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Opinião

Na região, os moradores desconheciam qualquer mobilização de luta armada contra a ditadura militar. Esse e outros assuntos são rememorados em nossa "Memória do Tocantins - Primeiro Volume", obra a ser lançada nos próximos dias em Palmas, Porto, Gurupi e Araguaína.

Nos anos 70 somente as cidades de Araguaina e Gurupi mantiveram jornais impressos. No ano de 1973, passo a editar o semanário Tribuna da Amazônia (depois. O Estado do Tocantins, a partir de 1975), com a redação em Araguaína e impressão na vizinha cidade de Carolina. Na época fazia e refazia textos para não mexer com os milicos. Não havia nem rádio e nem televisão no norte goiano.

Algumas vezes era convocado pelo Batalhão da Polícia para esclarecer notas do jornal, mas a situação mais crítica foi quando um oficial do Exército exigiu minha presença ali para explicações sobre uma nota em que denunciava militares que protegiam grileiros. Na redação, passei a praticar a autocensura, antes da impressão do jornal, e não mais publicava denúncia de posseiros contra grileiros, mas orientava as vítimas a denunciar diretamente em Brasília.

Em Gurupi o jornalista pernambucano Buchinho (Antônio Poincaré Andrade, pai do prefeito Otoniel e do deputado Toinho) fez editar o jornal A Voz de Gurupi e começou a publicar uma série de denúncias contra funcionários da Rodobrás (empresa estatal para construção da Belém-Brasília) e de gente poderosa do sul de Goiás. Foi preso pelos militares como "subversivo" à Segurança Nacional. Mudou-se para a cidade de Porto Nacional, onde fundou o Porto Nacional Jornal, sendo eleito, depois, prefeito.

Por questão de direitos de posse, no Vale das Cunhãs, em Arapoema, o empresário Ademar "Boa Sorte" tem apoio do irmão Benedito, então deputado federal, e o recém-chegado à região Siqueira Campos é denunciado e preso no Batalhão da PM em Araguaína. Com a eleição do deputado Benedito para senador biônico, Siqueira viu ai uma lacuna para enfrentar os "Boa Sorte” na eleição para deputado federal.

Nas cidades havia os "informantes" (dedo-duro, araponga), moradores recrutados e pagos pelo militares para denunciar os "inimigos do governo". A gente que morava no norte goiano vivia um período de muita insegurança e muito medo porque a qualquer momento podia ser denunciado pelo "informante" como inimigo da ditadura... Nas estradas, os militares e seus agentes paravam os veículos para identificar os passageiros... Se fosse localizada arma de fogo ou o rosto do passageiro mostrasse alguma semelhança com as fotos dos "terroristas", o coitado do passageiro ficava detido para averiguação. Em Araguaína o barulho de helicópteros militares dia e noite tirava o sossego da gente.

Muitos estudantes da CENOG - Casa do Estudante do Norte Goiano foram presos em Porto Nacional e Pedro Afonso por apoiar as reformas de base do presidente João Goulart (Jango), principalmente da Educação e Agrária, para os posseiros. Em Porto Nacional, estudantes e professores foram vítimas de tortura física para denunciar os "terroristas" e seus colaboradores na região. O bispo Dom Alano e o professor Maya salvaram a vida de muitos inocentes.

O povo só foi entender a palavra "terrorista" após a Guerrilha de Xambioá (hoje chamada de guerrilha do Araguaia), com a execução do último guerrilheiro, em 1975...