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Polí­tica

A relatora da MP, Zenaide Maia, com Dr. Hiran (à esq.) e o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco

A relatora da MP, Zenaide Maia, com Dr. Hiran (à esq.) e o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco Foto: Waldemir Barreto/Agência Senado

Foto: Waldemir Barreto/Agência Senado A relatora da MP, Zenaide Maia, com Dr. Hiran (à esq.) e o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco  A relatora da MP, Zenaide Maia, com Dr. Hiran (à esq.) e o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco

O Senado aprovou nesta terça-feira (20) Projeto de Lei de conversão originado da Medida Provisória 1.165/2023, que recria o Programa Mais Médicos, permite prorrogação de contratos e cria indenizações de incentivo ao exercício da atividade em áreas de difícil fixação. O texto, que também garante a formação de especialistas em medicina de família e comunidade, segue para a sanção.

O objetivo da medida é diminuir a carência de profissionais de atenção primária em regiões prioritárias para o Sistema Único de Saúde (SUS). Segundo o governo, na época de criação do programa, mais de 4 mil municípios foram contemplados na Atenção Primária à Saúde (APS), com cerca de 18.240 médicos. Desde 2017, porém, o número de profissionais diminuiu, chegando a 8,6 mil médicos em 2023. Nos distritos sanitários indígenas, a cobertura de 100% foi reduzida a 58%.

A medida foi aprovada com várias mudanças feitas pelo Congresso, primeiro na comissão mista que analisou a medida, sob a relatoria da senadora Zenaide Maia (PSD-RN), depois na Câmara dos Deputados, no dia 14. Um dos temas mais polêmicos durante toda a tramitação foi a necessidade de revalidação dos diplomas para médicos (brasileiros ou estrangeiros) formados fora do Brasil.

O texto original da MP dispensava essa prova para a participação dos médicos no programa, e a dispensa foi mantida no texto de Zenaide. Assim, os médicos formados fora do Brasil não precisarão fazer o Revalida para participar do Mais Médicos. A prorrogação da participação no programa, no entanto, só será possível com a apresentação do diploma revalidado. Com a mudança aceita pela relatora, médicos sem a revalidação poderão permanecer atuando por quatro anos, não mais oito anos como no texto original.

Críticas

Contrário à dispensa da revalidação nos primeiros quatro anos do programa, o senador Dr. Hiran (PP-RR) apresentou destaque para que o texto passasse a exigir a inscrição do médico participante no Conselho Federal de Medicina do estado de atuação. Com isso, será necessário que esses médicos tenham o diploma revalidado para participar.

"É inadmissível que a gente possa aprovar nesta Casa algo que deixe a população brasileira à mercê de um profissional que não foi devidamente avaliado para prestar um serviço tão essencial à saúde das pessoas", argumentou o senador.

Para a relatora, a preocupação com as vidas dos brasileiros está acima da preocupação com a exigência do Revalida para médicos já formados no exterior. Na avaliação de Zenaide, o Senado não pode demonstrar fraqueza no momento de defender a vida de brasileiros que estão morrendo de mortes evitáveis.

"Estou vendo que, enquanto se discute isso aqui, centenas de brasileiros e brasileiras estão tendo AVC ou precisando amputar um membro porque não têm um médico que prescreva o remédio para diabetes ou hipertensão. Eu respeito aqui meu colega Hiran, mas acho que se tem que votar sem destaque. Eu entendo essa preocupação, isso é uma democracia. A gente tem que ouvir, mas tem que lembrar que, acima de qualquer lei, tem a vida", lembrou a senadora, antes da rejeição do destaque pelo Plenário.

O texto aprovado também prevê que o Revalida será aplicado a cada quatro meses. A prova de revalidação é composta por exame teórico e prova de habilidades clínicas, e o relatório de Zenaide havia dispensado a segunda fase para médicos que ficassem quatro anos no programa e que comprovassem aprovação nas avaliações periódicas. Essa dispensa foi retirada pela Câmara e a mudança foi confirmada pelo Senado. Assim, permanece a necessidade da prova de habilidades clínicas.

Na mesma linha da relatora, os senadores Alan Rick (União-AC) e Rogério Carvalho (PT-SE) criticaram critérios de aplicação das provas do Revalida e citaram a segunda fase da prova, que é aplicada com a participação de atores ou bonecos em estações de atendimento para que o profissional mostre suas habilidades. Tanto eles quanto o senador Carlos Viana (Podemos-MG) lembraram que os profissionais que participam do Mais Médicos são supervisionados e avaliados ao longo do programa. Os três senadores citaram a carência de profissionais em várias localidades do País.

"Nós estamos decidindo aqui se vamos manter o atendimento dessa população ou se nós vamos condenar o povo dos municípios mais pobres a ficar sem atendimento médico. O programa, além de formar, garante especialização, mestrado para esse médico que atua no programa, ou seja: ele sai dali muito mais capacitado para atender em qualquer outro programa do governo federal, então nós também garantimos a qualidade do atendimento para a população mais pobre", argumentou Alan Rick.

Já o senador Nelsinho Trad (PSD-MS) discordou da posição de seu partido para defender a aprovação do destaque de Dr. Hiran. Trad relatou ter sido demandado pelo Conselho Federal de Medicina e pela classe médica, à qual pertence, para defender a aplicação do Revalida. Para ele, o exame é uma forma de atestar a formação do profissional que vai atender a população.

