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Opinião

Natália Soriani é especialista em Direito da Saúde.

Natália Soriani é especialista em Direito da Saúde. Foto: Divulgação

Foto: Divulgação Natália Soriani é especialista em Direito da Saúde. Natália Soriani é especialista em Direito da Saúde.

O Supremo Tribunal Federal (STF) está em processo significativo para enfrentar a crescente judicialização na área da saúde no Brasil. Este fenômeno, que não é recente, tem se intensificado nos últimos anos, gerou um número cada vez maior de ações judiciais que envolvem desde a obtenção de medicamentos específicos, problemas com rescisão de planos de saúde até a garantia de tratamentos médicos.

A judicialização da saúde é um problema complexo que envolve não sistema judicial, mas também a gestão política dos custos de saúde e a incorporação de novas tecnologias e medicamentos no sistema público. Para se ter uma ideia da dimensão do problemas, em 2023 foram propostas 500 mil novas ações sobre saúde no país. E de acordo com levantamento, 80% dos processos judiciais são deferidos em primeira e segunda instância.

A judicialização da saúde ocorre quando pacientes recorrem ao Judiciário para obter acesso a tratamentos, medicamentos e procedimentos médicos que não estão disponíveis ou são negados pelo Sistema Único de Saúde (SUS) ou por planos de saúde privados. Esse fenômeno é amparado pelo direito fundamental à saúde, previsto no Art. 196 da Constituição Federal de 1988, que estabelece que "a saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação".

No entanto, a judicialização da saúde apresenta desafios significativos. Muitas decisões judiciais são tomadas com base em informações técnicas insuficientes, o que pode levar a resultados que, embora bem-intencionados, não são os mais eficazes ou sustentáveis. Além disso, essas decisões podem gerar um impacto financeiro considerável, comprometendo o orçamento destinado à saúde e afetando a capacidade do sistema de atender a outras demandas.

Dentro desse contexto, o STF está constituindo um grupo de trabalho dedicado a analisar e propor soluções para os desafios associados à judicialização da saúde. A proposta é discutir e aprimorar ferramentas que possam auxiliar os juízes na formulação de suas decisões, oferecendo um suporte técnico e científico mais robusto. A iniciativa visa, sobretudo, reduzir o número de decisões que muitas vezes não possuem embasamento técnico adequado e que geram impactos financeiros e administrativos significativos para o sistema de saúde.

Uma das principais propostas em discussão é a criação de um sistema de informação contínua e ininterrupta, que seria uma evolução do atual sistema NatJus. A professora Ludhmila Hajjar, da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, é uma das defensoras dessa ideia. Ela sugere que o novo sistema utilize inteligência artificial para fornecer informações automáticas e atualizadas sobre temas de saúde, assim que os processos judiciais forem distribuídos. Este mecanismo permitiria uma resposta mais rápida e precisa às demandas judiciais, além de melhorar a qualidade das decisões proferidas pelos magistrados.

A conselheira do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), Daiane Lira, também apoia a implementação dessa proposta. Segundo ela, a adoção de inteligência artificial no fornecimento de informações sobre saúde pode representar um avanço significativo na gestão das demandas judiciais, proporcionando uma base de dados mais completa e acessível para os juízes. Este sistema permitiria uma análise mais detalhada e fundamentada dos casos, contribuindo para uma tomada de decisão mais eficiente e justa.  

A proposta de criação de um sistema de informação contínuo e a utilização de inteligência artificial são avanços significativos na tentativa de reduzir a judicialização da saúde. No entanto, a implementação dessas medidas exigirá um esforço conjunto de diversas instituições, incluindo o STF, o CNJ, o Ministério da Saúde e outras entidades envolvidas no sistema de saúde e judiciário. Será necessário garantir a integração e a colaboração entre essas instituições, além de desenvolver mecanismos de monitoramento e avaliação para acompanhar a eficácia das medidas implementadas.

Esta iniciativa do STF e das entidades envolvidas é uma resposta à necessidade urgente de encontrar soluções para a judicialização excessiva na saúde, que tem gerado um impacto considerável no orçamento público e na capacidade de gestão do sistema de saúde. A criação de um sistema de informação contínua e o uso de inteligência artificial representam uma evolução necessária para aprimorar a resposta do judiciário às demandas de saúde, garantindo maior eficiência e justiça nas decisões.

Portanto, a judicialização da saúde é um fenômeno complexo que envolve direitos fundamentais, questões técnicas e financeiras e a necessidade de um sistema de saúde eficiente e sustentável. As iniciativas que propões soluções são passos importantes na busca por um equilíbrio entre o direito à saúde e a sustentabilidade do sistema.

*Natália Soriani é especialista em Direito da Saúde e sócia do escritório Natália Soriani Advocacia.