A Polícia Federal realizou nesta terça-feira, 6, a Operação Pontes de Papel, destinada a investigar fraudes licitatórias, peculatos, corrupções ativas, passivas, crimes contra o sistema financeiro, fraudes na execução de contratos administrativos e cartel praticados por organização criminosa infiltrada no Governo do Estado com a finalidade de desviar recursos públicos.
Segundo o superintendente da Polícia Federal no Tocantins, Arcelino Vieira Damasceno, a operação apura fraudes na construção de pontes e rodovias em todo o estado do Tocantins entre os anos de 2000 e 2016.
Em entrevista coletiva à imprensa na manhã de hoje a polícia esclareceu que o contrato de licitação das obras investigadas foi assinado há duas décadas, no ano de 1998, mas a execução das obras teve início em julho de 2000. O valor inicial do contrato era de R$ 411 milhões, mas sofreu aditivos ao longo dos anos, durante os governos Siqueira Campos e Marcelo Miranda, que ultrapassaram o limite de aditivos estabelecidos pela lei de licitações que é de 25%, chegando a R$ 1,4 bilhões. Desta quantia estima-se que cerca de 30% teriam sido desviados.
O governador Marcelo Miranda (PMDB,) o ex-governador Siqueira Campos e o ex-secretário de Infraestrutura, José Edmar Brito Miranda - pai do governador - foram à sede da PF em Palmas para prestar esclarecimentos.
Dolarização
As investigações demonstraram que os gastos previstos no contrato foram convertidos para dólar. No ano de 2000 o contrato sofreu um aditivo onde se criou um índice de dolarização de 1,18 que correspondia ao valor da moeda americana à época. Neste primeiro aditivo ficou consignado ainda que o pagamento de cada obra entregue seria corrigido de acordo com o valor do dólar do dia. “Isso fez com que o valor pago pelo estado em dólar tenha sido muito maior que o verdadeiramente executado”, explicou o superintendente.
Os contratos foram firmados pelo Governo do Estado com uma empresa italiana que conseguiria recursos fora do país. Além disso, 80% dos materiais utilizados nas obras seriam importados, razão pela qual teria se optado pelos pagamentos em dólar. A veracidade das informações a respeito do fornecimento de materiais importados e recursos estrangeiros ainda está sendo investigada pela polícia.
A Polícia Federal estima que as obras tenham sofrido um acréscimo de 344% sobre o valor inicial, somando-se os aditivos contratuais aos pagamentos feitos em dólar. Ainda de acordo com a PF, uma auditoria realizada pelo Tribunal de Contas nestes contratos demonstrou um desvio de dinheiro no valor de R$ 458 milhões em pagamentos indevidos.
A polícia acredita que cerca de 176 pontes tenham sido construídas com indícios de superfaturamento de preços, uma delas é a Ponte Fernando Henrique Cardoso que liga Palmas ao distrito de Luzimangues. “Esse número é difícil de precisar porque ao longo da investigação observamos que algumas pontes, em determinado momento, eram consideradas objetos de construção, no momento seguinte essas pontes eram retiradas do rol de pontes a serem executadas e eram incluídas outras”, informou Damasceno.
Ainda de acordo com o superintendente, há indícios de que algumas pontes foram pagas mas não foram construídas.
Cumprimento de mandados
A investigação começou após solicitação do Superior Tribunal de Justiça para que a Polícia Federal promovesse a sistematização de dados relacionados a superfaturamento e ordens de pagamentos emitidas em determinados contratos, bem como identificação dos responsáveis pelos eventuais desvios.
Cerca de 160 policiais federais cumpriram 59 mandados judiciais, sendo 31 mandados de intimação e 28 mandados de busca e apreensão nos Estados de Tocantins, Goiás, Bahia, Mato Grosso e Distrito Federal. De acordo com o Damasceno, os mandados foram cumpridos em outros estados em virtude do fato de que os responsáveis por estas empresas não residirem no Tocantins e terem negócios em outros estados.
Núcleos
Ainda de acordo com a Polícia Federal, o esquema fraudulento era operacionalizado através de três núcleos, um político, um de empresários e um de servidores públicos e funcionários onde se incluía os membros da comissão de licitação, fiscais, diversos comissionados e funcionários de empresa.
De acordo com o superintendente, o núcleo político era responsável pela tomada de decisões. Foram estes gestores públicos que decidiram sobre o contrato de financiamento internacional, aditivos contratuais, além de determinar quais pontes seriam ou não incluídas no rol de construção. Havia neste núcleo uma espécie de sub núcleo técnico que comandava o órgão executor que ao longo dos anos teve mudanças nos nomes (Agetrans, Ageto e Dertins.) O núcleo de servidores negligenciava a fiscalização das obras e o núcleo empresarial se beneficiava do enriquecimento ilícito.
Siqueira
O ex-governador Siqueira Campos divulgou nota à imprensa onde se coloca à disposição da justiça para prestar esclarecimentos. A nota diz ainda que a população tocantinense conhece as pontes construídas pelo ex-governador e que Siqueira sempre cumpriu seu dever de buscar recursos para investimentos, mas que nunca foi ordenador de despesas, gestor de contrato ou responsável por medições técnicas.
Confira abaixo a nota do ex-governador Siqueira Campos na íntegra.
Nota
O ex-governador Siqueira Campos estará sempre à disposição da Justiça para prestar os esclarecimentos que forem necessários. Como homem público ele não se esquiva de responder qualquer questionamento. Palmas e o Tocantins conhecem as pontes construídas por Siqueira Campos, como as da cidade de Paranã, Lajeado, Barra do Ouro e a ponte da Integração Nacional, ligando Palmas à BR-153 e ao Brasil. José Wilson Siqueira Campos sempre cumpriu seu dever de Governador ao buscar recursos para investimentos no Estado, mas jamais foi ordenador de despesas, gestor de contrato ou responsável por medições de responsabilidade técnica. Existe farta jurisprudência sobre esse tema. Ainda assim, ele jamais deixará de contribuir e esclarecer o que lhe for possível.