Cerca de 100 índios interromperam as competições na Arena Verde, durante os Jogos Mundiais dos Povos Indígenas, no início da noite dessa quarta-feira, (28) e protestaram contra a aprovação da PEC 215 na comissão especial da Câmara dos Deputados. Eles invadiram a areia e alguns subiram na Tribuna de Honra. De microfone em punho, a estudante indígena Narúbia Karajá criticou a plenos pulmões a decisão dos parlamentares.
A PEC 215 altera as regras para a demarcação de terras indígenas, de remanescentes de comunidades quilombolas e de reservas. Pelo projeto aprovado em comissão especial da Câmara ontem, o Congresso Nacional passa a dar a palavra final sobre o tema. O texto proíbe ainda a ampliação de terras indígenas já demarcadas e prevê a indenização de proprietários inseridos nas áreas demarcadas, ainda que em faixa de fronteira.
“A terra é nossa! O povo está morrendo, os povos originários dessa terra. Daqui a pouco não vai ter povo indígena, não vai ter natureza. Estamos fazendo esses jogos e eles estão armando contra nós!”, disse a jovem indígena, sendo aplaudida pelas arquibancadas e pelos índios na areia.
Os manifestantes e atletas que estavam na areia se uniram, formando cerca de 200 indígenas acompanhando e aplaudindo o protesto. Cartazes contra a PEC eram levantadas e os índios pintaram seus corpos com frases de repúdio à proposta. Narúbia, então, puxou o coro “Fora Kátia Abreu”, referindo-se à ministra da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, antes uma parlamentar da bancada ruralista no Senado. O protesto ocorreu durante as baterias da corrida de 100 metros. A manifestação durou cerca de 20 minutos e foi pacífica.
A estudante Karajá também criticou a postura dos irmãos Marcos e Carlos Terena, articuladores dos jogos. Para a indígena, os dois “se omitiram” diante das questões políticas. “Os Terena ficaram omissos, não se impuseram, sabendo da luta, do massacre. Esse evento, ao mesmo tempo que é triste, está sendo uma voz para nós que nunca somos ouvidos, que sofremos”.
Questionado, Marcos Terena disse que o protesto é legítimo, mas discordou da forma como foi feito. “É um ativismo que se aproveita dessa situação. Eu, como ativista dos direitos humanos, não aceito esse modelo de manifestação oportunista, já que nada foi combinado conosco, organizadores indígenas”.
Terena disse ainda que nunca se colocou como representante dos indígenas. “A gente não representa nem os Terena”, disse. Para ele, a jovem Karajá “prejudicou a coalizão dos povos indígenas” com a atitude e frisou que o combate à PEC deve ocorrer com “as armas do branco”.
“A gente tem que montar uma estratégia, discutir, chegar à presidência da Câmara dos Deputados para pautarmos isso de forma positiva para os povos indígenas. Os ruralistas estão bem organizados dentro do Congresso, mas a gente não pode só ser contra a PEC, temos que usar as armas do inimigo, usar o debate técnico-jurídico”.
Após o ato, o locutor encerrou as disputas no dia, provocando vaias da plateia, que esperava ainda pela continuação das baterias de corrida e as disputas de cabo de força feminino. As competições continuarão amanhã normalmente, segundo a organização.
No início da tarde, circulava pela vila a informação de que os indígenas poderiam se recusar a competir hoje na Arena Verde, em protesto. As competições, no entanto, ocorreram normalmente até a invasão da arena, já durante as últimas modalidades do dia.
O líder da etnia Javaé, Darci Javaé, disse que, por enquanto, os indígenas credenciados a participar das competições decidiram não interromper a programação em respeito aos jogos, que terminam no dia 1º de novembro. “Mas se não tiver acordos entre as lideranças, os jogos podem acabar amanhã”.