A ação cautelar de busca e apreensão e representação por prisão temporária do Ministério Público Estadual (MPE) a qual o Conexão Tocantins teve acesso, descreve com detalhes o esquema de fraudes de carteiras de habilitação que funcionava em Araguaína e levou à prisão do vereador Gilmar Oliveira Costa (PSC) - conhecido como Gilmar da Autoescola.
De acordo com o Grupo de Atuação Especial de Repressão ao Crime Organizado (Gaeco) do MPE, além do vereador, o esquema era operado por servidores da Ciretran de Araguaína e um outro dono de autoescola da cidade. No esquema cada envolvido tinha uma função específica. O Gaeco definiu a fraude como um sofisticado modus operandi que só foi possível ser detalhado graças à infiltração dos agentes.
Organograma mostra a atuação de cada membro dentro do esquema
Investigação
A investigação sobre as fraudes teve início em fevereiro de 2016, sendo realizada pelo Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco) do MPE, a partir de denúncia apresentada pela direção do Departamento Estadual de Trânsito (Detran). Na época foi apontado que o esquema de corrupção já funcionava há algum tempo.
Segundo a investigação, CNHs foram emitidas sem que os candidatos a condutor tivessem que se submeter às provas teórico e prática, bem como ao curso de formação oferecido pelas autoescolas. Pela carteira fraudulenta, os interessados chegavam a pagar entre R$ 3 mil e R$ 4 mil, valor que incluía as taxas administrativas do Detran. O dinheiro excedente era repartido entre os participantes do esquema.
Para a efetivação das fraudes, proprietários de autoescola e servidores da Ciretran atuariam de forma articulada, havendo o envolvimento de agentes públicos que atuavam no curso técnico teórico, no exame de legislação de trânsito e no exame de direção veicular.
Para colher provas, o Gaeco contou com a quebra dos sigilos telefônico e bancário dos envolvidos, bem como atuação de agente infiltrado. Este conseguiu obter a CNH submetendo-se apenas à avaliação física e psicológica e ao exame de aptidão física e mental, sem passar pelas aulas oferecidas pela autoescola e pelas provas teórico e prática. A habilitação foi obtida com o intermédio de Gilmar Oliveira, da Autoescola Ideal.
Passo a passo da Investigação
Dois agentes da Polícia Civil munidos de documentos falsos autorizados pela justiça foram orientados a se aproximar dos operadores do esquema de fraude e solicitar CNHs originais sem nunca terem comparecido para realizar os testes necessários.
Um dos agentes foi apresentado ao vereador Gilmar Oliveira por um outro agente que fingia ser um cliente antigo do esquema de venda de CNHs. Por telefone o encontro entre o político dono da autoescola e o agente supostamente interessado no documento foi marcado. O policial infiltrado carregava escutas escondidas que registraram toda a negociação.
Na conversa, Gilmar diz ao policial que pelo custo de R$ 3 mil ele próprio se encarregaria de fazer as provas teórica e prática e o teste de volante.“ Você vai gastar o que mais? Eu vou ter que fazer pra ti... a escolinha teórica, a prova teórica, as aulas práticas e o teste de volante”, diz Gilmar, que ainda afirma: “Isso aí acaba envolvendo muita gente, entendeu né? É, acaba envolvendo muita gente, então, aí é onde você vai gastar um pouquinho a mais. Eu... Daqui, daqui eu já ganhei umas aulas aqui.. Vai gastar o que mais? Vai ter que comprar uma pessoa para fazer a escolinha, pagar uma pessoa para fazer a prova que é mais caro, pagar uma pessoa para fazer as aulas e o teste de volante”.
O vereador diz ainda que a CNH poderá ser entregue em até 30 dias. O agente pede desconto no valor de R$ 3 mil, mas Gilmar não aceita e diz que já chegou a cobrar até R$ 4 mil.
Após toda a negociação o processo foi montado e o agente infiltrado foi convocado apenas para fazer os exames de avaliação psicológica e testes de aptidão física e mental. Todas as demais fases (Curso técnico-teórico, exame teórico, curso prático e exame de direção) foram realizados por outras pessoas que também participavam da fraude.
Para o MPE, não restam dúvidas de que o esquema conta com a participação de proprietários de autoescolas e funcionários do Detran, que burlam os controles processuais para permitir que as CNHs sejam geradas e emitidas sem que o candidato participe de qualquer etapa do processo.
Com a participação do infiltrado, o Gaeco conseguiu tomar conhecimento do modo de operação da quadrilha.
As investigações encontram-se em estágio avançado, podendo vir a ser concluídas após a análise dos computadores, aparelhos celulares e documentos apreendidos na operação desta quinta-feira. Duas armas de fogo também foram apreendidas.
Na investigação, são apurados os crimes de corrupção, associação criminosa e falsificação de documento público. Caso venham a ser identificados os candidatos a condutor que obtiveram CNH por meio do esquema, eles também poderão vir a responder criminalmente, pelas práticas de corrupção ativa e pelo uso de documento falsificado.
Mandados de Busca e Prisão
Oito mandados de busca e apreensão e de prisão temporária foram cumpridos pelo Gaeco/MPE com o apoio da Polícia Civil. Os alvos da operação foram seis servidores da Circunscrição Regional de Trânsito (Ciretran) de Araguaína e dois proprietários de autoescola.
Pela participação na Ciretran, foram presos os servidores Hélio Marcos Ferreira Sousa, Irismar Rodrigues, Célio Raildo Pereira Ribeiro, Jaésia Alves Oliveira, Fábio Fernandes Barroso e Alex André Escobar Morales. Nenhum é servidor de carreira do órgão.
As prisões temporárias têm prazo de cinco dias, sendo passíveis de renovação. Os mandados foram expedidos pela 2ª Vara Criminal de Araguaína, a partir de Ação Cautelar de Busca e Apreensão e de Representação por Prisão Temporária, proposta pelo Ministério Público Estadual. (Atualizada às 17h com informações Ascom MPE)