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Meio Ambiente

Seja para aumentar a proteção às florestas, seja para diminuí-la, nenhum outro projeto apresentado no Congresso Nacional para tentar modificar o Código Florestal brasileiro alcançou um nível tão avançado de tramitação como o PL 6424/05 que prevê a liberação de plantio de espécies exóticas como forma de "flexibilizar" a recomposição de reserva legal, nas áreas devastadas irregularmente na Floresta Amazônica. O avanço dessa peça legislativa tornou-se a principal polêmica do momento entre produtores rurais da região e os ambientalistas.

Pelo regime em vigor, as propriedades rurais instaladas na Amazônia podem explorar até 20% dos respectivos terrenos. Compete-lhes manter o restante da formação arbustiva (80%) como reserva ambiental. Se aprovada a alteração, os fazendeiros poderão cultivar palmáceas como o dendê, o babaçu e outras oleaginosas imprescindíveis na produção do biodiesel, em até 30% da área de reposição florestal.

A proposição, cujo o autor foi o paraense Flexa Ribeiro (PSDB), foi aprovada no Senado, no final de 2005. Inicialmente previa apenas a redução do tamanho das Reservas Legais de 80% para 50% nas propriedades rurais da Amazônia. No final do ano passado, a matéria foi distribuída à Comissão de Meio Ambiente da Câmara dos Deputados, na época em caráter terminativo, ou seja, após aprovada na Comissão voltaria para uma segunda e definitiva votação no Senado. O texto foi alterado pelo relator Jorge Khoury (DEM-BA), que restabeleceu o tamanho original das reservas na Amazônia, mas acrescentou esse dispositivo que libera a exploração de 30% da reserva florestal para o plantio de exóticas, como forma de estímulo ao produtor de recompor e ter viabilidade econômica.

"É um incentivo ao produtor para fazer a recomposição. Além de reconstituir a reserva florestal, ele terá a oportunidade de fazer a recomposição dos 30% com algo que vai lhe dar retorno. Várias tentativas já foram feitas, mas até hoje nada de significativo se conseguiu. Agora apresentamos este mecanismo como forma de estimular o reflorestamento, onde caberá as secretarias ambientais estaduais coordenar todos os procedimentos", destacou Jorge Khoury, ressaltando que o relatório apresentado na Comissão de Meio Ambiente, há duas semanas foi fruto de reuniões e acertos entre representantes de todos os segmentos envolvidos – da Confederação Nacional da Agricultura e de ONGs ambientalistas.

O presidente da Comissão de Meio Ambiente da Câmara, deputado Nilson Pinto (PSDB-PA), também defendeu o projeto como um recurso viável para a destinação das áreas desmatadas da Amazônia. "O projeto é um a solução para um grande problema da Amazônia. Só no Pará, 15% da área territorial do Estado está devastada. A proposta surge como um estímulo, uma vez que o Governo só trata dessas questões com caráter repressivo", destaca Nilson Pinto.

Ameaça

Para os ambientalistas a proposta é uma ameaça à integridade dos ecossistemas da Amazônia. O Greenpeace soltou um comunicado argumentando que a aprovação do Projeto seria o "começo do fim da Amazônia" e que as alterações propostas vão "arrombar de vez as portas da floresta, transformando em terra arrasada tudo o que já foi conseguido em termos de proteção a esses ecossistemas". De acordo com estudos apresentados pela Conservação Internacional, durante as audiências da Comissão de Meio Ambiente, ao diminuir a Reserva Legal e abrir espaço para a entrada de espécies exóticas na Amazônia não haverá prosperidade de qualquer população que vive lá. O estudo mostra que no leste do Pará, onde se deixou destruir recursos naturais, a pobreza entre os habitantes aumentou.

"A contribuição ambiental com o plantio de espécies exóticas é quase nula", ressalta Ricardo Machado, da Conservação Internacional. Segundo Ricardo, as mudanças propostas só visam restringir o modelo preservacionista do Código Florestal, que busca respeitar a diversidade e complexidade do ecossistema da Amazônia. Ele acrescenta que a proposição como está visa conduzir à legalização fundiária das propriedades interditadas por violarem os limites das reservas legais. "O projeto, em tais parâmetros, é um prêmio a quem desmatou, a quem afrontou a lei", destaca.

Essa posição foi endossada na última semana por um grupo de ONGs através de uma nota pública. Nela ainda assinaram o Instituto Sócioambiental (ISA), a WWF, e os Amigos da Terra. De acordo com Raul do Vale, coordenador do ISA que participou das reuniões programadas pelo relator entre parlamentares e representantes da Confederação Nacional da Agricultura (CNA) e do Ministério do Meio Ambiente, poucos foram os pontos de consenso entre as partes. "É importante deixar claro que participar das reuniões não quer dizer participar das negociações. Nunca ouvimos uma proposta da CNA. Muitas Ongs desistiram de do diálogo logo no primeiro encontro. Os pontos discordantes são extremamente nocivos ao Meio Ambiente. É melhor deixar como está", justificou.

Governo

No meio desse embate de preservação da floresta e incentivo a produção do biodiesel, o governo pouco se manifestou. Parece está aguardando o resultado. Em um primeiro momento apresentou uma proposta de alteração de itens do Código Florestal, que foi discutida pelas próprias ONGs ambientalistas e por representantes do setor de agronegócios. Após a conclusão do relatório, não se posicionou, nem pela aprovação, nem pela rejeição.

Coube ao secretário-executivo do ministério do Meio Ambiente, João Paulo Capobianco, ponderar de forma simpática pela aprovação do PL, através de declarações receosas. "A proposta é fraca, mas não é nenhuma aberração. Ela vai de encontro com outros dispositivos que ainda estamos discutindo, para intensificar o uso de áreas já degradadas e impedir o avanço do desmatamento", ressaltou.

Fonte: O Liberal