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Educação

Foto: Edinah Mary/Unicef

Foto: Edinah Mary/Unicef

Embora a pré-escola seja obrigatória no País a partir dos 4 anos, há mais de 330 mil meninas e meninos de 4 a 6 anos longe da pré-escola – a maioria, crianças pretas, pobres e filhas de mães jovens e de baixa escolaridade. No Norte, 88,5% das crianças dessa faixa etária frequentam a pré-escola, índice bem abaixo da média nacional, de 94,1%. 

A região apresenta boa parte dos indicadores mais desiguais de frequência escolar. Em relação à raça, por exemplo, 85,4% das crianças pretas, pardas ou indígenas frequentam a pré-escola, contra 89,3% das crianças brancas ou amarelas. As meninas e meninos do Norte também têm o menor índice de frequência escolar nas zonas rurais (79,5%) em relação às demais regiões do País e apresentam a menor frequência escolar para crianças filhas de mães com trabalhos informais, com 89,4%. 

É o que revela a pesquisa “Desigualdades na garantia do direito à pré-escola”, lançada pela Fundação Maria Cecilia Souto Vidigal em parceria com o Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF) e a União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (UNDIME). 

O estudo mostra que o Brasil vinha avançando lentamente no acesso à pré-escola nas últimas décadas. Em 2019, 94,1% das crianças brasileiras frequentavam a pré-escola, deixando 5,9% fora dela – apesar da previsão de universalização desta etapa até 2016 pelo Plano Nacional de Educação (PNE) 2014-2024. 

Com a pandemia da covid-19, o cenário se inverteu. Embora não haja dados consolidados para os últimos anos, uma análise das taxas de matrícula durante a pandemia, revela que ocorreu, apenas em 2021, uma queda de 275 mil matrículas na pré-escola. 

“Infelizmente, nós ainda não tivemos acesso aos dados consolidados de 2019 para cá, mas nós já temos estudos que indicam uma queda dramática das matrículas dessas crianças na pandemia, o que torna o cenário ainda mais preocupante e demanda uma ação coordenada das três esferas de governo com as famílias e as redes de ensino nesta volta às aulas, identificando e localizando essas crianças que não estão tendo seu direito assegurado”, avalia Mariana Luz, CEO da Fundação Maria Cecilia Souto Vidigal. 

Além de mostrar que todas as crianças não estão tendo o seu direito à educação assegurado, a pesquisa traz outro alerta importante: crianças pretas, pobres e filhas de mães jovens e de baixa escolaridade são as que têm maior risco de não frequentar a pré-escola. Há também desigualdades regionais, estaduais e entre crianças do campo e das cidades. 

Mudar esse cenário é urgente e demanda ações concretas, voltadas ao enfrentamento da exclusão escolar. Sabendo que a Educação Infantil é ofertada, prioritariamente, nas redes municipais de ensino, a pesquisa recomenda aos gestores municipais: 

* Planejar a expansão de vagas, com especial atenção aos públicos mais vulneráveis identificados neste estudo; 

* Identificar e localizar as crianças que não estão matriculadas na pré-escola, utilizando estratégias como a Busca Ativa Escolar; 

* Sensibilizar as famílias para a importância da Educação Infantil; 

* Articular ações intersetoriais, integrando saúde, assistência social e educação para a promoção do direito à pré-escola às crianças; 

* Contribuir para a efetivação do regime de colaboração, conhecendo quais programas e políticas federais e do seu estado estão ativos para a Educação Infantil e em quais seu município pode ser participante, além de demandar destes entes uma maior participação no regime. 

"Essas recomendações são importantes e merecem atenção, sobretudo quando falamos de ações conjuntas, em regime de colaboração envolvendo União, estados e municípios. Temos governadores que foram empossados recentemente e é estratégico que essas recomendações cheguem neles, para que estados e municípios trabalhem juntos pela garantia do direito à educação de cada criança", destaca o presidente da Undime, Luiz Miguel Garcia, Dirigente Municipal de Educação de Sud Mennucci/SP. 

Confira, a seguir, mais detalhes sobre os perfis da exclusão na pré-escola, com destaques para a região Norte do País. 

Raça e Renda 

Segundo os dados, no Brasil de 2019, a frequência escolar de crianças pretas, pardas e indígenas era menor (91,9%) que a de crianças brancas ou amarelas (93,5%). O Norte, no entanto, apresenta o menor índice de frequência entre as regiões brasileiras: 85,4% são pretas, pardas ou indígenas e 89,3% crianças brancas ou amarelas. 

Em relação aos estados, o Amapá é o que apresenta índices mais baixos de escolarização entre de crianças brancas e amarelas e pretas, pardas e indígenas (75,4% e 72,0%). Os outros estados registram os seguintes índices para os recortes de raça/cor: RO (87,7% e 85,1%), AM (87,2% e 82,5%), RR (93,3% e 91,1%), AC (82,8% e 78,3%), PA (92,3% e 87,8%) e TO (92,8% e 92,6%). 

