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Evolução da produção aquícola nos noves estados da Amazônia Legal entre 2001 e 2022.

Evolução da produção aquícola nos noves estados da Amazônia Legal entre 2001 e 2022. Foto: Divulgação

Foto: Divulgação Evolução da produção aquícola nos noves estados da Amazônia Legal entre 2001 e 2022. Evolução da produção aquícola nos noves estados da Amazônia Legal entre 2001 e 2022.

Estudo recente feito pela Embrapa Pesca e Aquicultura (Palmas-TO) verificou como políticas públicas voltadas à aquicultura continental na Amazônia Legal impactaram o setor entre 1988 e 2023. Baseando-se em dados de produção e em legislações em diferentes níveis, os autores identificaram que esse período de 35 anos pode ser dividido em três estágios. 

O artigo “Incentivando pecuárias alternativas: políticas públicas e o crescimento da aquicultura continental na Amazônia Legal (1988-2023)” foi publicado na revista Desenvolvimento e Meio Ambiente, editada pelo Programa de Pós-Graduação em Meio Ambiente e Desenvolvimento da Universidade Federal do Paraná (UFPR). 

Thiago José Arruda de Oliveira é bolsista da Embrapa Pesca e Aquicultura e primeiro autor do artigo. Segundo ele, “em linhas gerais, no primeiro momento (1988-2002), a aquicultura na Amazônia Legal permaneceu distante de qualquer entendimento como prioridade nacional. Salvo iniciativas dispersas em Mato Grosso e em Rondônia, a atenção do governo federal se dirigia a temas amplos, como estabilização econômica e consolidação democrática. Esse cenário afastou estímulos capazes de transformar a criação de peixes em água doce numa opção produtiva relevante, o que manteve a atividade em escala reduzida”.

Na sequência, de 2003 a 2013, “após o estabelecimento das bases para um Estado de direito mais estável, abriu-se espaço para políticas que buscavam, de fato, estruturar a cadeia aquícola. As criações do Ministério da Pesca e Aquicultura e da Embrapa Pesca e Aquicultura representaram movimentos decisivos nesse sentido. O resultado se traduziu em salto produtivo expressivo, com destaque para Rondônia, que soube aproveitar o momento e adotou incentivos diretos à produção, como a isenção do ICMS”, emenda.

A analista de Sistemas de Informações Geográficas (SIG) da Embrapa Pesca e Aquicultura, Marta Eichemberger Ummus, também atuou no trabalho. Para ela, “no período final (2014-2023), crises políticas, hídrica, econômica e a pandemia do coronavírus reduziram drasticamente o protagonismo federal, transferindo aos estados da Amazônia Legal a tarefa de sustentar o desenvolvimento do setor”. Cenário complementado por Thiago: “apesar de esforços e expectativas, os efeitos permaneceram tímidos. Limitações orçamentárias, pouca capacidade de suporte institucional e um ambiente favorável a atividades mais consolidadas, inclusive com impactos ambientais elevados, frearam avanços e limitaram a competitividade regional”.

Legislação

Ao todo, o estudo localizou 138 leis federais ou estaduais nos estados da Amazônia Legal referentes à aquicultura no período. Todo esse arcabouço jurídico foi separado por origem, ano de promulgação, número de registro e outras informações importantes. Categorizadas, as leis se dividem em cinco eixos temáticos: incentivos diretos; regulamentação; meio ambiente; espécies exóticas; e outros assuntos.

E, no meio desse regramento legal todo e num cenário de conflitos entre diferentes instâncias governamentais, como a aquicultura continental na Amazônia Legal pode ter uma evolução consistente e principalmente justa, socialmente falando? “O cenário político brasileiro atual segue marcado por divergências e pela ausência de alinhamento mínimo entre os entes federativos. Essa configuração difere do período de maior coordenação institucional vivido entre 2003 e 2013, o que reduz a perspectiva de um avanço acelerado no curto prazo”, entende Thiago.

Ele apresenta uma visão positiva: “nas próximas décadas, porém, a tendência indica movimento diferente. A pauta climática assume centralidade nas decisões globais e durante a COP30, em Belém-PA, reforçou-se a cobrança por modelos produtivos com menor pressão ambiental. Nesse contexto, a aquicultura se destaca como alternativa capaz de ampliar a segurança alimentar em sintonia com a realidade amazônica. Como a estrutura institucional brasileira consolidou-se mesmo diante das crises, possui capacidade de atender às exigências advindas desse novo contexto, desde que surjam marcos jurídicos sólidos e desapareçam as inseguranças regulatórias, fortalecendo assim uma evolução justa e socialmente legítima”.

Marta contextualiza o cenário: “no artigo observamos que, sempre que há ações coordenadas entre a União e os estados, a aquicultura tende a avançar. Um exemplo claro é a segunda fase (2003–2013), quando praticamente todos os estados da Amazônia Legal ampliaram sua produção. Esse crescimento coincidiu com um aumento expressivo de legislações estaduais, desencadeado por marcos federais como a criação da SEAP/PR, o Decreto Federal nº 4.895/03, a posterior criação do MPA e a Resolução CONAMA 413/09. Essas normas impulsionaram programas de incentivo, concessões e políticas específicas que refletiram diretamente no aumento da produção regional”.

E segue: “na minha avaliação, o que limita o desenvolvimento no ambiente institucional é a ausência de normativas estaduais mais alinhadas entre si e adaptadas às realidades locais, mas sem perder a coerência nacional. Esse é um desafio que não se restringe à aquicultura, mas afeta diversos setores produtivos. Para a aquicultura amazônica, vejo dois caminhos importantes: fortalecer o diálogo entre instituições federais e estaduais e, igualmente, promover mais interação entre os próprios estados”. 

Papel da Embrapa

Marta considera estratégico o papel que a Embrapa, dentro de sua competência técnico-científica, pode ter com relação à formulação e ao monitoramento de políticas públicas para o setor. “Entendo que nossa função como empresa pública pode envolver a definição de indicadores ambientais, produtivos e socioeconômicos que permitam que as políticas sejam construídas a partir de evidências, e não apenas de orientações políticas”, explica. 

E segue: “também cabe à Embrapa recomendar sistemas de produção e manejo adequados às espécies e às características regionais, contribuir para a capacitação de gestores, formuladores de políticas, técnicos e analistas ambientais, além de monitorar os impactos das políticas implementadas. Outro papel fundamental é produzir e manter bases de dados confiáveis, como por exemplo os mapeamentos de viveiros escavados e mapas de adequabilidade que apoiem o planejamento territorial”. 

Ainda como papel da empresa, Marta acredita que ela “pode desenvolver soluções tecnológicas que integrem bioeconomia, sustentabilidade e inclusão social de produtores, bem como atuar em câmaras técnicas e emitir notas técnicas sobre legislações específicas, quando demandada. Em síntese, a Embrapa pode contribuir para aumentar a assertividade das políticas ao produzir diagnósticos técnicos, manter bases de dados atualizadas e assegurar continuidade institucional para políticas públicas mais consistentes”. (Embrapa/TO)