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Opinião

O Carnaval ainda não começou, mas os tambores já estão rufando em Brasília. A capital federal foi sacudida com a ribombante entrevista do senador pernambucano Jarbas Vasconcelos à uma revista de circulação nacional. Jarbas sacou sua garrucha do embornal e deu um tirambaço no coração de seu partido político, o PMDB. As declarações do senador são tão pesadas quanto as famosas denúncias do então deputado federal Roberto Jefferson, em 2005, e que desencadearam os escândalos do mensalão, corrupção no universo petista, dólares na cueca e tudo aquilo que já sabemos. Alguns analistas já disseram que trata-se da mais devastadora entrevista de um político nas últimas décadas.

O mínimo que o senador Jarbas Vasconcelos disse do PMDB é que seu partido é corrupto. O mínimo. Em suas palavras: “Hoje, o PMDB é um partido sem bandeiras, sem propostas, sem um norte. É uma confederação de líderes regionais, sendo que 90% deles praticam o clientelismo, de olho principalmente nos cargos”. Quando o repórter Otávio Cabral lhe perguntou por que a legenda quer cargos, Jarbas não pestanejou: “Para fazer negócios, ganhar comissões. Boa parte do PMDB quer mesmo é corrupção”.

No bojo desse tiro, o senador afirmou que o partido do qual ele é um dos fundadores se especializou em manipulação de licitações, contratações dirigidas e ainda acusou a cúpula peemedebista de adotar uma prática pragmática desde 1994 para “usufruir dos governos sem vencer eleição”. Abriu fogo contra a recente eleição de José Sarney à presidência do Senado Federal, classificando-a como “um completo retrocesso”. Segundo Jarbas Vasconcelos, “a moralização e a renovação são incompatíveis com a figura do senador Sarney” e que “ele vai transformar o Senado em um grande Maranhão”.

Voou pólvora também no senador alagoano Renan Calheiros e no presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Para Jarbas, Renan “não tem nenhuma condição moral ou política para ser senador” e que “ele é o maior beneficiário desse quadro político de mediocridade em que os escândalos não incomodam mais e acabam se incorporando à paisagem”. Sobre Lula, Jarbas Vasconcelos foi enfático: “ele não tem nenhum compromisso com reformas ou com ética (...) é um governo medíocre (...) o PAC é um amontoado de projetos reunidos em um pacote eleitoreiro (...) e o Bolsa Família é o maior programa oficial de compra de votos do mundo”. E tudo isso são apenas frações da entrevista do senador Jarbas Vasconcelos, que vale e merece ser lida em sua íntegra.

No entanto, devemos ter cuidado com esse tipo de declaração bombástica. Não podemos nos enganar com esses gatos que aparecem na panela política nacional. São gatos, não são lebres. O senador Jarbas Vasconcelos foi um verdadeiro auto-falante da sociedade, reverberando a voz das ruas amordaçada por suspeitas pesquisas de aprovação do presidente Lula e por alguns tostões aos milhões de pobres e miseráveis brasileiros. Mas Jarbas está isolado em seu partido e sua experiência e seu verbo ecoam muito mais entre partidos de oposição como o PSDB e o DEM do que em sua própria legenda, o sempre em cima do muro PMDB.

O que, de fato, interessa saber é que o tiro de garrucha do senador Jarbas Vasconcelos tinha um cano mirado no coração do PMDB e outro com alvo certo em suas pretensões de compor uma chapa em 2010 e ser candidato a vice-presidente da República na possível campanha do governador tucano José Serra. Jarbas, experiente que é, não colocaria em xeque seu quase meio século de admirável vida pública em uma entrevista que pode acabar como uma manifestação de fingidas virtudes ou até mesmo senilidade. Vislumbrar suas declarações em meio às aspirações de sucessão do presidente Lula torna-as bem menos nobres e só saberemos suas reais potencialidades dependendo do tamanho da crise institucional que elas possam gerar. O PMDB já minimizou e disse que foi apenas um desabafo, seus correligionários calaram e agora só querem provas de tudo que o senador disse. Como nesses casos as provas nunca aparecem, provavelmente seguiremos todos tranquilos, ao som dos tambores, para o Carnaval.

À luz da realidade política brasileira atual, o que mais surpreende é justamente a nossa hipócrita cara de surpresa, por mais redundante que possa parecer, com a entrevista do senador pernambucano. Tudo o que ele disse, nós estamos cansados de saber. Considera-se o fato de ele ser um dos políticos de trajetória mais respeitável de nossa história, mas não podemos dizer que ele descobriu a pólvora. Apenas usou-a para dar um tirambaço devastador no PMDB. Mas como no Brasil a impunidade é palavra de ordem, vamos cozinhar o gato morto e fingir estar saboreando um delicioso ensopado de lebre a la Idade Média.

 

Helder Caldeira

Articulista Político

 

 

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