Tema recorrente na atualidade em rodas de conversas, nas redes sociais e nos debates promovidos pelos meios de comunicação, a depressão infantil e os transtornos psíquicos, que muitas vezes podem levar os jovens ao suicídio, ganharam bastante repercussão devido a propagação do jogo Baleia Azul, espécie de desafio mortal que tem como foco os adolescentes abalados emocionalmente, e a série norte-americana da Netflix 13 Reasons Why (Os 13 Porquês), que relata os motivos que levaram uma jovem a cometer suicídio.
As doenças que abalam a saúde mental são graves e precisam de tratamento o quanto antes. De acordo com dados da Organização Mundial da Saúde (OMS) o índice de crianças entre 6 e 12 anos diagnosticadas com depressão saltou de 4,5% para 8% na última década. De acordo com as projeções, nos próximos vinte anos, a depressão será uma das doenças mais recorrentes no mundo. Ela ultrapassará o número de pessoas com câncer ou que sofrem de problemas cardíacos.
Para cuidar dos casos clínicos que envolvem a área da saúde mental infanto-juvenil, o Tocantins possui o único Centro de Atenção Psicossocial para a Infância e Adolescência (Caps Infantil) da região Norte do Brasil, mantido pelo Governo do Tocantins e situado no município de Araguaína, distante a 383 km de Palmas. O local oferece tratamento gratuito para crianças e jovens que apresentam, prioritariamente, intenso sofrimento psíquico decorrente de transtornos mentais graves e persistentes, incluindo aqueles relacionados ao uso de substâncias psicoativas, e outras situações clínicas que impossibilitem estabelecer laços sociais e realizar projetos de vida.
O Caps Infantil realiza uma média de 50 a 60 atendimentos por dia. Apenas no ano passado, esse número resultou num total de 7.896 atendimentos realizados. A faixa etária desse público compreende as idades que vão dos três aos 17 anos e 11 meses. “Recebemos também casos excepcionais de crianças menores de três anos de idade. Para ter acesso aos nossos serviços, não é necessário que o pai ou o responsável legal tenha encaminhamento médico ou psicológico, basta que ele nos procure e apresente a documentação pessoal da criança. Após isso, a criança passará por uma avaliação da nossa equipe multidisciplinar que verificará a forma mais eficaz de tratamento para o caso”, explicou a coordenadora do Centro, Dágmar Luzia Carvalho.
A equipe multidisciplinar do Caps Infantil é composta por dois médicos, sendo um neuropsiquiatra e um neurologista; dois psicólogos; duas pedagogas; duas assistentes sociais; duas enfermeiras; nove técnicos em enfermagem; um educador físico; oito servidores administrativos; e duas artesãs. “Nós oferecemos várias atividades, dentre elas atendimentos individuais, se necessário, com psicólogos, psicopedagogos, educador físico e temos também as oficinas e os grupos terapêuticos. Isso vai de acordo com a necessidade do paciente. O que temos ouvido dos pais e responsáveis é que a criança após três ou quatros meses de tratamento já apresenta grande melhora, principalmente na escola”, destacou Dágmar Luzia Carvalho.
Como identificar o problema?
Os pais e familiares devem ficar atentos as mudanças no estilo de vida e nas atitudes dos seus filhos, conforme explicou a psicóloga do Caps Infantil, Talita Maria Machado de Freitas: "São mudanças às vezes pequenas, mas que não podem passar desapercebidas. Algumas atitudes suspeitas como falar de morte, suicídio, mesmo que indiretamente, se isolar dos familiares e amigos, perder o interesse em atividades que costumava fazer, ter irritabilidade e crises de raiva com frequência, piora no desempenho, comportamentos autodestrutivos, entre eles automutilação, uso de álcool e drogas, exposição a situações de risco, são alguns dos sintomas que eles apresentam. É preciso deixar claro que o correto diagnóstico requer uma avaliação de um profissional”.
