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Economia

Foto: José Cruz/Agência Brasil

Foto: José Cruz/Agência Brasil

Com mais um capítulo acrescentado com as 28 condenações na Justiça, em 7 dias, sofridas pela Confederação Nacional de Agricultores Familiares e Empreendedores Familiares Rurais (Conafer), uma das entidades investigadas pela Polícia Federal na fraude do INSS, a expectativa é de que o Governo Federal anuncie nos próximos dias uma medida emergencial para devolver os valores descontados indevidamente de aposentados e pensionistas em uma das maiores fraudes já registradas no INSS.

Para o especialista em Direito Previdenciário, e mestre em Direito das Relações Sociais e Trabalhistas e CEO da WB Cursos, Washington Barbosa, a expectativa foi reforçada após a Advocacia-Geral da União (AGU) e o Instituto Nacional do Seguro Social confirmarem, em reunião semana passada, ações contra entidades suspeitas de praticar débitos ilegais. A solução terá que envolver medidas administrativas, jurídicas e orçamentárias, além do reconhecimento da responsabilidade do próprio INSS no episódio.

Segundo o Ministério da Previdência Social, foram registrados R$ 6 bilhões de débitos feitos em nome de entidades de classe, o que pode ter afetado cerca de 4,1 milhões de beneficiários. “Se deveria, na verdade, acionar todas essas pessoas para que elas digam se esse débito é real, se foi realmente autorizado ou não”, afirma Barbosa.

Caso o beneficiário negue que tenha autorizado o desconto, cabe ao governo instaurar processo administrativo contra a entidade. “Há de se acionar a entidade para que a ela tenha direito à ampla defesa e o contraditório, nos termos da lei do processo administrativo federal, para que se defenda, traga documentos, traga informações que possam confirmar que aquele débito havia sido autorizado. Isso aí é um trabalho imenso e que não sai de um dia para a noite”.

Responsabilidade solidária e o papel do INSS

O especialista diz que o INSS tem, no mínimo, responsabilidade subsidiária no caso e, na prática, responsabilidade solidária. “No meu ponto de vista, o que é que o governo deve fazer? Em primeiro lugar, é bom deixar claro que há responsabilidade do INSS nisso. No mínimo, a responsabilidade subsidiária. Ou seja, haveria de se acionar a entidade. Se a entidade não pagar, o INSS seria responsável”.

E complementa: “A meu ver, a responsabilidade é solidária, tanto da entidade quanto do INSS, porque ambos viabilizaram esse débito indevido. Quando a responsabilidade é solidária, você pode cobrar de um ou de outro. Lógico, as pessoas vão acabar cobrando do governo que tem maior condição de pagar”.

Crédito extraordinário: o “cheque especial” do governo

Diante da falta de previsão orçamentária para devolução imediata dos valores, Barbosa avalia que o Governo deve utilizar uma ferramenta emergencial prevista na legislação: o crédito extraordinário. “O governo não tem de onde tirar esses recursos, mas existe uma solução que se chama de crédito extraordinário. O que é esse crédito extraordinário? É um cheque especial que o governo tem por meio de uma medida provisória”.

Ele detalha o funcionamento da medida: “Em situações de urgência e imprevisibilidade, pode ser aberto um crédito extraordinário fora do orçamento. Isso é feito por meio de uma medida provisória e essa medida provisória é encaminhada para o Congresso e as duas casas têm de se manifestar em cima disso. Mas, a partir do momento que a medida provisória é publicada, os recursos já podem ser utilizados”.

Além disso, Barbosa acredita que o governo deverá criar uma MP específica para estruturar o pagamento: “Paralelamente, eu acho que o governo vai lançar uma outra medida provisória criando um programa de ressarcimento para os aposentados e pensionistas, e nesse programa ele vai estabelecer as condições de pagamento. Então essa seria, a meu ver, uma das poucas soluções do governo para fazer isso”.

“Pagadores de impostos vão pagar duas vezes”

Apesar de considerar justa e necessária a reparação aos beneficiários, o especialista alerta que a conta será repassada à sociedade. “Na verdade, os pagadores de impostos vão arcar com essas despesas duas vezes. Nós arcamos com as despesas, nós demos os recursos para o pagamento de benefícios. Esse dinheiro foi desviado e agora nós vamos novamente pagar esses valores, os pagadores de impostos, duas vezes, pagando exatamente a mesma coisa”.

Para Barbosa, o que está em curso é uma redistribuição perversa de recursos públicos: “Há de se deixar claro que, na verdade, isso vai significar uma transferência de recursos dos pagadores de impostos para os sindicatos e entidades”.

Saiba o que fazer

Já Renata Abalém, advogada, diretora Jurídica do Instituto de Defesa do Consumidor e do Contribuinte (IDC) e membro da Comissão de Direito do Consumidor da OAB/SP, lembra que o primeiro passo para saber se foi vítima da fraude é conferir detalhadamente o extrato de pagamento. “Em primeiro lugar, verificar no extrato de pagamento se existe o desconto indevido e sob qual rubrica ele está ocorrendo. É importante, para fins de reembolso, que o beneficiário saiba desde quando os descontos ocorrem e se houve variação de valores, além de saber qual entidade é a responsável”, orienta a especialista.

A consulta deve ser feita exclusivamente pelo site do INSS ou aplicativo Meu INSS, utilizando senha pessoal e intransferível. Renata Abalém alerta ainda para o cuidado com golpes e terceiros oferecendo "ajuda". “Toda e qualquer situação relacionada à suspensão do desconto ou pesquisa de valores descontados, deve ser feita pelos canais oficiais e a senha não deve ser transferida para ninguém”, reforça.

Se o desconto indevido for identificado, o beneficiário pode solicitar a exclusão da cobrança e registrar reclamação ou denúncia diretamente ao INSS. É possível ligar para o 135. Caso a suspensão não ocorra de forma imediata, a advogada recomenda recorrer ao Judiciário.

“Não havendo a suspensão do desconto imediatamente, o segurado pode ajuizar ação na justiça para impedir o desconto, e ainda mais, para reaver seu dinheiro. Esse reembolso, de acordo com o CDC, pode se dar em dobro e o beneficiário, a depender da sua situação, pode postular indenização por danos morais”, informa Renata Abalém.

A advogada também destaca que, ao buscar o Judiciário, é fundamental procurar um profissional de confiança: “Se por acaso o beneficiário pretender entrar na Justiça, que procure um advogado de sua confiança e não forneça informações por telefone”, alerta a especialista. (M2/AI)