Transcorrem em outubro dois marcos que dizem muito sobre quem somos e aonde queremos ir como sociedade: o Dia do Professor (15), em alusão ao decreto de Dom Pedro I, de 1827, que criou o Ensino Elementar no Brasil; e o Dia do Servidor Público (28), instituído há 82 anos pelo Decreto-Lei 5.936/1943. Ambas as datas comemorativas convergem em um ponto essencial, que é a missão de servir à população.
Professores, profissionais da saúde e da educação, policiais, servidores do Judiciário, da Promotoria, da Defensoria Pública e da previdência, agentes sociais, pessoal administrativo, da limpeza urbana, fiscais e tantos outros profissionais que fazem a máquina pública funcionar são a linha de frente no atendimento a demandas que não podem ser terceirizadas. Eles garantem o acesso da população aos direitos constitucionais à educação, saúde, segurança, assistência social, previdência e Justiça. São a presença concreta do Estado e da cidadania na vida cotidiana de milhões de brasileiros. No entanto, se há algo que ainda não aprendemos a oferecer de maneira consistente a esses trabalhadores é justamente o que mais merecem: respeito.
A violência contra professores e alunos tornou-se, tristemente, parte do cotidiano. Em 8 de julho deste ano, um ataque deixou feridos em uma escola municipal de Estação, no Rio Grande do Sul. Pouco mais de dois meses depois, em 25 de setembro, dois adolescentes foram assassinados e outros três estudantes ficaram feridos em Sobral, no Ceará. Esses episódios não são casos isolados, mas sim retratos de um problema que se agrava.
Segundo estudo da ONG Dados para um Debate Democrático na Educação (D³e), entre 2001 e 2024 ocorreram 42 ataques violentos a escolas no Brasil, todos cometidos por estudantes ou ex-estudantes. Os números são alarmantes: 64% desses episódios (27) aconteceram apenas entre março de 2022 e dezembro de 2024. No total, 17 das 27 unidades da Federação já registraram ocorrências,com destaque para São Paulo, com 10 ataques, seguido por Rio de Janeiro e Bahia, com cinco em cada uma.
As consequências são devastadoras: 44 mortos — sendo 32 estudantes, seis profissionais da educação e outros seis autores que se suicidaram — e 113 feridos. Entre 2011 e 2024, 38 ataques foram documentados, 27 deles com evidências de articulação em ambientes virtuais. O perfil dos agressores também revela o drama: dos 42 autores identificados, 77,7% eram menores de 18 anos, três agiram em dupla e apenas uma era mulher.
O descaso e a violência não se restringem às escolas. Na saúde, o quadro é igualmente alarmante. Embora não seja nova, uma pesquisa de 2019, encomendada pelos conselhos regionais das categorias de saúde, apontou que 71,6% dos profissionais já haviam sofrido algum tipo de agressão física ou verbal em seu ambiente de trabalho. Em outras palavras, a mesma mão que recebe atendimento gratuito e essencial muitas vezes é a que desrespeita e agride quem se dedica a cuidar.
É inaceitável esse cenário. Professores e servidores públicos são aqueles que carregam sobre os ombros a responsabilidade de transformar a promessa de direitos em realidade e ação. Sem eles, o Estado não existe.
Por isso, neste outubro, mais do que flores, placas ou discursos protocolares, a maior homenagem que podemos oferecer a esses profissionais é mais respeito ao seu trabalho, mais tolerância pela sociedade e mais valorização por parte dos governantes e autoridades dos Três Poderes. Reconhecer sua relevância é condição para o avanço da democracia e da vida civilizada no Brasil.
Homenagens de calendário são importantes, mas não bastam. Professores e servidores públicos não querem apenas elogios, mas sim condições dignas de trabalho, segurança, investimento e reconhecimento. E merecem essa deferência, pois sem os mestres não há futuro e sem o funcionalismo não existe sequer o presente na dimensão tangível da cidadania.
*Artur Marques é o presidente da Associação dos Funcionários Públicos do Estado de São Paulo (AFPESP).

