O desmatamento no Cerrado chegou a 188,2 mil hectares no primeiro trimestre deste ano. Esse número representa 35% a mais do que o registrado nos três primeiros meses do ano anterior, quando foram desmatados 139,8 mil hectares, segundo dados do SAD Cerrado (Sistema de Alerta de Desmatamento do Cerrado) divulgados nesta sexta-feira, 14. Apesar do aumento no primeiro trimestre, o registro de alertas de desmatamento para o mês de março diminuiu em relação a fevereiro desde ano (redução de 31,9 mil hectares).
“É necessário cautela ao interpretar os dados de desmatamento na época de chuva. A alta cobertura de nuvens nessa época pode aumentar o tempo de detecção dos alertas de desmatamento pelo SAD Cerrado. Portanto, um desmatamento que ocorreu em janeiro ou fevereiro pode estar sendo detectado somente agora em março devido à presença de nuvens naquela área nos meses anteriores. Assim como podemos detectar nos próximos meses novos desmatamentos que na verdade ocorreram agora no mês de março, mas estavam cobertos por nuvens nas imagens desse mês. Normalmente temos uma baixa detecção de alertas na época chuvosa devido à cobertura de nuvens, e também devido ao próprio calendário agrícola. Por isso, esse aumento significativo de desmatamento no primeiro trimestre em relação aos últimos dois anos é bastante preocupante”, aponta a pesquisadora do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (IPAM), Fernanda Ribeiro.
Dos 188,2 mil hectares desmatados no Cerrado no primeiro trimestre, aproximadamente 48 mil estão na Bahia. O estado foi o que mais concentrou (25%) novas áreas de desmatamento do bioma no período. A área desmatada mais que dobrou em relação ao primeiro trimestre de 2022, quando foram registrados 20,2 mil hectares derrubados no estado da Bahia.
Durante o mês de março, foram desmatados 54,8 mil hectares de Cerrado, um aumento de 37,7% em relação ao mesmo período em 2022, quando o bioma perdeu 39,8 mil hectares. Durante o terceiro mês do ano, a Bahia respondeu por 30% de todo o desmatamento, cerca de 16,3 mil hectares.
O resultado é impulsionado pelo desmatamento em municípios do oeste baiano, dentro da fronteira agrícola do Matopiba - que compreende os estados Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia. No trimestre, o Matopiba concentrou 64% do desmatamento do bioma. Para as pesquisadoras, os últimos relatórios mensais do SAD Cerrado indicam uma continuidade na alta do desmatamento na região, com uma maior concentração no oeste da Bahia.
“O Oeste da Bahia tem se destacado com o aumento do desmatamento nos últimos meses. Só no último trimestre foram 47,8 mil hectares derrubados na região. Isso afeta diretamente a manutenção da biodiversidade local e nos modos de vida das populações tradicionais. Essa expansão está ocorrendo em áreas de alta importância para manutenção da conectividade entre áreas protegidas da região, e também dentro de territórios tradicionais, fomentando diversos conflitos sociais na região”, afirma Tarsila Andrade, pesquisadora do IPAM que atua no SAD Cerrado.
O SAD Cerrado é uma ferramenta de monitoramento do desmatamento do bioma desenvolvida pelo IPAM (Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia) em parceria com a rede MapBiomas e com o LAPIG (Laboratório de Processamento de Imagens e Geoprocessamento) da UFG (Universidade Federal de Goiás).
Municípios
Também é na região do oeste baiano que está localizado São Desidério, o município com as maiores taxas de desmatamento de todo o Cerrado para o trimestre. De 2022 para 2023 o desmatamento quadruplicou no município: foram 12 mil hectares desmatados entre janeiro e março deste ano, o que corresponde a 25% de todo o desmatamento na porção de cerrado do estado no período, contra quase 4 mil hectares derrubados nos primeiros três meses do ano passado.
Correntina, vizinha de São Desidério e segunda colocada do ranking em 2023, também quadruplicou seu desmatamento em relação ao ano passado. Foram 8,2 mil hectares detectados no primeiro trimestre do ano, contra 1,3 mil ha no mesmo período do ano passado.
(Área afetada por desmatamento na região de Correntina (BA). Imagens ©PlanetScope)Outros municípios baianos também registraram aumentos significativos no desmatamento em relação ao mesmo período de 2022. Seis dos dez municípios que mais desmataram no primeiro trimestre de 2023 estão localizados no estado e respondem por 20% de todo o desmatamento no Cerrado.
Jaborandi, quarto colocado, aumentou seu desmatamento em 154%, desmatando 3,6 mil ha no primeiro trimestre de 2023. Barreiras, que ocupa a quinta posição e é também o município mais populoso do oeste baiano, desmatou 3,4 mil, um aumento de 439% em relação ao início de 2022. Já Cocos, sexto município que mais desmatou, derrubou 3,3 mil hectares, um aumento de 207%.
Alto Parnaíba, no Maranhão, Baixa Grande do Ribeiro e Sebastião Leal, no Piauí, Rio Sono, no Tocantins, e Riachão das Neves, também na Bahia, completam a lista dos 10 municípios com a maior área desmatada.
Desmates maiores
O tamanho das áreas de Cerrado desmatadas também aumentou. Segundo levantamento do SAD, entre janeiro e março de 2023, alertas de desmatamento com mais de 50 hectares corresponderam a 51,3% de todo o desmatamento registrado. Em 2022, áreas desse tamanho representavam menos de 30% de todos os alertas de desmatamento registrados para o bioma.
A proporção de alertas de desmatamento localizados dentro de propriedades rurais privados também aumentou, representando mais de 88% do que foi desmatado no primeiro trimestre. Em 2022, registros privados de CAR (Cadastro Ambiental Rural) já representaram cerca de 79% dos alertas emitidos pelo SAD.
Sobre o SAD Cerrado
O Sistema de Alerta de Desmatamento do Cerrado é um sistema de monitoramento mensal e automático utilizando imagens de satélites ópticos do sensor Sentinel-2, da Agência Espacial Europeia. O SAD Cerrado é uma ferramenta analítica que fornece alertas de supressão de vegetação nativa para todo o bioma, trazendo informações sobre desmatamento no Cerrado desde agosto de 2020. A confirmação de um alerta de desmatamento é realizada a partir da identificação de ao menos dois registros da mesma área em datas diferentes, com intervalo mínimo de dois meses entre as imagens de satélite. A metodologia é detalhada no site do SAD Cerrado.
O objetivo do sistema é fornecer alertas de desmatamentos maiores de 1 hectare, atualizados mês a mês. Pesquisadores entendem que o SAD Cerrado pode se constituir como uma ferramenta complementar a outros sistemas de alerta de desmatamento no bioma, como o DETER Cerrado, do INPE (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais), otimizando o processo de detecção em contextos visualmente complexos.