Nos acostumamos a repetir que “o problema do Brasil são os políticos”, como se essa frase bastasse para explicar a baixa qualidade das gestões públicas e o desgaste constante das instituições. É uma afirmação confortável, afinal, nos coloca sempre na posição de vítimas. Porém, quando examinamos pesquisas sobre comportamento eleitoral, surge uma pergunta inevitável: a culpa é dos políticos ou do eleitor que não sabe escolher?
O Latinobarómetro 2023[1] mostra que 25,7% dos brasileiros não confiam nos Parlamentos e no Congresso e 33,6% não conversam com os amigos sobre política. Vota-se sem entender o essencial.
Não surpreende que estudo do Instituto DataSenado[2] tenha revelado que apenas 18% dos eleitores tenham interesse por política e outros tantos afirmaram não ter conhecimento sobre o sistema político. Mesmo assim, a culpa recai sempre sobre quem está no cargo, nunca sobre quem colocou essa pessoa lá.
A política brasileira, aliás, fornece um repertório vasto de situações que mostram o quanto parte da classe política transformou a vida pública em espetáculo. Já tivemos prefeito apostando corrida com garis para viralizar vídeo, além da célebre “dança da pizza”, celebrada como se fosse política pública.
Também assistimos ao caso de deputada expor em desabafo público a traição do marido, também parlamentar, e à cena de um senador relacionando foro privilegiado a “suruba”, numa metáfora que explicita o nível de improviso que por vezes domina o cenário político nacional.
O problema não está apenas no fato de tais episódios acontecerem, mas no fato de parte do eleitorado normalizar, compartilhar e até premiar esse tipo de comportamento. Quando a política vira entretenimento barato e o eleitor se satisfaz com performances rasas, abre-se espaço para gestores que confundem popularidade com competência.
Em democracias mais maduras e sérias, episódios assim destruiriam carreiras para sempre. Aqui, pelos lados tupiniquins, muitas vezes, ampliam a visibilidade de quem os protagoniza.
Relatório da OECD[3] mostra que países com alta qualidade institucional investem massivamente na formação cívica. Lá, o cidadão entende como o Estado funciona, quais responsabilidades cabem a cada cargo e como avaliar políticas públicas.
No Brasil, outro estudo do Instituto DataSenado aponta que 45% dos eleitores escolhem candidatos com base em redes sociais, enquanto que em determinado estado da região Centro Oeste somente 35% leem os programas de governo dos candidatos. A consequência é óbvia: quando se exige pouco, a política devolve na mesma proporção.
Isso não isenta governantes incompetentes ou corruptos. Mas é intelectualmente desonesto ignorar que são eleitos por nós, repetidamente, muitas vezes apesar de sinais evidentes de má gestão.
A pergunta, portanto, já não é “de quem é a culpa?”, mas: por que resistimos a admitir que a democracia devolve exatamente aquilo que entregamos a ela? Se entregamos desinformação, ela devolve populismo. Se entregamos responsabilidade, ela devolve instituições fortes.
Devemos entender que a democracia devolve o reflexo do eleitorado. Exigir políticos melhores sem formar eleitores melhores é uma contradição que condena o país a repetir seus erros.
É notório que o político tem sua parcela de culpa, mas o eleitor que não sabe, ou não quer escolher, carrega parte fundamental da responsabilidade pelo cenário atual. E enquanto insistirmos em nos ver apenas como vítimas, continuaremos sendo cúmplices dos opressores.
*Claiton Cavalcante é membro da Academia Mato-Grossense de Ciências Contábeis e do Instituto dos Contadores do Brasil.

