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Opinião

Brenda Brito é doutora em ciência do direito pela Universidade Stanford

Brenda Brito é doutora em ciência do direito pela Universidade Stanford Foto: Divulgação

Foto: Divulgação Brenda Brito é doutora em ciência do direito pela Universidade Stanford Brenda Brito é doutora em ciência do direito pela Universidade Stanford

O baixo preço cobrado para regularização fundiária de terras públicas na Amazônia representa perdas financeiras para o governo e risco socioambiental para a região. A desvalorização gera lucro com a posterior venda da área, estimulando um ciclo de grilagem, com novas ocupações ilegais e conflitos agrários. A grilagem também está associada ao desmatamento ilegal, pois a retirada de cobertura florestal sinaliza a ocupação e o uso da área nos pedidos de titulação.

Alguns defendem os baixos valores, argumentando que órgãos fundiários não são corretores de imóveis e devem cumprir um direito daqueles que aguardam títulos de terra. Com esse procedimento, porém, esquecem que se trata de um patrimônio público, ilegalmente invadido e desmatado, o qual será incorporado ao patrimônio privado sem processo licitatório. Tais vendas tratam apenas de médios e grandes imóveis, que, se realmente cumprissem o requisito legal de aproveitamento racional da área, teriam plenas condições de gerar renda para pagar seu valor real. Pequenos imóveis, de agricultores familiares, são beneficiados por doação. Portanto, cobrar barato pela terra pública não faz justiça social; ao contrário, alimenta o ciclo de invasões e conflitos no campo.

Um agravante foi o Governo Federal ter alterado as regras de regularização na Amazônia Legal em 2017. Ficou estabelecido, então, que o valor a ser pago na titulação de médios e grandes imóveis seriam irrisórios: 10% a 50% do mínimo definido pelo Incra. Considerando imóveis em regularização até 2016, isso representa uma perda de até R$ 21 bilhões para os cofres públicos. Tal lei está em questionamento por três ações de inconstitucionalidade no Supremo Tribunal Federal. Um dos pontos levantados é o baixo preço da terra.

Mas a desvalorização não é exclusiva do Governo Federal. As esferas estaduais possuem competência sobre áreas de sua jurisdição. O estudo Potencial de Arrecadação Financeira com a Regularização Fundiária no Pará, publicado em junho pelo Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon), mostra que o governo estadual paraense deixará de arrecadar até R$ 9 bilhões com a titulação de 8.053 médios e grandes imóveis.

O potencial de arrecadação chega a ser nove vezes menor. Em algumas regiões – em especial nas que possuem aptidão para agropecuária –, o valor cobrado representa apenas 7% do preço do hectare. Isso ocorre no estado que é um dos campeões em conflitos agrários. Em 2017, houve aumento de 15% de mortes no campo em relação a 2016 no País. O Pará liderou essa triste estatística com 21 das 70 mortes registradas pela Comissão Pastoral da Terra.

Para dar um basta a esse grave problema, é fundamental rever os valores de terra praticados na regularização fundiária para médios e grandes imóveis. Cobrar o preço de mercado desestimulará novas invasões e ainda permitirá arrecadar recursos para investimentos em ordenamento territorial. 

*Brenda Brito é doutora em ciência do direito pela Universidade Stanford e pesquisadora associada ao Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon)