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Cultura

Foto: Ascom FCP

Foto: Ascom FCP

Alguns grupos urbanos se tornam ‘invisíveis’ socialmente, a exemplo dos usuários de drogas, em específico do Crack, um problema que atinge em maior grau as grandes cidades. Foi para este grupo que o artista visual curitibano André Luiz direcionou o olhar para realizar a exposição “Surgiram pedras no meu caminho", que será aberta nesta sexta-feira, 12, às 19h, na Galeria Municipal de Artes, no Espaço Cultural José Gomes Sobrinho. 

André Luiz pode ser considerado um dos poucos a tratar o vício do crack na produção contemporânea das artes visuais no Brasil. "O modo como ele maneja a temática direcionada para um dos principais compromissos do campo artístico provoca a reflexão sobre os mais variados assuntos da vida humana, bem como assume o compromisso de elaborar um sofisticado registro, no caso, de um tema que afeta um crescente segmento social’, afirma o curador Nei Vargas da Rosa, doutor em Artes Visuais.  

“A questão da drogadição é muito presente nas grandes cidades e,em especial, na cidade de São Paulo. Essa produção explora essa temática. A questão é tentar, por meio da arte, sensibilizar o expectador para os diversos problemas que circundam o uso do crack,inclusive, o preconceito das pessoas ao se depararem com os usuários. Trata-se de um problema muito maior do que o uso da droga”, ressalta André Luiz, selecionado pela Fundação Cultural de Palmas (FCP) no VI Salão Palmense de Novos Artistas.

Graduado em Filosofia, História, Desenho e Pintura, e Mestre em Educação e Novas Tecnologias, André Luiz apresenta um conjunto de obras que instigam a pensar nos aspectos que compõem o universo do crack em suas variadas acepções. Notas de dinheiro são transformadas no principal utensílio usado para queimar e inalar o crack, fazendo do cachimbo uma refinada alegoria para discutir a valoração da droga. Ao serem expostos em caixas de vidro transparente, o artista confere aos cachimbos a noção segundo a qual o dinheiro exerce poderes mesmo em ambientes regidos pelo abandono e degradação ultrajante.

O trabalho "Cinismo compassivo: entre pedras e afetos nas ruas" mostra de forma dura e crua a realidade diária em impressões em 3D das pessoas na Cracolândia, denunciando o modus operandi baseado na violência do poder público que culpabiliza os drogados e negligencia os traficantes, o corpo que esvanece derretido pelo uso da  droga, mas também revela um momento de alento oferecido por um cobertor que cobre a figura que dorme na rua, ainda que ali ela esteja submetida a todo tipo de violência. 

Já as pinturas trazem farto conjunto de reflexões, a começar pela própria fartura das obras que aponta um artista em seu pleno domínio da técnica da pintura, mostrando maturidade na escolha e composição da paleta, bem como maestria na execução dos planos. A representação da arquitetura de época abandonada pelo descaso à memória coletiva e histórica, o planejamento urbano caótico e descontrolado, o trânsito que paralisa o fluxo da cidade, o lixo que suja as ruas e apequena a existência humana, as frágeis relações de sociabilidade que marcam um ambiente dominado pela desgraça. 

Estes aspectos transversais, ainda que inerentes ao universo da Cracolândia, são trabalhados por um artista com mais de 20 anos de exercício de pintura, que apresenta maturidade e equilíbrio no refinamento dos planos e na profundidade, na construção das figuras que compõem as pinturas em cores ou preto e branco. Destaque ao variados formatos, sobretudo, aos pequenos que são postos em chassis em forma de pallets, que acentuam a dramaticidade do assunto de sua investigação.

Assim, o artista alcança expressividade nas cenas trazidas pelo óleo sobre tela, revelando texturas e nuances que reforçam a atmosfera sombria e melancólica, conferindo de forma discreta e difusa um certo lirismo a um tema complexo. “Estes contrastes alcançados pelo domínio artístico são estratégias que André Luiz lança mão para convidar o público a pensar de forma mais humanizada e menos preconceituosa um capítulo dramático da realidade, que se instala sem escolher classes sociais, contas bancárias, educação, orientação sexual, religiosa e política”, conclui o curador. (Secom Palmas)