regitano.

Variação no número de cópia (CNV) é definida como uma classe de alteração estrutural genômica que inclui amplificações e perdas de uma região específica, o que pode envolver um ou mais genes completos. “Estamos estudando como essas alterações influenciam a expressão de todos os genes expressos em músculo e os fenótipos avaliados”, afirmou a pesquisadora.

A riqueza dos dados obtidos levou à publicação de uma série de artigos que ampliam o conhecimento sobre possibilidades do uso de ferramentas genômicas para levar a ganhos de qualidade e de produtividade na produção de carne bovina.

Em julho, em artigo na BMC Genomics, Regitano e seu grupo identificaram genes, caminhos metabólicos e processos biológicos envolvidos na diferenciação, proliferação, conversão de proteínas, hipertrofia e síntese de lipídeos relacionados à área de olho de lombo, uma medida correlacionada com a musculosidade do animal, e à espessura de gordura subcutânea, ambas características que impactam diretamente a qualidade da carcaça e produtividade de carne.

Os resultados do estudo destacam processos moleculares relacionados ao depósito de músculos e de gordura, que são características economicamente importantes para a produção de carne.

Em outro artigo, publicado em 2016 na PLOS ONE, Regitano e colaboradores descreveram uma análise genômica ampla de CNVs obtidos de 723 bois. Os pesquisadores identificaram mais de 2,6 mil regiões que representam cerca de 6,5% do genoma completo dos animais.

Os resultados representaram o primeiro estudo compreensivo das variações no número de cópia do gado nelore, com a identificação de regiões em que alterações genéticas poderão se mostrar importantes para a criação de animais com carne mais macia, com melhor possibilidade de exportação e maior preço. (Fonte: Agência Fapesp)