Os dados são alarmantes: o Brasil produz, anualmente, mais de 78,3 milhões de toneladas de resíduos sólidos, dos quais 13,5% (o equivalente a 10,5 milhões de toneladas) são de plástico. A quantidade é três vezes maior do que a produção de grãos de café, um dos principais artigos agrícolas do país, esperada para este ano – 3,4 milhões de toneladas, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Levantamento do Sindicato Nacional das Empresas de Limpeza Urbana (Selurb) estima que se o total desse montante de plástico fosse reciclado, seria possível retornar para a economia cerca de R$ 5,7 bilhões.¹
"O Brasil ainda destina inadequadamente cerca de 40% de todo o resíduo gerado no País. São bilhões de reais que poderiam ser revertidos para a construção ou modernização de aterros sanitários, ampliação dos serviços de coleta e outras atividades relacionadas à limpeza urbana. O gerenciamento de resíduos envolve uma rede complexa de atividades e a reciclagem é um pilar que precisa começar a ser desenvolvido como oportunidade de negócio. Do contrário, não terá resultado concreto", afirma Marcio Matheus, presidente do Selurb.
Esses números refletem uma realidade mundial, na qual o aumento do poder de compra da população e os altos investimentos em novas fábricas e tecnologias serão responsáveis por um aumento de cerca de 30% na produção de plástico em menos de 10 anos – resultando, diretamente, em mais lixo.
Por se tratar de um material de difícil decomposição, o plástico acaba se acumulando na natureza. Quando a gestão dos resíduos sólidos não existe ou é ineficiente, o lixo descartado de forma incorreta se acumula nas ruas e lixões e, com a chuva, acaba alcançando os corpos hídricos. O resultado é inevitável: chegar aos oceanos. Estimativas da Associação Internacional de Resíduos Sólidos (ISWA) indicam que, anualmente, 25 milhões de toneladas de lixo chegam ao mar – segundo a ONU, entre 60% e 80% desse montante é plástico.
"A maioria da população imagina que as culpadas pelo plástico nos oceanos são as cidades litorâneas ou embarcações. No entanto, a maior parte da contribuição vem das diversas cidades que possuem lixões próximos a rios e riachos. Estudos mostram que cerca de 80% dos resíduos que chegam ao mar vêm de locais distantes do litoral", revela Carlos Rossin, engenheiro especialista em sustentabilidade e coordenador de diversos estudos sobre resíduos sólidos.
Segundo ele, para reverter esse quadro, o Brasil precisa dar um primeiro passo essencial na gestão de resíduos, que é erradicar os quase três mil lixões existentes no País e implantar uma rede regionalizada de aterros sanitários, empreendimento desenvolvido para tratar adequadamente os resíduos.
"Se ilude quem acha que é possível fazer reciclagem em um País continental sem buscar soluções de escala. A reciclagem só será possível quando houver viabilidade econômica, o que inclui incentivos governamentais, com isenções fiscais, e estrutura logística para tal. A primeira medida é desenvolver soluções logísticas que concentrem esses materiais, como ecoparques – que apresentam, também, a estrutura dos aterros legalizados. A partir disso, será possível diluir os altos custos logísticos e trazer viabilidade econômica para que os materiais recicláveis cheguem à indústria a um preço atrativo, como aconteceu nos EUA", afirma Rossin, que foi diretor de Sustentabilidade da PwC e conselheiro do Pacto Global em São Paulo.
De acordo com o especialista, o modelo mais adequado ao Brasil é o aplicado hoje nos Estados Unidos, por ambos serem países de extensão continental, com facilidade em geração de energia e disponibilidade de grandes espaços, entre outros aspectos que influenciam a viabilidade econômica das soluções para o setor. Com 20 mil lixões – praticamente um por cidade – na década de 1960, os Estados Unidos implementaram 2 mil aterros sanitários regionais em 15 anos e, com isso, passaram a utilizar a mesma estrutura de tratamento para diversas cidades, reduzindo os custos logísticos, viabilizando economicamente a reciclagem e a estruturação de plantas de geração de energia dentro dos aterros.
Alerta para a questão do plástico
Celebrado nesta terça-feira (5 de junho), o Dia Mundial do Meio Ambiente deste ano tem como tema "Acabe Com a Poluição Plástica", em um esforço da Organização das Nações Unidas – ONU de mobilizar governos, setor privado, comunidades e indivíduos sobre os perigos do consumo excessivo de produtos plásticos descartáveis.
Os problemas em torno da gestão de resíduos têm impactos não só no curto prazo, mas também comprometem uma série de avanços, como o cumprimento dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) – definidos durante a Cúpula das Nações Unidas em 2015 e que deveriam ser atingidos até 2030. Considerados por especialistas o grande desafio dos próximos anos, esses objetivos envolvem a redução da geração de resíduos por meio de redução, reciclagem e reuso de materiais, o aumento da conscientização sobre desenvolvimento sustentável e a redução da poluição marinha, especialmente a advinda de atividades terrestres – algo que só será possível se governo, iniciativa privada e sociedade atuarem de forma conjunta.
¹ Cálculo realizado considerando o montante de plástico destinado inadequadamente por ano (41,6% do total, segundo Panorama Nacional dos Resíduos Sólidos 2016) multiplicado pelo preço médio do plástico geral praticado nacionalmente em maio de 2018 (1,32 reais).