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Opinião

Sempre que ocorrem majorações dos derivados de petróleo e do gás natural, como os 39% de aumento do gás natural anunciados para este a partir de 1º de maio, argumenta-se que, na qualidade de comoditties, esses produtos têm seus preços regulados e determinados pela oferta e demanda no mercado internacional. É verdade, mas há medidas capazes de, internamente, propiciar o barateamento de alguns desses itens. É o que ocorreria, por exemplo, com a instituição de liberdade mais ampla de comercialização dos combustíveis.

Para se entender melhor a questão, cabe lembrar que, há mais de um ano, está parado na Agência Nacional do Petróleo, Gás e Biocombustíveis (ANP) um projeto que permite às distribuidoras de marca venderem combustíveis para todos os postos e não apenas àqueles que tenham a mesma bandeira. A livre concorrência, num modelo que funciona muito bem em outros países, como os Estados Unidos, reduziria os preços dos produtos e até mesmo diminuiria o seu peso na inflação, que é relevante, considerando a dependência do Brasil dos transportes rodoviários, cujo impacto é grande na economia.

É inexplicável a postergação da matéria, considerando que a medida possibilitaria redução de até R$ 0,50 no preço do litro da gasolina nas bombas. Há estudos do próprio governo demonstrando que a venda livre para todos os postos ampliaria a concorrência e aperfeiçoaria o mercado, barateando os combustíveis. As três maiores distribuidoras (BR, Raizen e Ipiranga), de acordo com o boletim de abastecimento de 2019 da ANP, detêm mais de 70% de participação de mercado e os postos da mesma bandeira de cada uma delas só podem comprar de sua respectiva marca. Apenas os chamados "Bandeira Branca" podem adquirir de qualquer distribuidora e, por isso, têm como negociar os preços, conseguindo oferecer o combustível mais barato aos consumidores.

Não se sabe exatamente por que o processo para implantação da liberdade de venda está parado há mais de um ano na Superintendência de Distribuição e Logística da ANP. Seria importante que, pelo menos, se estabelecesse um prazo para essa decisão, que se torna ainda mais importante neste momento tão difícil de enfrentamento da pandemia com a população enfrentando o aumento do desemprego e a pressão inflacionária. Não podemos esquecer que o aumento nos preços dos combustíveis e no gás natural tem um efeito perverso na economia brasileira. A nossa principal matriz de transporte é a rodoviária, onde, de acordo com a Confederação Nacional do Transporte (CNT), aproximadamente 61% das cargas foram transportadas em 2019, sendo que quase 40% dos motoristas eram autônomos. Assim, combustíveis mais caros elevam o custo do frete, reduz o lucro do caminhoneiro e termina com preços mais altos para o consumidor.

Concernente ao gás natural, os seus principais destinos, de acordo a Associação Brasileira das Empresas Distribuidoras de Gás Encanado (ABEGÁS), foram, em 2020, para indústria (43%) e geração de energia elétrica (38%). Ou seja, o gás mais caro não impacta apenas no preço do gás serviço nas residências, mas também irá aumentar o custo de produção da indústria e do fornecimento de energia elétrica, implicando em produtos com preços maiores e um reajuste na conta de luz.

As barreiras ainda existentes no Brasil para a livre comercialização dos combustíveis contrariam a lógica capitalista e a liberdade de comércio inerente às democracias. Temos um modelo anacrônico, que favorece a concentração do mercado e a geração de cartéis, impede a redução de preços e prejudica a própria cadeia de valores dos combustíveis, uma das mais relevantes do País em termos de geração de empregos, investimentos e aporte tecnológico. O maior dano, contudo, é para o consumidor final, que paga nas bombas dos postos de abastecimento um valor a mais, que poderia ser economizado.

Assim, espera-se que prevaleça o bom senso e que o projeto relativo à liberdade de comercialização tenha encaminhamento no âmbito da ANP. Seria um avanço significativo para a promoção de uma maior competição no mercado de combustíveis e bem-estar para o setor de transporte e todos os brasileiros.

Rubens Moura é professor de economia da Faculdade Presbiteriana Mackenzie Rio.