Desde que a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) se posicionou, há um mês, contra a reforma da Previdência proposta pelo Governo Federal e a favor da redução do número de autoridades com direito a foro privilegiado, dioceses de diversas regiões brasileiras têm tratado do tema, em muitos casos, de forma direta junto aos fieis durante celebrações. No Tocantins, de acordo com o arcebispo Dom Pedro Brito Guimarães, os bispos estão buscando sensibilizar os deputados federais e senadores do Estado para que votem contra a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) nº 287, por entenderem que representa prejuízos aos trabalhadores do país, especialmente aos mais vulneráveis. “Pedimos que votem em nome do povo e não da conveniência”, apontou Dom Pedro Brito Guimarães.
Segundo ele, há cerca de 20 dias foi enviado a cada um dos três senadores e oito deputados federais tocantinenses, via e-mail, o posicionamento dos bispos, emitido em nota assinada pelo Cardeal Sergio da Rocha, presidente da CNBB; pelo Arcebispo Dom Murilo S. R. Krieger, vice-presidente, e pelo Bispo Dom Leonardo Ulrich Steiner, secretário-geral, na qual manifestam apreensão em relação à PEC em tramitação no Congresso Nacional. De acordo com Dom Pedro Brito Guimarães, além de fazer conhecer a posição dos bispos do Brasil, a correspondência buscava um encontro com os parlamentares do Estado a fim de discutir, pessoalmente, não só a questão da reforma, mas outros assuntos de interesse da sociedade tocantinense que demandam uma forte atuação daqueles que representam o Estado na esfera legislativa.
Até o momento, porém, conforme o arcebispo, nenhum deputado federal ou senador deu qualquer retorno sobre a solicitação dos bispos.
Na nota emitida pela CNBB, a entidade convoca os católicos a se mobilizarem em torno da Reforma da Previdência, mas não indica ações a serem adotadas diretamente nas comunidades. Alguns bispos e arcebispos estão utilizando o espaço em missas para se posicionar contra a reforma pelo Brasil. No Tocantins, o Arcebispo informou que a opção foi iniciar a ação por mobilizar os parlamentares do Estado em Brasília/DF e que outras medidas poderão vir a ser implementadas após discutidas em Assembleia Nacional. Segundo ele, entre os dias 26 de abril e 5 de maio será realizada a 55ª Assembleia Nacional da CNBB, em Aparecida (SP), e lá o assunto deverá voltar a ser discutido.
Centrais Sindicais
A tentativa de mobilizar os deputados federais e senadores contra a reforma também foi a estratégia adotada pelas Centrais Sindicais e entidades classistas do Estado, que formalizaram seus posicionamentos contrários ao projeto e chegaram, inclusive, a ameaçar fazer campanha contra aqueles que votarem a favor da Reforma da Previdência.
Posicionamento dos parlamentares
O site Conexão Tocantins solicitou posicionamento dos parlamentares (via e-mail e/ou Whatsapp) acerca deste assunto. A deputada Josi Nunes (PMDB), por meio de sua assessoria de imprensa, informou que não recebeu o e-mail do arcebispo mas, em nota, disse que está analisando o projeto para que possa se posicionar. “A proposta teve várias mudanças e nós estamos analisando e estudando minunciosamente cada uma delas antes de posicionarmos com relação a Reforma Previdenciária. Temos plena consciência de que o país necessita de reforma, mas entendemos que esta reforma deve ser progressista e que de forma alguma, prejudique os direitos adquiridos pelo trabalhador”, disse.
A assessoria da deputada Dorinha Seabra Rezende (DEM) destacou que a parlamentar já declarou ser contra o texto da Reforma da Previdência enviada pelo Executivo, de que trata o conteúdo da carta enviada pelo arcebispo. “O novo texto apresentado pelo relator, deputado Arthur Maia, está sendo estudado pela parlamentar e ela está disponível para se reunir com o arcebispo para conversar sobre o assunto”, disse a assessoria.
Por sua vez, a assessoria da deputada Dulce Miranda (PMDB) informou que o gabinete da parlamentar não recebeu o e-mail da Arquidiocese sobre a Reforma da Previdência. "Entretanto, já solicitamos à Arquidiocese que o mesmo seja reencaminhado para a parlamentar analisar", disse.
Os demais deputados e senadores não se manifestaram até o momento. O espaço permanece aberto para aqueles que desejarem se posicionar.
Confira abaixo o posicionamento da CNBB sobre a PEC:
NOTA DA CNBB SOBRE A PEC 287/16 – “REFORMA DA PREVIDÊNCIA”
“Ai dos que fazem do direito uma amargura e a justiça jogam no chão” (Amós 5,7)
O Conselho Permanente da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil-CNBB, reunido em Brasília-DF, dos dias 21 a 23 de março de 2017, em comunhão e solidariedade pastoral com o povo brasileiro, manifesta apreensão com relação à Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 287/2016, de iniciativa do Poder Executivo, que tramita no Congresso Nacional.
