A imposição das tarifas recíprocas em abril e, depois, o tarifaço de 40% sobre as importações brasileiras, a partir de agosto, pelo governo Trump levaram a um cenário de incertezas e expectativas pessimistas em relação ao desempenho da balança comercial. No entanto, como as edições anteriores do ICOMEX mostraram a queda das exportações para os Estados Unidos foi compensada com o aumento para outros destinos, em especial a China. Além disso, em novembro foi iniciado o degelo das relações entre o Brasil e os Estados Unidos, o que levou a movimentos favoráveis para o Brasil.
No dia 14 de novembro, o governo dos Estados Unidos anunciou a isenção das tarifas recíprocas de 10% sobre 238 produtos agrícolas, o que beneficiava todos os países. Em 20 de novembro foi anunciada a remoção do tarifaço de 40% de 269 produtos, sendo 249 do setor da agropecuária. Os efeitos dessa remoção só ficarão visíveis a partir de dezembro/janeiro.
O tarifaço de Trump afetou o desempenho exportador do Brasil para os Estados Unidos, mas as exportações registraram crescimento positivo em termos globais. Para a queda no saldo da balança comercial contribuiu, principalmente, o aumento das importações, que foi generalizado em todos os mercados, destacando-se o aumento do déficit com os Estados Unidos que superou a redução do superávit com a China.
Nessa edição do Indicador de Comércio Exterior (Icomex), divulgado pelo FGV Ibre nesta quinta-feira, 18, são apresentados alguns dados sobre o efeito do tarifaço, depois da análise dos resultados da balança comercial de novembro de 2025.
A Balança Comercial de novembro
A balança comercial de novembro registrou um superávit de US$ 5,8 bilhões. As exportações aumentaram em valor +2,4% e as importações em +7,4%. Na comparação do acumulado do ano até novembro, o saldo foi de US$ 57,8 bilhões, um recuo de US$ 11,7 bilhões em relação a igual período de 2024. As exportações cresceram em valor +1,8% e as importações +7,2%, na comparação dos acumulados do ano. Com esses resultados, a balança comercial de 2025 deverá ficar entre US$ 61 e US$ 65 bilhões.
Na comparação da variação dos índices de preços e volume, em novembro, a variação das exportações em volume foi de +4,6% e das importações, de +4,5%. No acumulado até novembro, o aumento das exportações foi de +4,3% e das importações de +7,7%. Os preços dos fluxos de comércio recuam, exceto entre os meses de novembro para as importações (+2,8%).
Os termos de troca registraram uma queda de 1,9%, na comparação entre a média de janeiro a novembro de 2024 e de 2025 e um aumento de 0,7% em relação à média de igual período de 2023. De forma geral, o índice tem ficado relativamente estável.
A principal contribuição para a queda no saldo da balança comercial no acumulado do ano até novembro, em comparação ao de 2024, foi o aumento do déficit com os Estados Unidos, que passou de US$ 800 milhões para US$ 7,9 bilhões, um aumento de US$ 7,1 bilhões. O superávit da China caiu, mas a redução foi de US$ 3,3 bilhões (passou de US$ 30,7 bilhões para US$ 27,4 bilhões) e, na direção oposta, aumentou o superávit da Argentina em US$ 5,1 bilhões, sendo de US$ 5,2 bilhões, em 2025. Para explicar o recuo de US$ 11,7 bilhões no saldo total, outros países/blocos também registraram piora nos saldos comerciais, como a União Europeia.
Ressalta-se outra mudança na estrutura da balança comercial. No acumulado até novembro de 2024, o superávit da conta de petróleo e derivados foi de US$ 26,8 bilhões e em 2025 de US$ 27 bilhões. A contribuição dessa conta para o saldo positivo da balança foi de 38,6%, em 2024, e passou para 46,7%, em 2025. Nos anos de 2022 e 2023, a contribuição foi de 25%.
O aumento do superávit de petróleo e derivados no acumulado do ano está associado, principalmente, à redução, em valor, nas importações (-10,9%) superior ao das exportações (-5,2%). Em adição, a queda nos preços exportados superou o das importações, o que compensou o aumento do volume exportado. No caso do petróleo bruto, a variação dos preços exportados foi de -9,3% e o volume cresceu em +5,7%. Nas importações, os preços recuaram em 12,7% e o volume em 14,5%.
