Com o painel “A Fome no Mundo: Segurança Alimentar Pós Pandemia”, o terceiro e último dia do XIV Congresso Internacional em Direitos Humanos, realizado no Tribunal de Justiça do Tocantins (TJ/TO), que tem como tema central a Proteção dos Direitos Humano em cenário de Guerra e Pós-Pandemia, foi aberto por participantes de três países: Brasil, Bolívia e Moçambique.
Mediado pelo doutor em Educação pela Universidade Federal de São Carlos (SP), Paulo Sérgio Gomes, que também é professor no mestrado em Prestação Jurisdicional e Direito Humanos (UFT/Esmat), o painel contou com a participação de Egidio Paulo Guame (Moçambique), Cláudia Pilar Aranibar (Bolívia) e Newton Narciso Gomes Júnior.
Os três convidados falaram sobre o agravamento da falta de alimentação em seus países e no mundo com a pandemia de Covid-19, os níveis de desigualdade social que cresceram com a crise sanitária mundial e os reflexos disso após o seu período mais severo.
Para Egidio Paulo Guambe, que é PhD em Ciência Polícia pela Universidade de Bordeaux (França), em Moçambique, um país que tem crises cíclicas por conta de desastres, instabilidade governamental e vive um conflito grave no extremo norte do país, a pandemia agravou a insegurança alimentar da população que é obrigada a fazer deslocamentos forçados gerados por diversas situações.
“Moçambique por muito tempo vive a insegurança alimentar aguda. A situação que desloca as pessoas para a fase de emergência se deve à combinação de conflitos, da economia em declínio agravada por instabilidade política, de eventos climáticos extremos e dos impactos da pandemia. As pessoas são forçadamente empurradas para as zonas urbanas, que não estão preparadas para receber a demanda crescente. Os direitos fundamentais são feridos a todo instante. Garantias não prevalecem e o estado não tem preparo para lidar com essas questões, com a população sofrendo as consequências da dinâmica de conflito, dos preços dos alimentos e da grandeza dos impactos da pandemia de Covid-19, um cenário ideal para colapsar o sistema alimentar”, pontuou.
Desigualdade social
Doutoranda do Programa de Desenvolvimento Rural da UAM (México), a boliviana Claudia Pilar fez explanações sobre como foi o inicio da pandemia no seu país e como os mais ricos causaram desabastecimento alimentar, o que gerou aumento da desigualdade social.
“A pandemia de Covid-19 coincidiu com um período de instabilidade social na Bolívia. Tivemos um golpe de estado de novembro de 2019. A falta de legitimidade dos novos governantes e sua incapacidade de lidar com os contágios da doença e cuidar da população resultaram em uma crise sanitária de grandes proporções, que gerou diversas outras crises. Faltavam medicamento e equipamentos de proteção, faltava o básico da atuação governo. O risco das pessoas morrerem de fome também passou a ser real. As pessoas ricas passaram a fazer estoque de comida, o que causa escassez ao restante da população e o governo não tinha como oferecer segurança alimentar para as camadas desprivilegiadas da população. Isso soma à desigualdade social de um país que estava no meio de instabilidade governamental. A fome é um indicador que direitos fundamentais estão sendo deixados de lado. Em muitas constituições o direito à alimentação é garantido, contudo, na prática isso não acontece”, explicou.
Dados
Em sua apresentação, o doutor em Política Social pela UnB, Newton Narciso Gomes mostrou dados e fontes sobre os números da fome no mundo. “Pelo menos 1 bilhão de pessoas no mundo não têm o que comer, ou seja, passam fome, o que claramente fere inúmeros direitos humanos e gera um abismo entre as classes sociais. Essa fome tem raça, gênero e lugar. O que precisa ser repensando é o nosso modelo de produção de alimentos e o aceso a eles. São 3,1 bilhões de pessoa que não tem acesso a comida saudável, por exemplo, devido as restrições de renda. Temos abundância de comida, mas falta renda. Sabemos que é um problema político, não exclusivo de alguns países, como vimos nos relatos dos colegas. O Brasil, por exemplo, durante a pandemia, teve 14 milhões de brasileiros a mais em situação de insegurança alimentar grave e chegamos 33 milhões, isso não pode ser normalizado”, destacou. (TJ/TO)