Os produtores de alimentos e a militância ambientalista não são incompatíveis e podem ser forças solidárias se forem desfeitas, ponto a ponto, as desconfianças que nos separam.
Considero perfeitamente possível que os dois lados firmem compromisso essencial de preservação dos recursos naturais sem prejuízos à segurança alimentar do país. De minha parte, insisto na proposta: que o primeiro de todos os compromissos seja o "desmatamento zero nas florestas".
Defendo a punição severa para quem desmatar floresta nativa na Amazônia e na mata atlântica. Acredito que o Brasil pode assumir esse compromisso radical em dezembro, na cúpula do meio ambiente de Copenhague, que se reunirá para definir o novo acordo que substituirá o Protocolo de Kyoto.
Para a agropecuária brasileira, comprometida com a questão ambiental e interessada no financiamento da redução das emissões de CO2, o governo brasileiro não tem que hesitar ou precaver-se. Não. Vamos mesmo para o desmatamento zero, sem arreglo. O país dispõe de terras, em processo de produção e com reservas para a expansão possível, suficientes para manter o abastecimento interno e exportar.
O que falta, e disso está ciente a opinião pública internacional - como se viu em Nova York, no mês de setembro, na rodada de manifestações de chefes de Estado que participaram da abertura da Assembleia da ONU -, é o estabelecimento de compensações aos produtores pela preservação das áreas de cobertura florestal sob sua responsabilidade.
Esse apelo justo e amplamente reconhecido é devido a quem paga um preço alto deixando de explorar suas propriedades, enquanto outros obtêm lucros e poder emitindo gases, especialmente o CO2, causadores do efeito estufa que ameaça o equilíbrio do planeta.
No plano interno, é preciso consolidar as áreas atuais de produção - um direito líquido e certo, pois foram incorporadas ao uso da agropecuária antes que fossem estabelecidas as atuais restrições. Não há sentido nas denúncias demagógicas e vagas que ameaçam a produção de trigo, arroz, milho, carne e frutas.
Em 40 anos, o peso do preço dos alimentos no orçamento das famílias brasileiras caiu de 48% para 18% e pode cair ainda mais, chegando brevemente a apenas 12%, dependendo da melhoria das condições de transporte (estradas, ferrovias e portos) e da desoneração dos impostos na cadeia de alimentos.
Até mesmo questões aparentemente polêmicas - como as chamadas APPs (áreas de preservação permanente) das margens de rios, encostas e topos de morro ou áreas sensíveis, que devem ser reflorestadas - podem ser resolvidas mediante a arbitragem insuspeita e precisa da ciência, cujos critérios e instrumentos (mapas pedológicos e levantamentos altimétricos, entre outros) prescindem de opiniões apaixonadas ou leigas e podem ser aplicados regionalmente por legislação estadual.
Regras claras, realistas e permanentes, que reconheçam os avanços de produção e de produtividade conquistados pela agricultura e que já não podem regredir, sob pena de aumento no preço dos alimentos e de queda das exportações, são essenciais ao entendimento. Vamos reconhecer e reparar nossos erros com humildade e racionalidade.
A quem mais do que à agropecuária as mudanças climáticas afetam decisivamente a ponto de levar à inviabilidade? Seriam os agricultores suicidas? Ou, por acaso, há setor econômico - ou qualquer outra atividade produtiva - que mais dependa da água e da terra do que a agropecuária? Seria justo com o Brasil importar alimentos de países que não têm leis ambientais claras e que já dizimaram todas as suas florestas?
Kátia Abreu é senadora da República pelo DEM-TO e presidente da CNA (Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil).