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Estado

Foto: Divulgação

A região de Mateiros vem sendo conhecida nos últimos anos como ponto principal de atrativos turísticos. São cachoeiras e fervedouros de águas límpidas e de tons azulados, sem falar nas dunas do Jalapão e do capim dourado que atraem visitantes brasileiros e até mesmo de outros países. Por trás dessas belezas naturais se esconde uma triste realidade, a situação de isolamento e falta de atendimentos as comunidades que vivem na região. Uma parte delas é de remanescentes de Quilombolas, muitas delas vivendo em situação precária, parecida com as dos primeiros moradores que chegaram há mais de 200 anos.

Estradas de difícil acesso que isolam as pessoas de vários de seus direitos; falta de atendimento de saúde, informação e tratamento para portadores de hanseníase e anemia falciformefalta; falta de transporte regular para as comunidades tradicionais; regularização das terras; escolas para atender as crianças. Estas foram algumas das situações e reclamações dos moradores das comunidades Fazenda Nova e Carrapato, localizadas no município de Mateiros. Os relatos foram feitos durante atendimentos do Projeto Defensoria Quilombola que estão sendo realizados até esta sexta-feira, 13, na região do Jalapão, onde vivem hoje cerca de 2.232 pessoas, segundo o último censo do IBGE. Os moradores reclamam que faltam políticas públicas, e que estão esquecidos pelo poder público.

Na Fazenda Galheiros mora Edilene Carlos Ribeiro, 34 anos e cinco filhos. Lá a defensora pública Franciana Di Fátima Cardoso encontrou uma família desolada. Duas crianças, uma de 11 e outra de 12 anos, apresentam sinais de doenças degenerativas. O diagnóstico de 2008 orientava aos pais a indicação de tratamento fora do Tocantins, mas sem recursos e informações a família não tomou providência alguma. Com com o passar dos anos o quadro só piorou, e há suspeita que uma terceira criança esteja com o mesmo problema, que também aflige a irmã de Edilene; o sobrinho de 10 anos apresenta quadro parecido da doença. Nesse caso, será feita a recomendação ao Estado para que as crianças sejam encaminhadas a um médico especialista e ao tratamento.

O lavrador Anísio Ribeiro da Silva, 65 anos, mora sozinho na localidade Formiga. A primeira perda foi a da mulher, ela teve complicações no parto, como o local onde mora é de difícil acesso, sem condições de levá-la a cidade mais próxima, ela acabou morrendo. Mesmo com tantas dificuldades ele não abandonou o local, bem diferente do filho que hoje está morando em Mateiros. Silva reclama da falta de assistência e morando há tanto tempo no mesmo lugar conta que nem viu o progresso chegar. As dificuldades são as mesmas da época da infância. Falta praticamente tudo.

O casal Agemiro, 60 anos, e Elizabeth, 56 anos, tem oito filhos e a preocupação é com a educação das crianças. Para ir à escola a caminhada é de pelos menos 30 minutos até a estrada principal onde pegam o ônibus. Além dessa dificuldade, para dar continuidade aos estudos a família tem que se mudar para a zona urbana, e isso seria um transtorno, pois não teria como se sustentar, e por enquanto não há previsão de mudanças. De acordo com os moradores, hoje cerca de 89 crianças teriam que se mudar para Mateiros se desejarem continuar os estudos, e os pais não tem como sustentar duas casas. Domingos Silva, 41 anos, enfrenta essa situação. Os filhos estão morando em Mateiros, e ele na comunidade Mata. Até a casa dele, onde vive com o pai Otaviano Silva, de 86 anos, tem um trecho de difícil acesso onde carro não passa, da TO até lá é uma caminhada de uma hora. Ele conta que preferiu deixar os filhos na cidade. O pai de Domingos conta que nasceu na comunidade, assim como os seus pais. Os avós vieram da Bahia fugindo da seca e das dificuldades. Conta que prefere a terra que possui, mesmo com todas as dificuldades. Até chegar à TO são três quilômetros de caminhada, caminhada essa que as pernas já não aguentam e que ele prefere ficar em casa.

Estas são algumas das histórias encontradas pela equipe da Defensoria Pública que além de percorrer as comunidades Carrapato, Mata, Fazenda Nova, de casa em casa, ainda fez atendimento coletivo na Escola Municipal Dona Isabel Barreira de Oliveira. No local, a equipe multidisciplinar coletou informações, ouviu relatos dos moradores e vão produzir relatórios que vão subsidiar as ações e providências dos defensores públicos Arthur Luiz Pádua Marques, Hud Ribeiro e Franciana Di Fátima que estão coordenando os trabalhos desta edição do Projeto Defensoria Quilombola, que só na região de Mateiros atenderão 11 comunidades.

"Um isolamento vergonhoso que acaba com a dignidade das pessoas que vivem nessa região. Relatos e comprovações como os que assistimos aqui demonstram violações diretas à dignidade humana e comprovam o contraste entre o também importante interesse político/econômico de exploração das riquezas regionais e o indissociável e intangível direito humano das pessoas da região que vivem esquecidas e violentadas pela ausência de politicas públicas que lhes garantam o mínimo existencial do ser humano", relata o defensor público Arthur  Marques.

"A situação vivenciada pelas comunidades quilombolas de Mateiros retrata a trágica realidade das populações rurais do Tocantins que se encontram massacradas pela ausência de politicas públicas e pelo poderio econômico dos grandes fazendeiros”, avalia o defensor público Hud Ribeiro  

Nesta quinta-feira, 12, as atividades acontecerão nas comunidades Mumbuca e Boa Esperança. (Ascom Defensoria)