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Opinião

Gaudêncio Torquato é jornalista e professor titular da USP

Gaudêncio Torquato é jornalista e professor titular da USP Foto: Divulgação

Foto: Divulgação Gaudêncio Torquato é jornalista e professor titular da USP Gaudêncio Torquato é jornalista e professor titular da USP

O poder no Brasil começa a beber em novas fontes. Expliquemos. Espraia-se pelo País um fenômeno que terá impacto sobre nossa modelagem democrática. A sociedade ganha mais pluralismo, a partir da organização de suas entidades de representação, e nessa onda ocorre maior distribuição de poder e consequente  alargamento dos caminhos para a democratização social. As pedrinhas do dominó vão se tocando. A democratização da sociedade civil adensa e amplifica a democracia política. Caminhamos  firmes nessa direção e a prova mais eloquente dessa tendência se verifica na formidável malha de centros de poder instituídos em todos os âmbitos e níveis( associações, movimentos, grupamentos etc).

Esse fenômeno enfraquece o poder político representado pela instituição parlamentar? De certo modo, sim. Até porque a esfera parlamentar padece de monumental crise de imagem. A formação de novos centros de poder no meio e nas margens da sociedade também tem por motivo a falta de respostas adequadas e tempestivas por parte do sistema parlamentar. Os mais de 30 partidos políticos constituem um ente amalgamado, massa frequentemente incolor e sem matiz ideológico, na esteira, aliás, do declínio geral das ideologias decorrente da debacle do socialismo clássico, da globalização e da quebra de fronteiras físicas, psicológicas e ideológicas entre países.

As doutrinas se aproximam e se fundem, enquanto o desempenho menos convicto dos participantes do universo partidário impregna os ambientes. As lutas políticas e sociais do passado, travadas sob o manto da clivagem ideológica, perderam sentido. Direita e esquerda cruzam seus ideários, enquanto o liberalismo e o socialismo procuram novos eixos conceituais, sob a vertente de que o primeiro demonstrou saber produzir riquezas, mas não saber como distribuí-las; já o segundo demonstrou saber distribuir riquezas, mas não saber como produzi-las. E é aí que surgem os “caçadores” da ideologia dos novos tempos.

É o que se vê aqui e alhures. As oposições partidárias levam em conta a tomada do poder central, ficando em segundo plano o embate ideológico. Que partido político tem, hoje, um projeto de poder? O que o PT prega? O socialismo clássico? Isso já era. O que pregam os partidos de centro, a partir do PSDB? O social liberalismo? Quais os limites desse sistema? Por isso mesmo, o oposicionismo se dá menos em função de uma visão ideológica do mundo e mais em função de projetos circunstanciais de poder, centrados na pragmática política e, sobretudo, inspirados nas vontades e expectativas dos novos polos de pressão da sociedade.

Já a ação política voltada para a conquista do poder leva em consideração a micropolítica dos grupos de interesse, das regiões, das comunidades locais. O processo político, no Brasil, se torna cada vez mais uma questão distritalizada, espacial. Basta ver a guerra fiscal entre Estados.  Já a democracia participativa ganha alento com as manifestações e decisões dos cidadãos reunidos em suas entidades.

O fato é que os conjuntos organizados da sociedade recebem grande impulso - espaço e visibilidade - da mídia, que descobre na investigação, na denúncia e na cobertura de eventos de impacto uma forma de adensar a taxa cívica da Nação. Até parece que a sociedade organizada entoa o canto de Zaratustra(Nietsche) para expressar o estado de espírito da força social emergente: “novos caminhos sigo, uma nova fala me empolga; como todos os criadores, cansei-me das velhas línguas. Não quer mais, o meu espírito, caminhar com solas gastas”. 

Gaudêncio Torquato é jornalista, professor titular da USP, consultor político e de comunicação Twitter@gaudtorquato