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Opinião

Foto: Divulgação

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Uma notícia assombrou os brasileiros nos últimos dias: a possibilidade de vermos ressurgir a famigerada CPMF já nos primeiros dias de governo da presidente eleita Dilma Rousseff. O imposto, disfarçado de contribuição, foi derrubado pelo Senado Federal em dezembro de 2007, após vigorar por 10 anos, em uma votação que entalou uma das maiores derrotas políticas na goela do presidente Lula. Talvez, por nunca ter se conformado com isso, esteja declarando apoio à possibilidade de recriação dessa excrecência tributária.

Como sempre, o presidente Lula se comporta como um profundo desinformado, um iludido quanto à trupe palaciana que o cerca. Essa história de recriar a CPMF, que vem à tona já na primeira semana pós-eleição, nada mais é que um instrumento de chantagem, uma espécie de estelionato político. Essa primeira arapuca para a presidenta Dilma está sendo orquestrada pelos governadores eleitos da própria base aliada, liderados pelo PMDB e pelo PSB, os dois grandes vitoriosos nas eleições majoritárias estaduais.

A matemática é simples. Em 2008, o deputado federal Pepe Vargas, do PT do Rio Grande do Sul, fez uma maquiagem na extinta CPMF e apresentou um Projeto de Lei Complementar visando reinstituí-la sob o nome de Contribuição Social para a Saúde (CSS). O PLC foi aprovado na Câmara dos Deputados, com margem apertada, em junho do mesmo ano. De lá seguiu para o Senado, onde aguarda votação. Já em 2009, o PMDB começou a pressão, com apoio do PSB, pela formalização de um nome do partido para vice na chapa de Dilma, culminando com a indicação do insípido Michel Temer.

Durante a campanha, Dilma Rousseff recebeu o apoio frontal de nomes fortes dos dois partidos em 11 estados, em especial o de Sérgio Cabral no Rio de Janeiro e de Renato Casagrande no Espírito Santo, ambos com vitórias acachapantes, e dos aliados socialistas e peemedebistas do nordeste capitaneados por Cid Gomes no Ceará e Eduardo Campos em Pernambuco. Juntos, os governadores eleitos pelo PMDB e PSB, somaram quase 20 milhões de votos nas urnas, o que, em tese, representam 35% dos votos que elegeram a petista. Além, é claro, dos 19 senadores (¼ do Senado Federal) e dos 113 deputados federais (22% da Câmara) eleitos pelas duas legendas.

O que isso significa? Com tamanho dividendo eleitoral, PMDB e PSB, além da vice-presidência da República, querem muito mais espaço no próximo governo. Em “politiquês” claro: querem mais ministérios, cargos e estatais. Isso sem falar nas ambições políticas de eleger Sérgio Cabral como “presidente olímpico” em 2014, o que inviabilizaria uma aliança numa possível tentativa de reeleição de Dilma. Como ela não é boba, vem afirmando que irá compor seu governo com perfis que consigam aliar técnica e política e que não tenham passado sujo ou enterrado nos lamaçais dos escândalos. Isso caiu como uma bomba na cabeça do PMDB, o partidão onde tudo cabe.

Daí acompanhamos a sucessão de fatos correlatos: Temer de bico torno nos dias seguintes à vitória; reunião urgente de governadores aliados; estado de sítio nos partidos menores; o presidente do Senado, José Sarney, afirmando que o imposto pode ser recriado pelos senadores; e a oposição, liderada pelo esperto senador eleito Aécio Neves, paquerando parlamentares da base aliada. Na percepção dos movimentos e considerando a recriação da CPMF como uma medida extremamente impopular e que custaria um preço alto demais ao novo governo, nada melhor que usá-la como peça de uma chantagem política que funcionará assim: “ou ganhamos mais ministérios, estatais e cargos ou aprovamos a CPMF e ferramos seu governo logo de cara!”

E não vai parar por aí. Daqui algum tempo, e de olho nas possibilidades olímpicas de Sérgio Cabral, ressurgirá a ideia de acabar com a reeleição e voltarmos aos mandatos de 5 anos. É o poder democrático das urnas! E a situação já está ficando tão séria, que o presidente Lula veio a público, subitamente, utilizando pronunciamento em cadeia de rádio e televisão no horário nobre, para mandar seu recado de insatisfação disfarçado de discurso em nome da beleza do processo eleitoral. Engana-se quem pensa que era um recado para o oposição derrotada. O alvo pretendido era mesmo a base aliada: os governadores, senadores e deputados vitoriosos que já começaram a disparar o famoso “fogo amigo”.

Apesar da base aliada ter conquistado ampla maioria na Câmara e no Senado, ninguém disse que Dilma Rousseff teria vida fácil em seu governo. Creio que será o extremo inverso. Tal qual uma Cleópatra tupiniquim, Dilma está dormindo com o inimigo e corre o risco de ter o mesmo fim da rainha egípcia: morrer picada por uma serpente. Resta saber se será uma cascavel socialista ou uma surucucu do partidão.

Helder Caldeira

Escritor, Articulista e Colunista Político, Palestrante e Conferencista

www.magnumpalestras.com.brheldercaldeira@estadao.com.br