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Opinião

Mudar a cabeça do fazendeiro brasileiro e, assim, mudar a imagem negativa que a sociedade ainda tem dos produtores rurais, vistos por muitos como eternos dependentes de favores financeiros do governo e sistemáticos descumpridores da legislação trabalhista. Esta é a tarefa que se propõe a cumprir a senadora Kátia Abreu (DEM-TO) como primeira mulher eleita para a presidência da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA).

Aplica-se à atividade rural uma legislação trabalhista inadequada, porque foi elaborada para o trabalho urbano. A Consolidação das Leis do Trabalho, criada no início da década de 1940, sob a ditadura do Estado Novo, estabelece só uma forma de trabalho no País, com "vínculo empregatício de natureza contínua". É um regime de contratação de mão-de-obra particularmente inadequado e prejudicial para a atividade rural, caracterizada por trabalho sazonal e, em muitos casos, de curta duração.

Às falhas da legislação os produtores rurais respondem com o descumprimento das normas. A informalidade no campo chega a 70% da mão-de-obra ocupada. De uns tempos para cá, "todo mundo se lembrou de que (a legislação) deveria ser cumprida também no campo, sem ser adaptada ao meio rural", disse a nova presidente da CNA em entrevista ao Estado. O resultado está no número de autos de infração lavrados pelos fiscais do Ministério do Trabalho. Em seis anos do governo Lula, foram lavrados 15.258 autos em 1.217 fazendas. Isso vai acabar, prometeu a senadora. Assim, a modernização da legislação trabalhista, para adequá-la às características da atividade rural e às necessidades do trabalhador, será uma das frentes em que a nova presidente da CNA atuará, procurando abrir o diálogo sobre o tema com o governo.

A legislação ambiental também precisa ser cumprida, mas certas imposições devem ser revistas, diz a senadora Kátia Abreu. O que tem provocado fortes queixas dos fazendeiros é o Decreto 6.514, de 22 de agosto último, que regulamenta a Lei de Crimes Ambientais e impõe novas exigências e punições aos infratores. De acordo com a CNA, algumas dessas exigências podem inviabilizar culturas como as do arroz e da uva no Rio Grande do Sul.

"Se a legislação for cumprida, toda a cana plantada no Nordeste, que está num declive de 45 graus, tem de ser arrancada", também exemplificou Kátia Abreu.

Por isso, a CNA continuará empenhada, como está desde julho, em mudar dispositivos do decreto sobre crimes ambientais que inviabilizam a produção. Também está disposta a discutir com o governo a expansão e melhoria do sistema de armazenamento e escoamento da produção, para preservar a competitividade do agronegócio brasileiro.

Quando fala em mudança de mentalidade, a senadora Kátia Abreu pensa na conscientização dos fazendeiros para a necessidade de cumprimento das leis, trabalhistas ou ambientais, pois ela identifica no desrespeito à legislação a principal fonte do desgaste da imagem dos produtores rurais perante a opinião pública. É um problema antigo, que vem desde os tempos dos barões do café, reconhece. Naqueles tempos, os fazendeiros eram vistos como "pessoas retrógradas, sem instrução, sem tecnologia, sem informação, sem gerência, que tocavam a coisa na brutalidade; pessoas que não cuidavam de seus trabalhadores, que não respeitavam o meio ambiente".

Muita coisa mudou, mas ainda persistem traços dessa mentalidade antiga. A meta da nova presidente da CNA, por isso, é mudar a atitude dos grandes produtores diante da legislação e, sobretudo, disseminar práticas modernas de administração rural e de utilização de tecnologias mais avançadas. Muitas fazendas já adotam essas práticas e obtêm excelentes resultados. Kátia Abreu pretende promover cursos para ensinar pequenos e médios produtores rurais a lidar com computadores e com a internet.

"Espero que haja condições para o diálogo", diz a nova presidente da CNA, referindo-se às mudanças institucionais que pretende discutir com o governo. "Não estamos falando de qualquer setor. (O agronegócio) é uma questão de Estado."

Fonte: estadao.com.br