Entender como a crescente ocupação da floresta tropical pelo homem poderá impactar a biodiversidade, os serviços ecossistêmicos e o clima local e global é o principal objetivo do Projeto Temático “ECOFOR: Biodiversidade e funcionamento de ecossistemas em áreas alteradas pelo homem nas Florestas Amazônica e Atlântica”, que reúne mais de 40 pesquisadores brasileiros e britânicos.
A pesquisa é realizada no âmbito do programa de pesquisa colaborativa “Human Modified Tropical Forests (Florestas Tropicais Modificadas pelo Homem)”, lançado em 2012 pela FAPESP e pelo Natural Environment Research Council (NERC), um dos Conselhos de Pesquisa do Reino Unido (RCUK, na sigla em inglês).
A equipe, formada por 16 pesquisadores sêniores, seis pós-doutorandos, 12 colaboradores e nove estudantes, esteve reunida pela primeira vez entre os dias 26 e 29 de março na cidade de São Luiz do Paraitinga, no Vale do Paraíba (SP).
“Nessa primeira reunião, definimos detalhadamente os protocolos de trabalho. A ideia é que todos os dados sejam gerados com a mesma metodologia, de forma que seja possível integrá-los em um modelo do impacto da fragmentação sobre a biodiversidade e os serviços ecossistêmicos. Foi o grande pontapé inicial do projeto”, contou Carlos Alfredo Joly, professor da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e coordenador do Programa de Pesquisas em Caracterização, Conservação, Restauração e Uso Sustentável da Biodiversidade (BIOTA-FAPESP).
De acordo com Joly, toda a coleta de dados será realizada no Brasil. A equipe brasileira estará concentrada principalmente em regiões de Mata Atlântica situadas na Serra do Mar e na Serra da Mantiqueira, enquanto a equipe britânica centrará seu foco na Floresta Amazônica. Já a análise e a interpretação dos dados serão feitas de forma compartilhada tanto no Brasil como no Reino Unido.
“A ideia é ampliar significativamente a participação de estudantes brasileiros na pesquisa, que abre um leque de opções para trabalhos de mestrado e doutorado com alta possibilidade de realização de estágios no Reino Unido”, avaliou.
Segundo Jos Barlow, pesquisador da Lancaster University (Reino Unido) e coordenador do projeto ao lado de Joly, alguns estudantes britânicos também planejam fazer pós-doutorado em instituições paulistas.
“Os alunos e pós-doutorandos do Reino Unido vão precisar passar bastante tempo no Brasil, onde será feita toda a coleta de dados. Ou então focar seu trabalho na análise de dados de sensoriamento remoto e sistemas de informações geográficas (SIG). E, claro, os resultados serão publicados em conjunto, com a liderança vinda de ambos os países”, disse.
Malásia
O trabalho de investigação na Floresta Amazônica e na Mata Atlântica correrá em paralelo a outro projeto financiado pelo NERC desde 2009 em Bornéu, na Malásia. Nesse caso, o objetivo é estudar e comparar áreas de floresta primária (bem conservadas), áreas com exploração seletiva de madeira e regiões que sofreram profunda fragmentação.
“Dentro do possível, os dados gerados aqui no Brasil deverão ser comparáveis aos dados gerados na Malásia. Para assegurar essa integração foi estabelecido um comitê que reúne pesquisadores dos dois projetos”, contou Joly.
“Não seguiremos exatamente o mesmo desenho da pesquisa desenvolvida na Malásia, pois aqui temos situações diferentes. Mas os dois projetos visam estudar como as mudanças no uso da terra, que inclui extração de madeira, queimadas e fragmentação do habitat, alteram o funcionamento da floresta tropical, principalmente no que se refere à ciclagem de matéria orgânica e de nutrientes. Também queremos avaliar como essas alterações estão relacionadas com os processos biofísicos, a biodiversidade e o clima”, explicou Simone Aparecida Vieira, pesquisadora do Núcleo de Estudos e Pesquisas Ambientais (Nepam) da Unicamp.
De acordo com Vieira, a equipe brasileira adotou o Parque Estadual da Serra do Mar como uma espécie de “área controle” da pesquisa e os dados lá coletados pelo Projeto Temático Biota Gradiente Funcional serão comparados com as informações oriundas dos fragmentos e das florestas secundárias existentes na região que vai de São Luiz do Paraitinga até a cidade de Extrema, em Minas Gerais.
“Na Amazônia, temos um grande conjunto de áreas em estudo. Um dos focos é a região de Paragominas, que tem um histórico de extração madeireira. E inclui também Santarém, onde vem avançando a agricultura, principalmente a soja”, contou Vieira.
Os pesquisadores farão inventários florestais, coletando dados como quantidade de biomassa viva acima do solo, densidade da madeira, diâmetro e altura das árvores, quantidade de serapilheira (camada formada por matéria orgânica morta em diferentes estágios de decomposição) e diversidade de espécies vegetais e animais.
“Um dos objetivos é investigar o estoque de carbono nessas áreas e de que forma ele é alterado com os diferentes usos. Depois vamos relacionar esse dado com a mudança em relação à diversidade de espécies que ocorrem nessas áreas, trabalhando principalmente com um levantamento de espécies de árvores e de aves”, explicou Vieira.
A coleta de dados deve seguir pelos próximos quatro anos. Na avaliação de Vieira, está sendo criada uma estrutura que poderá ser mantida após o término do projeto, se houver novo financiamento. “O ideal é acompanhar os processos de mudança no longo prazo para entender de fato como essas áreas estão se comportando diante das pressões humanas e das mudanças climáticas”, disse.
Joly concorda. “O projeto vai estabelecer uma rede intensiva de monitoramento de áreas que vão desde florestas intactas até florestas altamente fragmentadas e alteradas pelo homem. Isso permitirá avaliar as correlações entre biodiversidade e funcionamento de ecossistemas, tanto na escala local como regional e global – quando estiverem integrados os dados da Mata Atlântica, da Floresta Amazônica e da Malásia”, disse.
Os resultados obtidos, acrescentou Joly, permitirão também o aperfeiçoamento de políticas públicas para promover o pagamento de serviços ambientais, como os de proteção a recursos hídricos e de estoques de carbono.
Entre as instituições envolvidas na pesquisa estão Lancaster University, University of Oxford, University of Leeds, Imperial College London, University of Edinburgh, Unicamp, Universidade de São Paulo (USP), Instituto Agronômico de Campinas (IAC), Museu Paraense Emílio Goeldi, Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), Universidade de Taubaté e a Fundação Florestal da Secretaria do Meio Ambiente do Estado de São Paulo. (Agência Fapesp)