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Opinião

Depois de anos parado no Congresso e polêmicas ora relevantes, ora irrelevantes, o Estatuto da Igualdade Racial foi sancionado pelo presidente Lula nesta terça-feira, 20. Festa para as várias entidades de movimento negro em todo país e um compromisso “concreto” do Estado brasileiro com a população negra.

Concreto sim, o fim não. Cerca de 90 milhões de pessoas serão diretamente beneficiadas com a aprovação do Estatuto, consta numa matéria que li num site de renome nacional. Como podemos afirmar que um documento com 65 artigos que busca promover a igualdade no país pode beneficiar apenas os negros?

Esse é um dos principais problemas em torno na causa da Igualdade racial: a abordagem. O tema é trabalhado como se fosse apenas um anseio particular dos negros, sendo que os ideais da “liberdade e igualdade” precisam ser semeados por todos os que vivem no país.

Não é só de reproduzir estereótipos, piadinhas, distribuir por aí a falta de informação com relação à várias temáticas étnico-raciais que eu estou falando.

É uma questão de direitos que foram violados no passado e que infelizmente não serão reparados apenas com a aprovação do Estatuto. Este documento pauta a demanda dos movimentos ligados às religiões de matriz africana ainda alvo da “marginalização histórica”, das várias modalidades da cultura e preservação de todo um legado ancestral, das tantas comunidades quilombolas distribuídas pelo país e pelo Tocantins e outros assuntos.

É mais profundo... envolve mortes de jovens nos grandes centros, a falta da participação da mulher negra nos espaços de poder, as situações ainda precárias que vivem alguns quilombos e outras coisas mais que estão além do mundo perfeito das novelas.

Num país ainda tão “fraco” de educação, saúde e segurança , eixos principais para o bem-estar social, falar em Igualdade Racial e Direitos humanos “soa” algo não tão importante. No entanto são áreas interligadas.Quem respeita as diferenças notadamente será um sujeito mais aberto para as questões sociais.

Durante o processo que antecedeu a aprovação do estatuto vi sentimentos diferentes de várias pessoas envolvidas no processo. Vi um ministro ansioso pela aprovação, vi líderes de movimentos protestando pela demora e vi principalmente muitos vestirem a camisa da causa em prol de um mundo mais igualitário. Ontem vi o presidente Lula explanar sobre dívida histórica com o povo negro.

Mas não vamos nos iludir! A Igualdade continuará sendo um sonho para aqueles que apenas “assistem de camarote” os acontecimentos. Algumas modelos negras nas passarelas, atrizes protagonizando "Helenas" de Manoel Carlos, um presidente negro para os Estados Unidos, uma Copa do Mundo na África ...não se iludam, ainda não está tudo resolvido. Tudo isso são sinais de uma nova abordagem que vem surgindo em torno do negro.

O Estatuto veio mas agora o Estado precisa preparar a população para receber os “ideais “ desse documento. Essa atitude tem que vim dos políticos, das lideranças comunitárias, das escolas, dos formadores de opinião, dos pais...

A falta de conhecimento em torno do Estatuto não pode impedir que ele entre na prática e consiga o objetivo real de promover a igualdade.

Além da reparação social, os propósitos da Igualdade racial são baseados na conscientização. E esse ato de “lavar a mente” é como higiene pessoal, cada um faz do seu jeito. Enquanto esse trabalho de conscientização não for feito mesmo com o Estatuto a igualdade continuará sendo um ideal apenas para inglês ver. O que vem, de fato, com o Estatuto terá que ser construído daqui para frente.

*Maria José Cotrim é jornalista e articulista do Negroemdebate.blogspot.com