Onze anos depois de começar a pagar aos bancos a conta dos subsídios concedidos a quem comprou imóvel pelo SFH (Sistema Financeiro da Habitação), o governo ainda tem um rombo de R$ 80,578 bilhões em suas contas para quitar.
O custo desse "esqueleto", no entanto, é muito maior. Se forem considerados os R$ 60,842 bilhões já pagos pelo governo, o custo acumulado da subvenção a quem comprou casa própria chega a R$ 141,42 bilhões.
Esse dinheiro equivale a quase dez anos de investimentos do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) ou a quatro anos de arrecadação da CPMF, o tributo do cheque (considerada a receita prevista para este ano, de cerca de R$ 35,5 bilhões).
A conta vem sendo paga pelo Tesouro desde 1996, quando o governo decidiu renegociar a dívida com os bancos. É como se cada um dos 3,7 milhões de contratos de compra da casa própria recebesse um desconto de R$ 39 mil, cuja conta é paga aos bancos pelo Tesouro.
"O problema está sendo equacionado aos poucos. Não há previsão de alterações no ritmo de pagamento dessa dívida", afirma o secretário do Tesouro Nacional, Arno Augustin.
O desequilíbrio nas contas do SFH tornou-se um problema na década de 80. A inflação estratosférica corroeu os salários e, obviamente, a capacidade de pagamento dos mutuários. A inadimplência aumentou, e o governo decidiu que iria reajustar as prestações dos contratos habitacionais do SFH abaixo das taxas previstas nos empréstimos originais.
Na prática, o que o governo fez foi cobrar menos dos tomadores de financiamentos e, ao mesmo tempo, garantir aos bancos que eles receberiam o que estava previsto nos contratos. O saldo devedor que se acumulou nesses contratos foi repassado ao FCVS (Fundo de Compensação das Variações Salariais), criado em 1967 com o objetivo de cobrir eventuais saldos devedores do SFH.
"A assunção desses compromissos [dos subsídios] ocorreu sem a imprescindível cobertura de recursos orçamentários. O FCVS (...) passou a assumir responsabilidades crescentes, incompatíveis com seu patrimônio e seu fluxo de caixa, acarretando, como conseqüência, o acúmulo da dívida ao longo do tempo", explica um documento do Tesouro na internet.
Subsídios elevados
Entre 1980 e 1990, há pelo menos cinco decisões do governo concedendo subsídios ou mudando as regras de reajuste das prestações. O ápice da subvenção foi no governo Sarney (1985/90). Em 1985, as prestações do SFH deveriam ser reajustadas em 242%, mas o governo decidiu que a correção seria de 112%.
Quando resolveu renegociar a dívida do FCVS com os bancos em 30 anos, com juros máximos de 6,17% anuais, o Tesouro Nacional o fez por meio da emissão de títulos da dívida interna. Nos últimos cinco anos, foram reservados R$ 13 bilhões anuais para pagar o subsídio à casa própria.
Esse valor, no entanto, nunca foi alcançado. É que a renegociação da dívida depende da iniciativa dos bancos. Cabe às instituições financeiras, depois que o mutuário encerra o pagamento das prestações previstas no contrato, submeter o financiamento a análise da Caixa Econômica Federal para definir o valor do saldo devedor que será refinanciado.
O Tesouro Nacional estima que 85% da dívida que ainda não foi refinanciada esteja na mão dos falidos bancos Nacional e Econômico. Cerca de R$ 20 bilhões em contratos habitacionais foram dados em garantia ao BC (Banco Central) nas operações do Proer --o programa de ajuda aos bancos. O restante está dividido entre a Caixa e a Emgea, empresa criada pelo governo para assumir e cobrar os contratos habitacionais de má qualidade que estavam com as empresas públicas.
Folha de S.Paulo