A Segunda Seção Especializada do Tribunal Regional do Trabalho da 10ª Região (TRT10) negou Mandado de Segurança impetrado por dois advogados contra decisão de juiz do Trabalho do Distrito Federal que determinou o bloqueio, na conta do escritório de advocacia dos autores, de valores que deveriam ter sido repassados a seu cliente em razão de processo ganho na Justiça do Trabalho. Para os desembargadores, a ausência de repasse dos créditos trabalhistas, por parte dos advogados, caracteriza o delito penal de apropriação indébita, conforme previsto no artigo 168 do Código Penal.
Ao pedirem a revogação da ordem de bloqueio com imediata liberação dos valores, os advogados alegavam que a determinação seria irregular, uma vez que dissociada de qualquer ato judicial ou comunicação prévia. Afirmavam, ainda, que a relação entre cliente e advogado é de ordem contratual cível, sem cunho trabalhista, não podendo por isso ser alvo de decisão de juiz do Trabalho.
Tipicidade penal
Mas, de acordo o relator do caso, desembargador Dorival Borges de Souza Neto, a despeito da natureza jurídica que envolve contrato firmado entre cliente e advogado, “nada pode afastar o dever de um profissional qualificado em lidar com lisura e integridade no exercício do mandato que lhe foi confiado”. A questão, no entender do relator, está além da alegada contratação civil, ganhando a tipicidade penal decorrente do não repasse do valor ao exequente na reclamação trabalhista. “A ausência de repasse dos corretos valores recebidos pelo profissional, reafirmada nos esclarecimentos prestados pela dita autoridade coatora, implica apropriação indébita nos exatos termos do artigo 168 do Código Penal”.
O dispositivo citado diz que é crime “apropriar-se de coisa alheia móvel, de que tem a posse ou a detenção”, e pune o autor do delito com pena de reclusão de um a quatro anos. Esta pena pode ser aumentada de um terço “quando o agente recebe a coisa em razão de ofício, emprego ou profissão” (parágrafo 1º, inciso III).
O desembargador defendeu a decisão do juiz de primeira instância. “No regular exercício do poder-dever de promover a prestação jurisdicional, o juiz trabalhista empenhará esforços a que o patrono libere o valor devido a quem de direito”. Além disso, ressaltou o relator, “é inadmissível exigir do empregado reclamante, que já enfrentou todos os percalços para receber seu crédito trabalhista, ingressar com nova ação civil e/ou penal para receber de seu patrono o que lhe foi reconhecido juridicamente”.
Assim, reconhecendo não existir direito líquido e certo dos advogados, o desembargador votou pelo indeferimento do pedido, determinando o encaminhamento do acórdão para a Ordem dos Advogados do Brasil – seccional DF e ao Ministério Público Federal para as providências que entenderem necessárias. A decisão foi unânime.
Entenda o caso
Um trabalhador ajuizou reclamação trabalhista, distribuída à 9ª Vara do Trabalho de Brasília, e após tramitação normal do feito, obteve ganho de causa. Em maio de 2016, após o julgamento de embargos à execução, foi expedido alvará em favor do autor da reclamação para levantamento de seu crédito, no valor de R$ 113,9 mil. A quantia foi sacada por advogado do cliente – que é um dos autores do mandado de segurança. Na sequência, os autos foram retirados em carga pelo outro advogado autor do MS. Por meses, a Secretaria da 9ª Vara tentou obter a restituição dos autos.
Em novembro de 2016, o reclamante compareceu à Secretaria da 9ª Vara, informando que seu advogado não havia repassado nem prestado contas do crédito sacado. Após tentativas de contato com o defensor, por meio de oficial de justiça, e diante da impossibilidade de contato, o juiz determinou o bloqueio de ativos do advogado. Cumprido o bloqueio, o advogado compareceu em juízo, alegando ter transferido o valor do depósito judicial para a conta bancária do escritório, o que levou o magistrado de primeiro grau a determinar, então, o bloqueio de ativos financeiros da sociedade advocatícia, medida contra a qual os advogados impetraram o MS, negado pela Segunda Seção Especializada do TRT10.
Processo nº 0000067-68.2017.5.10.0000 (PJe-JT) (TRT 10ª Região)