Conexão Tocantins - O Brasil que se encontra aqui é visto pelo mundo
Opinião

Foto: Divulgação

Foto: Divulgação

Enquanto são muito comuns os artigos e menções à exclusão do sócio minoritário de uma empresa por iniciativa do majoritário, judicial ou extrajudicialmente, são raríssimas as referências à exclusão do majoritário pelo minoritário. Essa possibilidade deveria ser mais comum, tendo em vista a diversidade de conduta na gestão das empresas brasileiras.

A exclusão do minoritário é considerada óbvia, diante da suposição de que decisões de maior importância na sociedade devem ser tomadas por quem detém a maioria do capital social, os sócios que, teoricamente, têm maiores interesses na preservaçãos da empresa.

Observemos, no entanto, que uma empresa pode ser posta a funcionar legalmente e é reconhecida pelo Poder Público por sua função social, ou seja, como ente jurídico que deve contribuir para o bem da sociedade. E esta assim o faz quando produz, gera empregos, recolhe tributos etc. Isto fica claro na definição da Ordem Econômica, artigo 170 da Constituição, destinado a fazer com que toda atividade nessa área sirva para valorizar o trabalho, as empresas, a livre iniciativa, indo até a “existência digna”. São princípios que constam também do Código Civil, do Código de Proteção ao Consumidor, da Lei da Sociedade Anônima e até da própria legislação penal, que, em inúmeros artigos prevê penalidades para empresários que infringem suas normas.

Em resumo, toda a organização social se reflete na legislação e ela é toda em um sentido: de que empresa deve servir à sociedade. Isto é mais verdade para os tempos atuais que consagra teorias de gestão responsável, participativa, inclusiva e humanista. A vitoriosa “ESG” tem preocupação ambiental, social e de governança e destaca-se entre outros sistemas de gestão que reconhecem a prevalência do interesse público.

Evidente que todos esses comandos se estendem ao empresário, onde nasce a empresa, é o responsável, é quem a comanda. A empresa é ficção jurídica e segue os rumos que seus sócios ditam.

Mas e se o empresário majoritário age de forma antissocial, comete reiteradamente atos ilícitos, sonega direitos do fisco, dos trabalhadores, viola normas ambientais, apropria-se de lucros dos sócios, põe em circulação produtos perigosos para os consumidores? E isso numa mesma empresa em que sócio minoritário tenta fazer com que as atividades respeitem a lei, a ética, o consumidor, o trabalhador e os interesses sociais.

Está claro que nesse caso, tendo em vista a conduta delinquente do majoritário, o minoritário deve ter o poder de exclui-lo, resguardando os interesses sociais, a referida produção ou prestação de serviços, os empregos, os tributos, a função social da empresa.

Se majoritário, por exemplo, passa a utilizar a empresa para traficar entorpecentes contra a vontade e os interesses do minoritário e principalmente da sociedade? Por que não permitir a continuidade dessa empresa com exclusão daquele que a usa de forma delinquente?

É certo que o majoritário tem direito a seu capital, que por sua vez pode ser arrestado pelo Poder Público como compensação dos prejuízos causados à sociedade.

Em certos casos, a lei prevê que o Poder Público se aproprie de propriedades do delinquente. Explicitamente de terras, veículos e bens equivalentes usados em tráfico de drogas.

Nada mais razoável, pois, que a empresa fique com quem a faça cumprir sua função social e não necessariamente a quem tenha a maioria das quotas.

*Percival Maricato, sócio do Maricato Advogados Associados.