A Câmara dos Deputados, por esmagadora maioria, aprovou alteração da Lei da Ficha Limpa, flexibilizando a inelegibilidade decorrente das rejeição de contas de gestores públicos prevista na alínea “g” do inciso I do artigo 1º da Lei 64/90. O texto do projeto de lei propõe impedir a aplicação da “pena máxima” da inelegibilidade aos políticos que tiveram as contas rejeitadas ao ocupar cargos públicos e forem punidos apenas com multa.
A proposta inseriu o parágrafo 4º-A, o qual afasta a inelegibilidade nas hipóteses em que a única pena imposta ao gestor é a multa, senão vejamos:”§ 4o-A. A inelegibilidade prevista na alínea ‘g’ do inciso I deste artigo não se aplica aos responsáveis que tenham tido suas contas julgadas irregulares, sem imputação de débito, e sancionados exclusivamente com o pagamento de multa.”
A redação proposta é imprecisa e está em contradição com a alínea “g” do inciso I do artigo 1º da Lei Complementar 64/90. Explica-se. Atualmente a legislação de regência estabelece que: “g) os que tiverem suas contas relativas ao exercício de cargos ou funções públicas rejeitadas por irregularidade insanável que configure ato doloso de improbidade administrativa, e por decisão irrecorrível do órgão competente, salvo se esta houver sido suspensa ou anulada pelo Poder Judiciário, para as eleições que se realizarem nos 8 (oito) anos seguintes, contados a partir da data da decisão, aplicando-se o disposto no inciso II do art. 71 da Constituição Federal, a todos os ordenadores de despesa, sem exclusão de mandatários que houverem agido nessa condição”.
Dessa forma, para que haja a imposição da gravíssima sanção política da inelegibilidade, o gestor púbico tem que ter sua conta rejeitada por irregularidade insanável que configure ato doloso de improbidade. Portanto, são irregularidades que não ensejam a imposição apenas de pena de multa ao gestor, em decorrência da gravidade da irregularidade que possibilidade a declaração de inelegibilidade.
A Câmara dos Deputados teria contribuído mais se tivesse proposto alteração do dispositivo com escopo de esclarecer o que vem a ser vício insanável. A maioria das discussões na seara eleitoral reside na amplitude do termo “irregularidade insanável”, o que pode resultar em indevida declaração de inelegibilidade.
A alteração aprovada pela Câmara dos Deputados, que segue para o Senado e depois para sanção do presidente Jair Bolsonaro, será absolutamente inócua, haja vista que raramente termos uma irregularidade insanável decorrente de ato doloso de improbidade que resultará apenas na imposição de pena de multa.
Marcelo Aith é advogado especialista em Direito Público e professor convidado da Escola Paulista de Direito (EPD).