O Art. 6º. da Constituição Federal de 1988 estabeleceu que a Previdência seja um Direito Social dos brasileiros e brasileiras. Não é uma concessão governamental ou um privilégio. Os Direitos Sociais no Brasil foram conquistados com intensa participação democrática; qualquer ameaça a eles merece imediato repúdio.
Abrangendo atualmente mais de 2/3 da população economicamente ativa, diante de um aumento da sua faixa etária e da diminuição do ingresso no mercado de trabalho, pode-se dizer que o sistema da Previdência precisa ser avaliado e, se necessário, posteriormente adequado à Seguridade Social.
Os números do Governo Federal que apresentam um déficit previdenciário são diversos dos números apresentados por outras instituições, inclusive ligadas ao próprio governo. Não é possível encaminhar solução de assunto tão complexo com informações inseguras, desencontradas e contraditórias. É preciso conhecer a real situação da Previdência Social no Brasil. Iniciativas que visem ao conhecimento dessa realidade devem ser valorizadas e adotadas, particularmente pelo Congresso Nacional, com o total envolvimento da sociedade.
O sistema da Previdência Social possui uma intrínseca matriz ética. Ele é criado para a proteção social de pessoas que, por vários motivos, ficam expostas à vulnerabilidade social (idade, enfermidades, acidentes, maternidade…), particularmente as mais pobres. Nenhuma solução para equilibrar um possível déficit pode prescindir de valores éticos-sociais e solidários. Na justificativa da PEC 287/2016 não existe nenhuma referência a esses valores, reduzindo a Previdência a uma questão econômica.
Buscando diminuir gastos previdenciários, a PEC 287/2016 “soluciona o problema”, excluindo da proteção social os que têm direito a benefícios. Ao propor uma idade única de 65 anos para homens e mulheres, do campo ou da cidade; ao acabar com a aposentadoria especial para trabalhadores rurais; ao comprometer a assistência aos segurados especiais (indígenas, quilombolas, pescadores…); ao reduzir o valor da pensão para viúvas ou viúvos; ao desvincular o salário mínimo como referência para o pagamento do Benefício de Prestação Continuada (BPC), a PEC 287/2016 escolhe o caminho da exclusão social.
A opção inclusiva que preserva direitos não é considerada na PEC. Faz-se necessário auditar a dívida pública, taxar rendimentos das instituições financeiras, rever a desoneração de exportação de commodities, identificar e cobrar os devedores da Previdência. Essas opções ajudariam a tornar realidade o Fundo de Reserva do Regime da Previdência Social – Emenda Constitucional 20/1998, que poderia provisionar recursos exclusivos para a Previdência.
O debate sobre a Previdência não pode ficar restrito a uma disputa ideológico-partidária, sujeito a influências de grupos dos mais diversos interesses. Quando isso acontece, quem perde sempre é a verdade. O diálogo sincero e fundamentado entre governo e sociedade deve ser buscado até à exaustão.
Às senhoras e aos senhores parlamentares, fazemos nossas as palavras do Papa Francisco: “A vossa difícil tarefa é contribuir a fim de que não faltem as subvenções indispensáveis para a subsistência dos trabalhadores desempregados e das suas famílias. Não falte entre as vossas prioridades uma atenção privilegiada para com o trabalho feminino, assim como a assistência à maternidade que sempre deve tutelar a vida que nasce e quem a serve quotidianamente. Tutelai as mulheres, o trabalho das mulheres! Nunca falte a garantia para a velhice, a enfermidade, os acidentes relacionados com o trabalho. Não falte o direito à aposentadoria, e sublinho: o direito — a aposentadoria é um direito! — porque disto é que se trata.”
Convocamos os cristãos e pessoas de boa vontade, particularmente nossas comunidades, a se mobilizarem ao redor da atual Reforma da Previdência, a fim de buscar o melhor para o nosso povo, principalmente os mais fragilizados.
Na celebração do Ano Mariano Nacional, confiamos o povo brasileiro à intercessão de Nossa Senhora Aparecida. Deus nos abençoe!
Brasília, 23 de março de 2017.
Cardeal Sergio da
Rocha
Arcebispo de Brasília
Presidente da CNBB
Dom Murilo S. R. Krieger, SCJ
Arcebispo de São Salvador da Bahia
Vice-Presidente da CNBB
Dom Leonardo
Ulrich Steiner, OFM
Bispo Auxiliar de Brasília
Secretário-Geral da CNBB