O comportamento das exportações e importações, em termos de volume, nos principais parceiros comerciais do Brasil está descrito no Gráfico 4. Em novembro, a China liderou as exportações (+42,8%) e para os Estados Unidos, a queda foi de -28,0%. Na comparação do acumulado, a liderança foi da Argentina (+38,0%), mas a partir do segundo semestre foi observada uma desaceleração nas exportações, que na comparação de novembro foi de -2,3%. Resultado inverso ao da China, que acelerou as exportações no segundo semestre e, no acumulado, a variação foi de +10,4%. Para a União Europeia, as exportações recuaram em -16,4%, em novembro, e no acumulado do ano, em -1,4%. E para os Estados Unidos, na comparação do acumulado, a queda foi de -7,0%.
Nas importações, a liderança em novembro foi dos Estados Unidos (+19,2%), seguida da União Europeia (+8,1%) e da China (+6,0%). No acumulado do ano, a liderança é da China (+17,2%) seguida dos Estados Unidos (12,6%).
Uma característica do ano de 2025 tem sido o melhor desempenho das não commodities, aumento de 6,8%, na comparação dos acumulados do ano até novembro e em relação ao das commodities, aumento de 3,1%. Com a aceleração do aumento das exportações para a China, a partir de meados do ano, cresceram as vendas das commodities. Em novembro, as commodities aumentam em volume, 8,1% e as não commodities, recuaram em 2,9%. Os preços das commodities registraram recuo nas duas bases de comparação: -4,2% (mensal) e -4,6% (acumulado no ano).
Os índices de volume por setor de atividade refletem, em parte, o desempenho das commodities agrícolas. Na comparação do acumulado do ano, as variações foram: agropecuária (+2,3%); extrativa (+4,6%); e, transformação (+5,3%). Em novembro, a agropecuária cresceu 21,6%, a extrativa recuou em 9,6% e a transformação aumentou em 7,3%.
A variação interanual em valor do mês de novembro dos 5 principais produtos exportados em ordem decrescente de participação foi: petróleo (-21,3%); minério de ferro (+10,5%); soja (+64,6%); carne bovina (+57,9%) e café (+9,1%). Na comparação do acumulado até novembro, a mesma comparação resultou em: soja (-0,1%); petróleo (-4,3%); minério de ferro (-6,1%); carne bovina (+39,8%); e café (+28,9%). Café e a carne bovina, que até novembro estavam no tarifaço de Trump, registraram o melhor resultado no ano.
Em novembro, as importações de bens de capital na indústria aumentaram em 8,0% e na agropecuária em 55,1%. No acumulado do ano, essas variações foram +7,6% para a indústria e -4,7% na agropecuária. Compras de bens intermediários aumentaram na indústria e caíram na agropecuária, em novembro. No entanto, os dados mostram um cenário de expectativas mais favoráveis no setor agropecuário do que na indústria.
O tarifaço de Trump afetou o desempenho exportador do Brasil para os Estados Unidos, mas as exportações registraram crescimento positivo em termos globais. Para a queda no saldo da balança comercial contribuiu, principalmente, o aumento das importações que foi generalizado em todos os mercados, destacando-se o aumento do déficit com os Estados Unidos que superou a redução do superávit com a China.
O efeito Trump e o papel da China
Como já observado em edições anteriores do ICOMEX, o comportamento dos 3 principais mercados de destino das exportações brasileiras mudaram ao longo do ano. A Argentina liderou o aumento do volume das exportações associado ao setor automotivo, mas a partir de julho, os aumentos tenderam a desacelerar e, em novembro houve queda de 2,3%. A participação do país no total exportado pelo Brasil ficou abaixo de 6,3% e, em novembro foi 4,8%. Não é suficiente para assegurar um aumento das exportações totais do Brasil que compensem a queda das vendas para os Estados Unidos.
A China começou o ano com recuos na variação mensal e só começou a registrar aumentos de 2 dígitos a partir de agosto.O desempenho dos Estados Unidos contrasta com o da China, com resultados melhores nos 7 primeiros meses do ano e, depois, variações mensais negativas, desde o início do tarifaço em agosto. A participação da China ao redor de 30% nas exportações brasileiras contribuiu para compensar a queda das vendas para os Estados Unidos.
O Gráfico 9 mostra a variação em termos de valor dividida pelo período antes e depois do tarifaço. A importância da China para o aumento das exportações brasileiras fica clara. De janeiro a agosto, as exportações para a China recuaram em -6,7%, para igual período de 2024, as dos Estados Unidos aumentaram em +4,6% e as exportações globais do Brasil em +0,1%. No período de agosto a novembro, as exportações para os Estados Unidos registraram queda de -25,1%, para a China, aumento de +28,6% e o total cresceu +5,0%. No acumulado do ano, queda para os Estados Unidos (-6,7%), aumento de +4,2% para a China e 1,8% para o total.
