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Cidades

Foto: Thomas Baurer

Foto: Thomas Baurer

De acordo com uma pesquisa do Sistema de Alerta de Desmatamento do Cerrado (SAD Cerrado) realizada pelo Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (IPAM) e do MapBiomas e divulgada pela Agência Pública, se o desmatamento do bioma, que predomina em 87% do território tocantinense continuar seguindo o curso atual, cerca de 108 municípios correm o risco de ficar sem água. O levantamento destaca ainda que 74,5% do desmatamento do bioma ocorreu nas cinco bacias hidrográficas na região do Matopiba (polígono entre as fronteiras de Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia).

O estudo detalha que o desmatamento da vegetação nativa nas bacias dos rios Araguaia, São Francisco, Parnaíba, Tocantins e Itapecuru chega a 599.007 hectares e implica na diminuição da capacidade de partilha e filtração de água nos Estados de Maranhão, Piauí, Goiás, Bahia e Mato Grosso, além do Tocantins, que de acordo com os dados disponibilizados, ocupa a 2ª colocação em área de vegetação desmatada com 1.710,55 km², ficando atrás apenas do Maranhão com 2.281,72 km².

Ludimila Carvalho, quilombola, ativista e agente da Comissão Pastoral da Terra de Araguaína (CPT-AT) na Defesa do Cerrado, frisa que é preciso responsabilizar os causadores diretos pela destruição do bioma e pela violência no campo, grileiros, latifundiários, empresários e financiadores do desmatamento e até mesmo o Naturatins, além do próprio Estado como um todo pela omissão na defesa do Cerrado, cujo impacto afetará a nível nacional. “Esses números por si só são desesperadores, mas não é só sobre números, é sobre pessoas, povos do campo e da cidade, é sobre a biodiversidade, é sobre a água que bebemos e água é vida”, reforça.

A ativista reforça que o problema não está no futuro, mas no presente, sendo urgente compreender que os impactos climáticos, o envenenamento e o desabastecimento de água causados pela destruição do Cerrado já vem se agravando há algum tempo. “Me preocupa o quanto estamos expostos enquanto comunidades tradicionais, seja as comunidades expulsas violentamente de seus territórios, como a minha, como as que ainda resistem no que ainda resta de seus territórios. Nossos povos do Cerrado estão adoecidos, estão sendo mortos pela expansão das políticas e projetos de morte promovidas pelo agronegócio”, enfatiza.

“Precisamos lutar juntos, quilombolas, indígenas, ribeirinhos, assentados, posseiros, acampados, os povos cerradeiros. Resistir é a palavra de ordem. Denunciar também. Mas o que tem que ser feito urgentemente é paralisar quem está destruindo, essa é a única solução, o Cerrado é conhecido pela sua capacidade de se recuperar, se recompor, mas isso não pode ficar para amanhã, tem que ser agora. E para além disso, nossos povos existem, estamos organizados e não vamos recuar”, finaliza.

Mais dados alarmantes

Ainda, de acordo com uma pesquisa realizada com o apoio da instituição membro da Coalizão Vozes do Tocantins por Justiça Climática, Instituto Sociedade, População e Natureza (ISPN) e publicado na revista científica internacional Sustainability, o impacto do desmatamento pode gerar uma perda de água nas bacias hidrográficas do bioma em 23.653 m³/s nos próximos 28 anos. Isto equivale a 34% dos recursos totais e cujo volume de água corresponde à vazão de oito rios Nilo.

“O desmatamento para agricultura em larga escala, que demanda intensa irrigação, altera o ciclo hidrológico de forma que diminui vazão dos rios. Os principais problemas derivados das mudanças do clima são a evapotranspiração potencial e a chuva. Estamos tendo chuvas mais concentradas, em períodos mais curtos, e os períodos de seca estão sendo mais longos”, explica o doutor em Ciências Florestais e diretor do Instituto Cerrados, Yuri Salmona.

“Como as chuvas estão concentradas em períodos menores, infiltra menos água no aquífero subterrâneo e a disponibilidade hídrica para o período seco diminui. Então, a chuva não está diminuindo na maior parte das áreas analisadas, ela está tendo maior dificuldade de infiltrar no aquífero. Do ponto de vista climático, é muito grave o aumento da radiação solar, o que implica mais evapotranspiração potencial e menos água no solo disponível para escorrer pelos rios”, destaca o pesquisador.

O estudo conclui que, se as taxas de desmatamento não tiverem uma redução drástica, a escassez hídrica será uma realidade mais comum em menos de 30 anos, o que afetará a própria agricultura, a produção de energia elétrica, a biodiversidade e o abastecimento de água das populações, especialmente durante as estações secas.