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Opinião

Quem tem pressão alta? Há algum tempo, quando essa pergunta era feita, logo se pensava em uma avó ou uma tia idosa. Hoje, essa realidade mudou. Quase todas as pessoas conhecem algum jovem hipertenso e isso deve-se às mudanças na saúde cardiovascular dos brasileiros e de outras populações. O aumento da expectativa de vida da população e a crescente incidência da hipertensão em faixas etárias cada vez mais jovens apontam o aumento do continuum cardiovascular e o surgimento da chamada “vida hipertensa”. Isso significa que vive-se mais, porém, convive-se por um tempo mais longo com a pressão alta, que causa prejuízos fatais a órgãos vitais, como coração, olhos, cérebro e rins.

Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) comprovam: a expectativa de vida dos brasileiros aumentou 5,57 anos entre 1991 e 2007. Informações sobre a evolução da “vida hipertensa”, publicadas em 2009 na Revista Brasileira de Clínica Médica (artigo Vida hipertensa), revelam que, na década de 1970, os brasileiros viviam cerca de cinco anos com hipertensão, já em 2009 vivem cerca de 24 anos. Em 2030, conviverão aproximadamente 35 anos com esse fator de risco. Os dados comparam a expectativa de vida da população e idade na qual a pressão alta é diagnosticada.

Existem, pelo menos, 970 milhões de pessoas com pressão alta e a Organização Mundial da Saúde (OMS) avalia a mesma como uma das mais importantes causas de mortes prematuras no mundo, um quadro que está piorando. Por volta de 2015, quase 20 milhões de pessoas irão morrer devido a doenças cardiovasculares e, em 2025, estima-se que 1.56 bilhões de adultos tenham pressão alta.

Por ser assintomática é comum que a hipertensão seja diagnosticada apenas quando já está em um estágio avançado. No entanto, se não controlada, torna-se um importante fator de risco para as doenças cardiovasculares, como enfarto e acidente vascular cerebral (derrame), além de perda de visão e paralisia dos rins.

Sua prevenção e tratamento contemplam hábitos saudáveis, como deixar de fumar e beber álcool em excesso, praticar atividades físicas e alimentar-se de forma saudável, evitando gorduras e frituras e ingerindo mais frutas, verduras e legumes. Esses cuidados demandam uma mudança no estilo de vida de muitas pessoas e por essa razão são difíceis de serem adotados. Um exemplo, é a incidência atual de brasileiros acima do peso, que já ultrapassa 43% da população, número sem previsão de queda para os próximos 10 anos.

Frente a essa nova realidade representada pela “vida hipertensa”, uma nova dinâmica de cuidados com a saúde cardiovascular deverá ser estabelecida. Uma ação importante será a consulta mais frequente e precoce ao médico especialista para a realização da mensuração da pressão arterial, entre outros fatores de risco cardiovasculares. Além disso, os hábitos de vida saudáveis deverão ser vistos como uma prioridade.

No que diz respeito aos profissionais e sistemas de saúde, é importante destacar que a hipertensão, associada a fatores de risco, como o diabetes, deverá aumentar o número de pacientes das doenças cardiovasculares. Com isso, crescerá também o número procuras por prontos-socorros e postos de saúde pública. Esse quadro é preocupante para as autoridades, por demandar uma necessidade crescente de investimentos na saúde. Atualmente, esse valor é de 8% do PIB no Brasil (somados os gastos públicos e privados).

Nas próximas décadas, as pessoas precisarão de medicamentos mais efetivos, que ofereçam maior controle da pressão e proteção aos órgãos atingidos por ela. Além disso, novas formas de identificar eventos cardiovasculares serão cada vez mais necessárias. Antes, a pressão arterial era um dos únicos indicadores de eventos cardiovasculares. Entretanto, novas formas de identificá-los precocemente estão sendo estudadas e, entre elas, está o acompanhamento de biomarcadores, que serão, cada vez mais, importantes indicadores de riscos cardíacos. E conhecer melhor esses riscos não é necessariamente algo com alto custo e de difícil acesso. A excreção de albumina (proteína presente no plasma do sangue) por meio da urina, por exemplo, já é apontada por alguns estudos como um fator de risco mais significativo do que o tabagismo. Avaliá-la por meio de um exame simples é mais uma forma de manter o paciente protegido.

Vale ressaltar que todo esse cenário pode ser modificado por meio da educação e conscientização da população sobre a “vida hipertensa”, importante para prevenir e controlar os anos hipertensos e protegê-los da ocorrência de eventos cardiovasculares. É preciso uma preparação da população para que todos possam viver cada ano de suas vidas com qualidade.

(Dra. Érica de Souza Teixeira é presidente da Sociedade Brasileira de Cardiologia-Regional Tocantins e chefe de serviço de cardiologia do Hospital Geral de Palmas.)