O Gráfico 10 repete o mesmo exercício comparando as variações em volume. Destaca-se o período de agosto a novembro, quando as exportações para os Estados Unidos caem em -23,5% e aumentam para a China em +30,0%, levando a um aumento global de 7,8%. No período de janeiro a julho, China cresceu +1,3%, Estados Unidos, +2,8% e global, +2,2%, O resultado acumulado já foi analisado nos Gráficos 1 e 4.
Trump superestimou a capacidade dos Estados Unidos em provocar danos gerais às exportações brasileiras. Além disso, como alguns dos produtos tarifados com 50% fazem parte da cesta de consumo da população do país, teve que recuar como comentamos no inicio dessa edição. Os resultados de novembro ainda não espelham essa medida.
O Indicador de Comércio também mostra a variação entre agosto-novembro de 2024 e 2025 por setor CNAE 2.0 das exportações para os Estados Unidos e a participação das exportações dos Estados Unidos nas exportações totais do Brasil do mesmo setor. Destaca-se alguns setores para os quais o mercado dos Estados Unidos é relevante, mas que os resultados de compensar com vendas para o resto do mundo não foram exitosas.
O primeiro seria o setor de Pesca, onde a participação do mercado dos EUA era de 81,8% e caiu para 60,2%, na comparação do período de agosto a novembro de 2024 e 2025. Em valor, as vendas para os EUA recuaram em 48% e, em volume, 33,2%. Há aumento de vendas para o resto do mundo em 55,4%, mas o volume global recuou em 6,6%. No caso, não temos o índice de volume resto do mundo, mas, mesmo que tenha crescido, não compensou para as exportações totais.
O segundo é de Produtos de Madeira, com recuo na participação de 47,9% para 32,1%. Há perdas para o mercado dos Estados Unidos e resto do mundo, com recuo em volume de 48,7% para os Estados Unidos e 22,6% para o total.
O terceiro destacado é o de Fabricação de Móveis, com queda de 10 pontos percentuais na participação dos Estados Unidos, aumento em valor para o resto do mundo em 6,2%, não suficiente para elevar o volume global.
Um outro grupo são setores com participação abaixo de 10% no mercado dos Estados Unidos e que sofreram perdas em valor e volume para os Estados Unidos, mas compensaram com aumento em valor para o resto do mundo e crescimento no volume global, como Agricultura, Fabricação de Bebidas, Fabricação de Produtos Alimentícios, Produtos de Fumo e Veículos Automotores, que estão sinalizados em azul. Outros desse grupo em azul, a diferença que o mercado dos Estados Unidos registra participações acima de 10%, como Vestuário e Acessórios, Metalurgia e Máquinas e Equipamentos.
Setores onde todas as variações foram negativas são: Produção Florestal; Artefatos de Couro; Máquinas e Aparelhos Elétricos; outros Equipamentos de Transporte.
Também são mostrados os 30 principais produtos exportados no período de agosto a novembro, com as variações em valor para os EUA e o Resto do Mundo (RM), Entre os produtos não isentos do tarifaço, há uma variedade de situações. Alguns diminuem as vendas para os EUA, mas aumentam para o Resto do Mundo; como a carne bovina, café, preparações alimentícias de carne bovina, por exemplo. Outros aumentam as vendas para os EUA e o resto do mundo como Dumpers e Bulldozers e outros aumentam para o EUA e reduzem para o resto do mundo, como outras chapas e tiras de alumínio.
Entender que fatores determinaram esse comportamento requer a construção de um quadro com diversas variáveis, como o fabricante do produto (origem do capital); o produto faz parte de uma cadeia de produção que pode ser desviado para outro mercado onde existe uma fábrica do mesmo controle acionário; não existem fornecedores alternativos; entre outros. No caso de produtos agropecuários e da indústria extrativa, ou commodities de forma geral, é relativamente mais fácil identificar se há ou não alternativas, como mostrou o caso da carne bovina.
Com a suspensão do tarifaço sobre grande parte dos produtos agropecuários, a negociação não termina. O desafio agora é conseguir tirar o tarifaço das manufaturas que não foram isentas. Lembramos que os Estados e a Argentina constituem os principais mercados desses produtos para o Brasil, sendo o dos EUA mais diversificado. Por fim ainda não se tem notícia que concessões o Presidente Trump deseja do Brasil. A imprevisibilidade e incertezas continuam.




