O procurador da República Álvaro Manzano, que responde pelo Ofício de Meio Ambiente, Patrimônio Cultural, Índios e Minorias da PR/TO, participa nesta terça e quarta-feiras, 13 e 14 de setembro, de reuniões que debatem a atual situação de índios da etnia avá-canoeiro, que habitam a Ilha do Bananal. A medida é parte do inquérito civil público instaurado com o objetivo de buscar a identificação da terra indígena tradicionalmente utilizada pela etnia, além de reparação por todos os danos sofridos por estes indígenas por parte do Estado brasileiro.
A primeira reunião acontece dia 13, a partir das 14 horas, na sede da Funai de Gurupi, com integrantes do grupo de trabalho da Funai encarregado da identificação do território ao qual teriam direito os avá-canoeiro. Na quarta-feira, 14, a partir das nove horas, a reunião acontece com representantes dos índios, na aldeia Canoanã, às margens do rio Javaés, na Ilha do Bananal.
O inquérito civil foi instaurado com base em artigo da antropóloga Patrícia Mendonça sobre as condições em que vivem os indígenas avá-canoeiro no interior da ilha, sua busca pela identificação do território ocupado tradicionalmente e o histórico de violências sofridas ao longo dos anos. As informações chegaram à PR/TO por intermédio da 6ª Câmara de Coordenação e Revisão do MPF. Patrícia tem longa experiência em pesquisas a respeito dos índios da região do Araguaia e se deparou com a situação dos avá-canoeiro durante o trabalho de campo para identificação de uma terra indígena da etnia javaé.
Os avá-canoeiro
No artigo Os avá-canoeiro do Araguaia hoje: uma perspectiva de futuro, a antropóloga esclarece que os avá-canoeiro ficaram conhecidos como um povo que resistiu ao colonizador, recusando-se a estabelecer contato pacífico. A perseguição e o extermínio da maioria levaram à sua dispersão e fragmentação em dois grupos. Apesar de eventuais confrontos, uma utilização diferenciada dos recursos naturais permitiu a convivência de um desses grupos, em um mesmo território, com os inimigos históricos javaé, pescadores e agricultores que se utilizavam preferencialmente das lagoas e rios. Devido à intensa perseguição, os avá-canoeiro se movimentavam mais no espaço e haviam abandonado a agricultura, tornando-se coletores e caçadores. Por questões de segurança, priorizavam as matas dos terrenos mais elevados entre os cursos d´água.
Após décadas de violências fomentadas pela sociedade regional e pelo Estado e convivência forçada e inferiorizada em território de etnia rival, a situação dos avá-canoeiro é considerada dramática. Apesar das severas condições alimentares terem sido relativamente atenuadas com o recebimento de aposentadorias e recursos de programas assistenciais nos últimos anos, sua marginalização social é reforçada de vários modos, um deles o não atendimento de seus pleitos em condições de igualdade com outros grupos étnicos.
Os sobreviventes do primeiro contato são apenas três pessoas, mas um grupo de descendentes que continuou se reproduzindo com índios javaé, tuxa e karajá soma hoje cerca de 20 pessoas. Apesar do forte contexto de discriminação, o grupo está em expansão, se autoidentifica como avá-canoeiro e mantém a língua de origem tupi-guarani viva, além de importantes conceitos e práticas culturais que os diferenciam de outras etnias indígenas e dos não índios.
Segundo a antropóloga, mesmo até hoje se vendo como cativos em terra de inimigos índios e não índios, os avá-canoeiro creem em um mito nativo e profético que prevê o retorno milagroso a uma terra própria. Neste contexto, a demarcação de uma área exclusiva seria a primeira possibilidade para estes índios reconquistarem a autonomia e a dignidade perdidas com o contato com a sociedade envolvente. (Ascom MPF-TO)