O estudo também olhou para a renda das famílias das crianças fora da pré-escola no Brasil. Enquanto a taxa de frequência das crianças em situação de pobreza era de 92% em 2019, a de crianças que não estavam nesta situação era de 94,8%. 

Ao analisar os dados por regiões brasileiras, o Norte se destaca negativamente, registrando as maiores desigualdades na frequência escolar com base na relação de crianças não pobres e pobres, com uma diferença de 8,2% (91,9% não pobre e 83,7% pobre), menor apenas que os 8,8% do Sul do país (94,6% não pobre e 85,8% pobre). 

Em relação aos estados da região Norte, Amapá (84,4% não pobre e 58,7% pobre), Acre (89,7% não pobre e 72,2% pobre) e Roraima (94,9% não pobre e 78,9% pobre) são os que apresentam maior desigualdade na frequência entre pobres e não pobres, sendo 25,7% no Amapá, 17,5% no Acre e 16% em Roraima. 

“Crianças pretas e pobres são, historicamente, mais vulnerabilizadas no Brasil e essa desigualdade no acesso à educação infantil privilegia alguns grupos em detrimento de outros, afinal as crianças pretas e pobres que não frequentam a pré-escola têm menos acesso a estímulos, interações, alimentação e segurança. Isso pode comprometer o desenvolvimento, impactar a progressão e a transição para as etapas de ensino sequentes, além de reproduzir desigualdades que atrasam o nosso país”, explica Maíra Souza, Oficial de Primeira Infância do UNICEF no Brasil. 

Zonas urbana x rural 

No Brasil, a porcentagem de crianças entre quatro e cinco anos de idade que frequentam a escola é menor nas localidades rurais, com uma diferença de 3% em 2019. A região Norte é a que apresenta a maior desigualdade na frequência escolar de crianças que habitam zonas rurais e cidades: 79,5% contra 91,3%. Os estados nortistas com as taxas mais baixas de escolarização em domicílios rurais são Acre (50,2%), Rondônia (62,3%), Tocantins (71,9%) e Amazonas (76,2%). 

Para o presidente da Undime e Dirigente Municipal de Educação de Sud Mennucci/SP, Luiz Miguel Martins Garcia, é fundamental a formulação de estratégias que respondam ao desafio de garantir pré-escola de qualidade para todas as crianças e tragam-nas de volta à escola, com oportunidades de aprendizagem iguais, seja na zona urbana ou rural. “É indispensável que a gente trabalhe para termos ações robustas e coesas de busca ativa dessas crianças, que se amplie o acesso à educação infantil com qualidade e que realizemos o monitoramento dessas iniciativas para que o direito constitucional à Educação seja efetivamente garantido, com equidade, para todos.” 

Idade, escolaridade e ocupação materna 

“Desigualdades na garantia do direito à pré-escola” também analisou as características maternas e como isso interfere na frequência escolar das crianças. Os resultados indicam que as filhas e filhos de mães mais jovens, menos escolarizadas e com trabalhos informais têm menores taxas de frequência escolar. 

As análises da pesquisa revelam que a escolaridade da mãe é o recorte que apresenta a maior desigualdade entre um grupo e outro de crianças entre as regiões e também em termos absolutos. Em 2019, a taxa de frequência de meninas e meninos cujas mães não possuíam ensino fundamental completo era de 91,1% contra 95,3% daquelas que possuíam. A região Norte é uma das que apresentaram as menores taxas de frequência para filhos cujas mães não tinham ensino fundamental completo: 84,8%. 

A região Norte é também a que possui menor frequência escolar para crianças filhas de mães com trabalhos informais, com 89,4%. Este resultado é explicado, especialmente, pelas baixas taxas do Amazonas (81,7%) e do Acre (85,2%). 

“Embora esses dados indiquem que as desigualdades são maiores nos recortes maternos, nós percebemos que esses marcadores, infelizmente, também são característicos de mulheres pretas e pobres no nosso país, como mães jovens, de baixa escolaridade e trabalho informal”, avalia Mariana Luz. “Isso indica que o problema não é exclusivo no acesso à educação, mas é também de emancipação das mulheres e dos negros, além da quebra de ciclos intergeracionais de pobreza”, finaliza a CEO da Fundação. 

Com o apoio técnico da Quantis Consultoria, o estudo avaliou as taxas de frequência de crianças na pré-escola segundo dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNADC) de 2019, da PNAD (2005-2015) e do Censo Demográfico (2010), com análises produzidas em 2019. A ausência de resultados mais recentes se dá pela não publicação de novos dados da Pnad sobre o tema. 

A pesquisa “Desigualdades na garantia do direito à pré-escola” olhou para outros recortes de frequência escolar, como condição de monoparentalidade e situação do domicílio das crianças. Todos os dados podem ser conferidos no arquivo anexado abaixo.  (Trama Comunicação)