Pelo texto aprovado, as regras se aplicam, ainda, à recontratação dos médicos participantes de ciclos ocorridos até dezembro de 2022, independentemente do período de atuação desses profissionais no Mais Médicos. O acesso deverá ocorrer por meio de editais.

Formação

Os médicos que atuarem no programa terão a oportunidade de aperfeiçoamento pela integração ensino-serviço, com a participação em cursos de especialização e atividades de ensino, pesquisa e extensão. A especialização será medicina da família e comunidade ou saúde indígena. Os cursos serão oferecidos pelas instituições de educação superior brasileiras vinculadas ao Sistema Universidade Aberta do SUS (UNA-SUS).

Com isso, o tempo de atuação no programa será aproveitado na formação. A carga horária semanal da formação é de 44 horas, sendo 36 horas para atividades nas Unidades Básicas de Saúde (UBS) e 8 horas para interação na plataforma do curso de especialização e nas atividades de aperfeiçoamento técnico-científico. O prazo dessa formação passa de até três para até quatro anos.

Para os médicos intercambistas que tenham obtido a revalidação de seus diplomas no Brasil, a MP permite a contagem do tempo de atuação no Mais Médicos como prova de título de especialista em medicina de família e comunidade. Esse tempo valerá ainda para cumprir requisitos de provas de concurso público, de exames de título de especialista ou para quaisquer outros processos seletivos que exijam comprovação de experiência em serviço no âmbito da atenção primária à saúde.

Incentivo

Outra novidade incluída pela MP é o pagamento de uma indenização para incentivar o médico participante a ficar mais tempo atuando em áreas vulneráveis ou de difícil fixação listadas pelo Ministério da Saúde. Está previsto o pagamento de três tipos de bolsas: bolsa-formação, bolsa-supervisão e bolsa-tutoria. O valor será de 20% do total recebido com bolsas no período de 48 meses, se atuar em área de vulnerabilidade indicada em ato do ministério; ou de 10% do total recebido no mesmo período, se atuar nos demais municípios.

Para médicos cuja graduação tenha sido financiada pelo Fundo de Financiamento Estudantil (Fies), a MP traz uma indenização maior a ser paga no lugar da outra. O valor total será de 80% do recebido em bolsas, se atuar em área de vulnerabilidade, ou de 40%, se atuar nas demais áreas, também por 48 meses. De acordo com o Poder Executivo, a indenização maior para esse grupo justifica-se porque “médicos beneficiários do Fies têm até 30% mais chances de atuar em municípios menores e de baixo IDH”.

O número de vagas disponíveis anualmente será estabelecido pelo Ministério da Saúde. Para a contagem de efetivo exercício necessário ao recebimento da indenização, a MP permite incluir os períodos de licença-maternidade, licença-paternidade e afastamento por até seis meses devido a violência doméstica, conforme decisão judicial.

A MP 1.165/23 prevê o pagamento de mais uma indenização ao médico graduado com financiamento do Fies caso ele, ao participar de programa de residência em medicina de família e comunidade pelos 24 meses sem interrupção, obtenha o título de especialista. O valor será equivalente ao saldo devedor do médico junto ao Fies no momento de ingresso no programa de residência.

De acordo com o governo, o impacto financeiro do projeto será de R$ 712,5 milhões em 2023 e de cerca de R$ 3 bilhões para os próximos anos, segundo o texto original da MP. Os recursos deverão vir do orçamento do Ministério da Saúde.

Outras regras

As bolsas e as indenizações não representam vínculo empregatício com a União e não implicam incorporação aos vencimentos para efeitos legais, além de não serem tributáveis pelo Imposto de Renda. Além disso, na comissão mista, a senadora acatou emenda do senador Oriovisto Guimarães (Podemos-PR) para prever que o pagamento se dará de forma direta a todos os médicos participantes, para eliminar a possibilidade de pagamento a governos estrangeiros, como ocorreu anteriormente no programa. A mudança foi elogiada por Oriovisto e por Rogerio Marinho (PL-RN).

Pelo texto aprovado, os distritos sanitários indígenas, as comunidades remanescentes de quilombos e as comunidades ribeirinhas serão considerados regiões prioritárias. Também para ajudar a diminuir a deficiência de profissionais, o texto de Zenaide Maia incluiu a possibilidade de uso de recursos de telessaúde quando necessário. Além disso, o Ministério da Saúde poderá implantar critério de seleção para redistribuição de médicos inscritos no mesmo estado com vagas não preenchidas.

Para as médicas participantes que estiverem recebendo licença-maternidade pelo INSS, a medida prevê o pagamento de uma complementação desse valor equivalente à diferença entre a bolsa e o benefício previdenciário pago pelo órgão. O complemento será pago por seis meses. Para os médicos, o texto concede licença-paternidade de 20 dias consecutivos, tanto pelo nascimento quanto pela adoção de filhos.

Outro benefício incluído pela relatora é a concessão de horário especial sem compensação de carga ao médico participante com deficiência ou que tenha cônjuge, filho ou dependente com deficiência, comprovada por junta médica oficial. Ainda segundo o texto aprovado, o regulamento do Mais Médicos definirá a reserva de vagas para médicos com deficiência ou pertencentes a grupos étnico-raciais, bem como critérios e normas pertinentes. (Agência Senado)