Há algumas semanas temos pensado o quanto o Coronavírus pode impactar nossas vidas. Cada vez que o vírus se aproxima, passando pela Europa, aonde já se decretou toque de recolher, e chegando mais recentemente em terras tupiniquins, constatamos os possíveis reflexos na nossa rotina. Evitamos locais de grande concentração de pessoas, transportes públicos, eventos de massa. Mas e em relação ao contrato de trabalho, quais são os reais efeitos?
O que existe em nossa legislação sobre o tema? E se a minha cidade decretar, assim como já aconteceu no norte da Itália, o toque de recolher, com a paralisação das atividades fabris e comerciais. O que acontece com os contratos de emprego vigentes? E se houver imposição de quarentena ou isolamento para os empregados, vetando o comparecimento, quais seriam os efeitos jurídicos?
Em São Paulo, uma escola privada declarou a paralisação parcial de suas atividades em razão da existência de um caso positivo do Corona em um de seus alunos. Como ficam os contratos de trabalho daqueles profissionais que ficaram impedidos de exercer suas atividades?
O escopo deste breve artigo é fazer pensarmos sobre as forças e fraquezas do nosso ordenamento acerca de questões que estão alheias à vontade dos contraentes.
Existe em nossa CLT, com redação dada pela Lei 1530/51, o disposto no artigo 486 da CLT, que prevê a paralisação temporária ou definitiva do trabalho, motivada por ato de autoridade municipal, estadual ou federal, ou ainda, por promulgação de lei ou resolução que impossibilite a continuação da atividade.
Referido dispositivo traz à baila a figura do “factum principis” ou fato do príncipe, que é conceituado pela paralisação temporária ou definitiva do trabalho ou prestação do serviço em decorrência de ato praticado por autoridade pública (federal, estadual ou municipal), necessária para sua evidência a presença dos seguintes requisitos: ato administrativo inevitável praticado por autoridade competente; interrupção temporária ou definitiva da prestação dos serviços e não concorrência, direta ou indireta, do empregador para a prática do ato.
Cuida-se de uma espécie do gênero de força maior. Nesta situação, o dispositivo transfere ao Estado a obrigação de indenização.
O fundamento da “teoria do fato do príncipe” reside na ideia de que a Administração não pode causar danos ou prejuízos aos administrados, ainda que em benefício da coletividade; sendo que, inevitáveis esses prejuízos, surge a obrigação de indenizar.
Alguns doutrinadores, dentre eles Arnaldo Sussekind e Martins Catharino, já manifestaram entendimento que, em caso de paralisação temporária dos serviços derivada de factum principis, o Governo responsável deverá arcar com o pagamento dos salários dos empregados da empresa prejudicada.
Isto posto, caso venha a ser necessária a paralisação temporária de atividades privadas, decorrente de ordem pública (federal, estadual ou municipal) poderá a empresa invocar a aplicação do artigo 486 da CLT, transferindo ao ente pública a responsabilidade pelos pagamentos decorrentes aos salários de seus empregados.
A Lei Federal 13.979/2020, publicada em 06 de fevereiro do corrente ano, por sua vez, estabelece que, para o trabalhador posto em quarentena ou isolamento pela Autoridade, este período será considerado como falta justificada ao serviço público ou à atividade privada.
Assim no período de quarentena ou isolamento, o empregado ou funcionário público, não poderá sofrer qualquer desconto salarial.
Para o caso da escola paulistana que, por uma (correta) decisão de defesa da saúde de seus colaboradores e alunos, mas corporativa, entendeu por bem suspender as atividades, não se aplica o dispositivo do artigo 486 Consolidado, na medida em que não houve um ato impositivo estatal que culminasse com esta paralisação.
Não se pode olvidar da força dada às negociações coletivas pela CLT, de modo a possibilitar que as empresas e sindicatos negociem, da melhor forma, os efeitos de eventual paralisação, a fim de buscarem a forma menos onerosa aos envolvidos.
Diante desta situação que se aproxima, importante que as empresas antecipem eventuais medidas ou tomadas de decisão quanto aos efeitos do corona vírus nos contratos de trabalho.
*Leonardo Jubilut éadvogado especialista em direito do trabalho e sócio do Jubilut Advogados