Segundo Talita Maria Machado de Freitas, os casos de depressão infantil, déficit de atenção, hiperatividade e autismo são os mais frequentes entre aqueles que buscam atendimento no Caps Infantil. “Aqui, a gente não trabalha apenas a questão psicológica, mas também a questão psicossocial que engloba tanto o lado educacional como os problemas familiares que geram dificuldades de comportamento e de conduta da criança. Então, é um trabalho bem abrangente. Nós trabalhamos todas as características que possam estar levando essa criança a ter dificuldades na forma dela se expressar, agir e pensar como um todo e não apenas em uma situação específica”, contou.
Papel da família no tratamento
A família detém um papel fundamental para evolução do quadro de saúde do paciente. “O primeiro nó dessa questão é a negação dos pais. Geralmente, eles não querem aceitar que o filho possa ter um problema e que precisa ser tratado. Por isso que em alguns casos nós encontramos grandes dificuldades, pois muitos pais só resolvem trazer seu filho para o tratamento quando a doença já está um pouco mais avançada”, assinalou a coordenadora do Caps Infantil, Dágmar Luzia Carvalho.
“Temos duas vertentes nesses casos: ou o pai é permissivo por achar que a criança tem um problema e precisa ser poupada ou ele a exclui, deixando ela de lado. Então, a gente precisa passar para ele que existe um equilíbrio. Para auxiliar nessa questão nós mantemos aqui no Centro um grupo de apoio aos pais e familiares que se reúne quinzenalmente”, complementou Dágmar Carvalho.
A coordenadora destacou também que trabalhou durante 17 anos no Caps Adulto e que a criação do Caps Infantil nasceu da necessidade de conciliar o tratamento de pais e filhos para uma melhora efetiva dos pacientes. “No Caps Adulto a gente percebia que os pais tinham grande queixa de que não melhoravam porque seus filhos também apresentavam dificuldades psíquicas e não recebiam tratamento. Então, ficava difícil para eles se equilibrarem sendo que os filhos não tinham equilíbrio emocional. Com a demanda crescente por esse tipo de serviço especializado, nós começamos a atender os filhos dos nossos pacientes adultos para ajudar no tratamento deles. Daí, com o aumento das buscas o Governo do Estado implantou um centro específico para o atendimento das crianças e dos adolescentes aqui em Araguaína”, relatou.
Mãe de um menino de 11 anos de idade que tem autismo, Solange Araújo Chaves Gouveia, contou que eles moram no município de Riachinho, distante a 116 km de Araguaína, e que, mesmo com a distância, seu filho se sente motivado a continuar o tratamento devido à atenção que ele tem recebido dos profissionais do Caps Infantil. “Eu avalio o atendimento aqui como excelente. Eles tratam a gente muito bem, nos sentimos em casa, é como se fôssemos uma família. Depois que começou o tratamento, meu filho já está interagindo mais com as outras crianças e tendo mais facilidade na escola”, contou.
Ana Francisca dos Santos Moreira, que mora na cidade de Darcinópolis, distante a 83 km de Araguaína, é mãe de uma menina de 12 anos de idade que realiza tratamento há oito meses no Caps Infantil. “Desde os quatro anos de idade minha filha tinha dificuldades com aprendizado na escola e de se relacionar com as outras crianças. Ela não tinha amigos e dizia que ninguém queria brincar com ela, era uma situação muito triste para nós duas. Então, no dia 25 de agosto de 2016, eu fui enviada para o Caps Infantil e desde então minha filha faz o tratamento dela aqui. Esse Centro é um lugar especial, os profissionais são qualificados, educados, compreensivos, generosos e cuidam muito bem das nossas crianças”, relatou.
Durante a produção da reportagem, a filha de Ana Francisca dos Santos estava colorindo alguns desenhos com seus colegas em umas das oficinas terapêuticas desenvolvidas pelo Caps Infantil. A jovem disse que se sentia uma artista e que era muito bom participar das atividades pedagógicas. “Aqui sou bem tratada e tenho aprendido a me relacionar melhor com as outras pessoas”, concluiu.
Endereço
O Caps Infantil de Araguaína fica situado na Rua Deusarina Aires, número 11, Quadra 4, Lote 12, no Jardim Filadélfia. O horário de atendimento é de segunda a sexta-feira das 7 às 18 horas.