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Opinião

Foto: Divulgação

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Dentre as mais auspiciosas notícias que advêm nestes tempos tão turbulentos é a da aprovação, depois de alongado processo legislativo, da Lei nº 14.181, de 1º de julho de 2021, que cria mecanismos para promover a reinclusão social de milhões de pessoas deixadas à margem da sociedade de consumo por força do contingente expressivo de dívidas que contraíram ao longo do tempo.

A feliz fórmula estatuída na lei nada mais faz do que estipular a repactuação de dívidas e a concessão de novos créditos com estrito respeito ao mínimo existencial.

E, em homenagem a uma das cláusulas gerais mais relevantes do novo direito civil, é de se acolher com boa-fé o consumidor e, por conseguinte, tratar da respectiva dívida como uma unidade, de modo que o respectivo valor seja revisto e repactuado com vistas ao efetivo pagamento, cujas parcelas não impeçam a digna sobrevivência do devedor.

Trata-se, destarte, como que de um refis sem perdão. Só que, desta feita, aplicável a enorme contingente de consumidores postos à margem do mercado e que passaram a integrar sinistros cadastros desabonadores de tudo e para tudo.

Em chamado leal ao reingresso dos que estejam fora da comunidade de consumidores e, portanto, à paz social, é proposto na lei, ao estatuir mecanismos judiciais de conciliação e de mediação para o deslinde de conflitos gerados pelo superendividamento, com vistas a tornar efetivos os planos e modalidades de pagamento.

Eis aí o verdadeiro sinal dos tempos!

Importante lembrar que  a Lei nº 14.181 vem ao encontro das propostas  do capitalismo humanista, que tem por tarefa identificar a dimensão econômica dos direitos humanos para que a mecânica da economia seja instrumento de edificação da sociedade fraterna.

A defesa do consumidor, aliada à redução das desigualdades sociais e regionais, foram adnumerados como vetores da ordem econômica constitucional.

Pois a lei dos superendividados concretiza, a um só tempo, esses dois elementos essenciais, constitutivos de uma economia bem organizada: permite a defesa coerente de um modelo de equação de dívidas que não retire a dignidade do devedor e, ainda, reduz o abismo de desigualdade que é provocado, na sociedade de consumo, pela denegação do crédito e pelos entraves à sadia solução negociada dos efeitos das dívidas.

Vale destacar que essa lei, que bem poderia ser designada Claudia Lima Marques,  em razão do papel de vanguarda que essa ilustre consumerista desempenhou não apenas na elaboração do projeto de lei, mas, sobretudo, na imprescindível dinamização do processo legislativo que afinal foi concluído com êxito, utiliza cinco vezes a expressão “mínimo existencial”.

Em suma, a lei redentora dos superendividados se põe em linha com a noção de desenvolvimento preconizada por São Paulo VI, que é aquele integral, abrangente do homem todo e de todos os homens.

*Wagner Balera é professor Titular de Direito Previdenciário e de Direitos Humanos na Faculdade de Direito da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo — PUC-SP. Livre-Docente em Direitos Humanos, Doutor em Direito das Relações Sociais e autor de mais de 30 livros na área de Direito Previdenciário e de mais de 20 livros da área de Direitos Humanos.