Ao investigar 16 lotes das obras da ferrovia Norte-Sul em Tocantins e Goiás – uma obra de R$ 3 bilhões, incluída no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) –, o Tribunal de Contas da União (TCU) apontou um sobrepreço de R$ 516 milhões, o que corresponde a 22% do valor total dos lotes auditados. A Norte-Sul é tocada pela estatal Valec Engenharia, Construções e Ferrovias S.A., que tem Ulisses Assad, indicado pelo senador José Sarney, como diretor de Engenharia.
Após analisar contratos de 16 lotes no trecho Aguiarnópolis/Palmas, o TCU apontou “indicação clara de restrição à competitividade das licitações, caracterizada pela inusitada exigência de experiência em fornecimento de dormentes, vedação à formação de consórcios e limitação à participação da mesma empresa em mais de dois lotes por licitação. Disso decorre, ao que tudo indica, que as obras vêm sendo loteadas entre um restrito grupo de empresas. Duas empresas foram habilitadas em cada um dos 16 lotes, sendo que, em quatro deles, apenas uma restou habilitada”.
Segundo o relatório do ministro-relator, Valmir Campelo, “a falta de competitividade entre as empresas é materializada nos elevados preços praticados, muito próximos aos previamente inflados orçamentos-base elaborados pela Valec”.
Diante dos indícios de sobrepreço médio de 22%, o TCU determinou a retenção cautelar de 10% nos futuros pagamentos, para não comprometer a execução dos contratos, considerando que “as obras são de importância estratégica para a economia no país e que estão incluídas no PAC”.
Os indícios de superfaturamento na construção da Ferrovia Norte-Sul foram encontrados pelo Tribunal de Contas da União (TCU) no pátio da Valec em Araguaína, no Lote 5. A análise do contrato do trecho entre Babaçulândia e Córrego Galvão, no valor de R$ 295 milhões, tocado pela SPA Engenharia, apontou um sobrepreço de 28,7% no orçamento-base elaborado pela Valec, estatal responsável pela obra.
Esse sobrepreço teria resultado de preço excessivo dos dormentes, pagamento de brita extraída como se fosse brita comercial e índice excessivo de bonificações e despesas indiretas (BDIs), que fixa a margem de lucro das empresas.
No pátio da Valec em Araguaína há uma montanha de brita que será utilizada no Lote 8. A equipe de auditoria observou que a empresa estaria sendo remunerada pelo transporte rodoviário da brita, quando na realidade realiza parte do transporte por via ferroviária, utilizando-se da própria linha e construção.
O estoque de brita localizado no pátio de Araguaína está sendo transportado por meio de vagões ferroviários até o Lote 8, como o Correio pode comprovar. Além disso, a empresa estaria sendo remunerada a preço de brita comercial (R$ 55 o metro cúbico), embora esteja fazendo a extração em pedreira própria (R$ 21 o metro cúbico).
Segundo o TCU, tais acertos entre a construtora e os engenheiros da Valec não estariam sendo levados ao conhecimento do Conselho de Administração da entidade.
O tribunal informa, ainda, que o item dormentes é o de maior peso nas obras de Norte-Sul, representando mais de 20% do valor dos contratos. Nas licitações dos lotes 5 a 9, a Valec não elaborava composições de preços unitários para fazer seus orçamentos-base. Considerava apenas médias de preços de certames anteriores, o que conduzia a “grandes distorções, reproduzindo os exageros contidos naquelas planilhas. A Valec propiciava às empresas a oportunidade de compor seus orçamentos da maneira que melhor lhes aprouvesse, inclusive aumentando preços já exorbitantes”.
A auditoria também apurou o pagamento por dormentes não utilizados. Em média, em cada quilômetro são instalados 1.666 dormentes, com espaço de 60 cm entre um e outro. Em alguns trechos, havia pouco mais de 1,5 mil dormentes por quilômetro, mas a Valec fazia o pagamento como se fossem os 1.666. (Da Redação, com informações do Correio Braziliense)
‘Grampo’ flagrou cobrança feroz de propina
Um “grampo” da Polícia Federal – realizado com autorização judicial em 5 de maio deste ano – flagrou um contato ao telefone, que durou exatos 10min12seg (10h33min53seg a 10h44min05seg), entre Flávio Barbosa Lima (dono da Lupama, da Planor e da PBL, entre outras) e Romildo Frota (dono da EIT). Na conversa, Flávio cobra agressivamente de Romildo uma “propina” devida pela obtenção de uma subempreitada (provavelmente o trecho Pátio de Santa Isabel-Pátio de Uruaçu, em Goiás, da ferrovia Norte-Sul). Veja a transcrição das partes principais do diálogo.
ROMILDO: Flávio, conversei com Alexandre sobre aquele assunto. Não falei nada que... Falei só da perspectiva do futuro lote (...) Ele disse: Romildo, pode avisar pro pessoal que eu vou pagar aquela diferença, mas eu quero sentar, eu, o ‘Man’ e o Fernando [Sarney], pra gente fazer uma...
FLÁVIO: Ó, nem precisa conversar, não tem ‘eu quero’, nem continua o papo.
ROMILDO: Como assim?
