O brasileiro está gastando menos com obras em suas moradias ao passar dos anos. É o que revela estudo comparativo promovido pelo Sindicato Nacional da Indústria do Cimento (SNIC), a partir dos dados da última Pesquisa de Orçamento Familiar (POF), do IBGE -- Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. De acordo com as conclusões apontadas na pesquisa, se em meados dos anos 1990, cerca de 6% da renda familiar era direcionada para obras, reformas e pequenas melhorias, em sua última edição em 2018, a constatação foi de que apenas 1,9% de todos os ganhos tiveram o mesmo destino.
Fonte: Dados IBGE avaliados pelo SNICPara o diretor executivo do SNIC, Bernardo Jannuzzi, boa parte da queda é explicada pela mudança no perfil de consumo da população brasileira. “Nos últimos 20 anos houve transformações profundas não apenas com relação aos avanços tecnológicos, às mudanças climáticas, ao cenário político-econômico mas, principalmente, no comportamento das pessoas e aos seus hábitos de consumo. Durante esse período os brasileiros passaram a adquirir mais produtos como celulares, carro e eletrodomésticos e serviços como televisão a cabo, streaming, internet e viagens”, revela.
Em 2018, as famílias brasileiras despenderam R$ 86,765 bilhões em obras. Desse valor, 40,8% referentes a manutenção e reparos e 59,2% em construções e reformas. Enquanto o primeiro tipo de obra apenas repõe o capital investido, o segundo expande o valor do capital investido na moradia. Em termos nominais, essas despesas indicaram um crescimento de 23,5% comparadas com o resultado da POF de 2008, ou seja, um crescimento médio anual de apenas 2,1%. Em termos reais, considerando a inflação dos preços dos materiais e mão de obra, o resultado se inverte, com queda de 18,8%, o equivalente a um decréscimo médio anual de 2,1%.
Ao longo de 2018, 21,4 milhões de unidades domiciliares realizaram algum tipo de obra, ou seja, três em cada dez famílias fizeram obra em suas moradias. Logo, o valor médio das despesas com obras foi de R$ 4.063,00 em cada residência por ano. Em termos per capita, o gasto anual com obras caiu 25%, saindo de R$ 559,90 em 2008 para R$ 418,94, em 2018.
Consumidor domiciliar de cimento
Durante muito tempo associou-se o consumidor domiciliar de cimento, o chamado “consumidor formiga”, às famílias de baixa renda. Entretanto, a POF revela que esse consumidor está presente em todas as classes de renda.
“As unidades consumidoras que recebem até três salários-mínimos consumiram 29,2% do cimento. Já as famílias compreendidas na faixa entre três e cinco salários-mínimos foram responsáveis por 24,7% desse consumo. Os consumidores com renda entre cinco e dez salários-mínimos foram destino de 29% do produto. Já aqueles que receberam mais de 10 salários-mínimos ficaram com 17,1%. Portanto, a distribuição do cimento é uniforme entre as diversas classes de renda”, ressalta o diretor do SNIC.
Ao analisar o consumo de cimento pelos diversos mercados, o auto construtor foi responsável, em 2018, por 17,6% de todo cimento utilizado, sendo que os outros 82,4% foram consumidos através de construtoras e outros produtos a base de cimento.
Fonte: Dados IBGE avaliados pelo SNIC“As estatísticas da POF indicam padrões comportamentais úteis para avaliações de médio e longo prazo e entender situações extremas de curto prazo que ocorreram durante a pandemia. No longo prazo, o crescimento econômico, os avanços da renda e o acúmulo de patrimônio levam à expansão sustentada do consumo. Estima-se que cada aumento de 10% na renda das famílias haja um avanço de 2,2% nas despesas com obras (manutenção/reparo e construção/reforma) e um crescimento de 2% no gasto com cimento”, explica.
Pandemia
Com a pandemia e o redirecionamento dos gastos para obras e reformas, estima-se que as despesas com obras tenham comprometido 2,5% da renda das famílias.
Nesse período, a atividade da construção civil foi considerada essencial enquanto a maioria dos serviços e estabelecimentos permaneceram fechados e boa parte dos trabalhadores foram impedidos de saírem de suas casas. Com isso, a residência deixou de ser apenas um local de refúgio para se transformar num lugar de trabalho e lazer. Ademais, a maioria dos comércios aproveitou o momento de pausa das atividades e promoveram obras e reformas significativas, inexequíveis em dias de normalidade. Com isso, verificou-se um significativo aumento da autoconstrução.
“As políticas de afastamento social levaram a uma forte queda do setor de serviços, entretenimento e viagens, liberando recursos para o consumo de outras mercadorias. Somando-se a esse movimento a evolução da renda entre 2018 e 2020, estima-se uma disponibilidade de R$ 72,4 bilhões em 2020, sendo que 36,6% desse montante foi destinado a realização de obras. Com isso, as despesas com obras saltaram de 1,9% em 2018 para 2,5% da renda total das famílias”, revela o diretor.
No entanto, fatores que estiveram por trás desse excepcional desempenho começaram a desaparecer em 2021. “O elevado nível de desemprego da economia, a queda da renda, o expressivo aumento da inflação, a retomada do ciclo de expansão dos juros e alto endividamento das famílias foram as principais razões para o arrefecimento do consumo de cimento pelo chamado autoconstrutor”, explica.
Com a reabertura gradual da economia, a renda da população foi direcionada para serviços que estavam fechados como restaurantes, viagens e entretenimento, diminuindo o gasto com construção.
Atualmente acredita-se que o gasto com obra tenha retornado para nível inferior a 2% da renda familiar, perdendo o ganho registrado em 2020.
Perspectivas
Para o diretor do SNIC, o ano de 2022 apresenta inúmeras incertezas no cenário político e econômico, nacional e internacional, que vem afetando a indústria do cimento. “Diante desse cenário é fundamental termos outros indutores de demanda por cimento, como a volta do investimento em infraestrutura e habitação por parte do governo. Nos últimos anos percebemos uma tímida retomada das obras de infraestrutura, mas ainda muito aquém das necessidades brasileiras. O programa habitacional Casa Verde Amarela, por exemplo precisa ser alavancado e desempenhar seu papel em diminuir o enorme déficit habitacional existente”, afirma.
Sobre o SNIC
Fundado em 1953, o Sindicato Nacional da Indústria do Cimento foi constituído para fins de estudo, divulgação e representação legal da Indústria do Cimento junto às autoridades administrativas e judiciárias, os interesses gerais da categoria e os interesses individuais de seus associados. Entre suas principais atuações estão a colaboração com o Estado, como órgão técnico e consultivo, no estudo e solução dos problemas relacionados à indústria do cimento, e a prestação de serviços de assistência jurídica e técnica aos seus associados nos assuntos econômicos, tributários, meio ambiente, mineração, prevenção de acidentes e segurança do trabalho.