FLÁVIO: Não continua, ninguém vai, é o seguinte: o contrato tá aqui comigo, o Ulisses [Assad] saiu daqui, tá viajando agora à tarde, tudo conversado. Eu tô com ele lá na sexta-feira de manhã. Vamos já conversar sobre outro assunto: o Romildo.
ROMILDO: Rapaz, eu tô dizendo...
FLÁVIO: Ô Romildo, é o seguinte, deixa até eu sair da sala que eu vou falar besteira.
ROMILDO: Flávio...
FLÁVIO: Olha, você vai mandar esse seu chefe à p... que o pariu, porque eu vou tá com o ‘Astro’ [Astrogildo Quental] amanhã, eu vou chamar ele e falar: ‘Ó, nós não vamos fazer mais nada com a EIT, mais nada, só aquilo que não tem jeito’.
ROMILDO: Mas Flávio...
FLÁVIO: Não, vou te falar. Ele [Alexandre] tá querendo conversar com o Fernando [Sarney]? Ele tá impondo condição pra pagar isso? A p... que o pariu!
ROMILDO: Não é isso não...
FLÁVIO: Que vai pagar mas quer conversar? Vai tomar no c..., entendeu?
ROMILDO: Não é isso não...
FLÁVIO: Pague essa m..., que já tem um ano e tanto, você tá recebendo no colo essa b... de contrato, entendeu? E ele [Alexandre] ainda vem dizer ‘eu preciso conversar’...
ROMILDO: Flávio...
FLÁVIO: Tá na minha segunda gaveta aqui. A hora que ele pagar você me avisa, tá bom?
ROMILDO: Não é isso não...
FLÁVIO: Ah, ‘eu vou esperar o Fernando pra ter...’, vá pra p..., meu...
ROMILDO: Não é isso não...
FLÁVIO: Ah, se não fosse isso, peraí, Romildo, se não fosse isso, [ele, Alexandre, diria] ‘olha, eu vou pagar esse negócio, tá tudo bem’ etc., agora ‘eu vou ver, eu vou pagar, mas antes eu quero sentar com o Fernando’. Ah, então tá impondo condição, vai tomar no c...
ROMILDO: Peraí, rapaz...
FLÁVIO: Eu não impus condição nenhuma, eu deveria ter imposto condição em cima de vocês antes de mandar fazer o contrato. Ah, vai tomar no c... essa p... do se chefe...
ROMILDO: Peraí, rapaz...
FLÁVIO: Eu tô p... mesmo! ‘Ah, eu quero conversar com o Fernando’, tomar no c... Então você faz o seguinte, você liga pra ele e diz: ‘Olha, o contrato tá na mesa do Fernando’. Quer que eu mande um fax pra você, eu mando. Sabe quem vai chegar com o Fernando e o Ulisses [Assad] pra fazer a p... da vistoria na sexta-feira? Sou eu!
ROMILDO: Flávio...
FLÁVIO: Entendeu? E quer saber mais? Eu vou em outro trecho, que é pra ver se a gente pode pegar uma outra coisa, você vai tomar no..., manda seu chefe tomar no c..., enfia o negócio dele no c... A p... da hora que ele pagar você fala comigo, até logo.
ROMILDO: Alô, alô...
FLÁVIO: Oi?
ROMILDO: Peraí, rapaz, ele vai pagar, Flávio...
FLÁVIO: Vai pagar p... nenhuma, ele quer falar com o Fernando, tá fazendo doce! Vai te f... Eu vou falar com o ‘Astro’ [Astrogildo Quental] pra...
ROMILDO: Não, não, Flávio...
FLÁVIO: Eu vou tá com o Silas [Rondeau] na terça. Vocês vão ver uma coisa! Ah, p..., ele é do Conselho da Petrobras! Vocês vão.... Eu tô é muito p... com o seu chefe, se você quer saber.
ROMILDO: Eu sei disso, mas você não entendeu o que eu falei...
FLÁVIO: Que ‘eu vou pagar, mas antes eu quero sentar com o Fernando’... E eu vou sentar com meus amigos lá na Constran. Eu vou encontrar com o Fernando agora ao meio-dia. Eu vou falar pra ele: ‘Fernando, dá um gelo no pessoal da EIT, porque é tudo palhaço’.
ROMILDO: Não, tira o seu amigo aqui...
FLÁVIO: Tá, eu tiro você.
Duas semanas depois desse diálogo pontuado por palavrões (19.05.2008), Romildo Frota voltou a ligar para Flávio Barbosa para avisar que “foi resolvido, a palhaçada acabou”. Ou seja, a EIT pagou o que devia, depositando R$ 160 mil em nome da PBL Engenharia e Consultoria (uma das empresas de Flávio e Giafranco Perasso).
“Cabe frisar que Fernando Sarney, após o pagamento [feito pela EIT], determinou a Flávio Barbosa que fizesse alguns pagamentos [um deles, de “10 laranjas”, ou seja, R$ 10 mil, para Rui Barbosa Lima Sobrinho], (...) o que reforça ser Fernando Sarney o chefe da ORCRIM [organização criminosa] ora sob investigação”, enfatizou o inquérito da Polícia Federal.
Fonte: Jornal Pequeno Online