É cada vez maior o número de petistas que defendem o terceiro mandato para o presidente Lula. Este final de semana foi publicado na internet uma entrevista com o prefeito de Recife, João Paulo Lima e Silva, membro do diretório nacional e presidente da FNP (Frente Nacional de Prefeitos). Nela João Paulo faz uma defesa cega da tese da PEC que altera o texto constitucional.
Tudo bem que a chegada do presidente Lula ao poder quebrou certos paradigmas estabelecidos por uma elite egoísta e asquerosa, enraizada pelos quatro cantos do país e representada principalmente pelas oligarquias e segmentos conservadores nos estados. Mas, daí partir para jogadas espúrias que mudam a regra do jogo no meio da partida é no mínimo questionável para não dizer despudorado.
Se isto vier a se concretizar, Lula estará dando uma prova irrefutável de que ele realmente não é muito diferente dos outros que passaram pelo poder e apenas enxergaram no povo e nos próprios companheiros e aliados políticos uma massa amorfa pronta a ser manobrada e movida ao sabor das conveniências particulares.
A democracia é exercida através das relações de forças sociais e ideológicas fundadas em regras claras, que por meio de sua estabilidade alimentam a tradição e fortalece as instituições públicas, dando segurança jurídica e fortalecendo a confiança dos cidadãos. Atos que mudam o rumo traçado, abruptamente, provocam instabilidade interna e aumenta a desconfiança externa que nos acompanha há décadas.
O PT conhece muito bem as dificuldades que tal desconfiança pode reacender. Lula foi ator principal e vítima do que discursou ao longo da sua trajetória política ao assumir o poder. Nunca se viu na história deste país, e cremos, também na de outros, um presidente que tenha chorado com tanta freqüência nos dois primeiros anos de governo. Era o efeito desconfiança, que levou empresários a paralisarem seus investimentos e especuladores a retirarem seus dólares que sustentavam nossas tênues reservas internacionais. Lula na pressão e deprimido vertia lágrimas.
O tempo tratou de mostrar aos detentores do poder econômico que Lula tinha amadurecido. Ao assumir a presidência soube manter a linha e conduzir o país com equilíbrio a transformações que, se não são o bastante, pelo menos tiraram o Brasil da rota de algumas tragédias sociais recorrentes, como o caso da fome e da falta de escola das populações excluídas.
Vale lembrar que em 1997, FHC pagou o preço da fuga de capitais do Brasil, com a morte de milhares de crianças no agreste nordestino, que dependiam dos parcos recursos das frentes de trabalho de emergência. Ele teve que escolher entre cortar recursos de vários setores, entre eles o social ou deixar o país ir à bancarrota. Este é um fato que foi nebuloso e assim permanece, talvez pela vergonha da própria mídia e elite de mostrar o quintal de casa, a Etiópia brasileira.
Ainda há muito que melhorar para que as desigualdades sociais do país menorizem, mas estas propostas, sujas, apenas nos trás a decepção de ver que, o que poderia ser diferente e ético, servindo de exemplo para a própria elite, não passa de farinha do mesmo saco. É preciso ter a consciência que o poder é transitório e oxigena a democracia. Maquinações perpetuadoras de poder só trazem desgastes, enferrujam a estrutura e fazem a democracia do país dar um passo atrás. Depois do terceiro mandato virá o quarto? Isto é nojento. Caminharemos para Fujimorização, teremos o Menem brasileiro ou seremos tristes discípulos do Chavismo?
Hámuito se sabe que Lula e o PT passaram pelo processo de lavagem ideológica. Isto é natural e normal. Para se chegar ao poder os partidos vão rasgando fileiras, fazendo concessões, abrindo mão de certos princípios e assimilando outros. Faz parte do jogo democrático e está diretamente ligado às tensões estabelecidas pelas relações de forças sociais e ideológicas citadas acima.
No caso do PT, o partido nasceu baseado em princípios sindicais, não havia uma base político-ideológica consistente nos moldes socialistas e a visão do partido era mais pragmática do que teórica. Em 1979, relata o professor Alberto Aggio, livre-docente da Unesp/Franca, Lula estabeleceu o critério de que poderiam aderir ao PT “todos os que são explorados, todos os que se sentem trabalhadores, os que não exploram os outros” O sentimento formulado de ser trabalhador, de se sentir explorado e não explorador tinha como propósito facultar a adesão massiva ao partido.
O problema que vemos é que Lula e o PT, envolvidos pela teoria da lavagem ideológica, fez concessões por demais pragmáticas. Aliou-se a grupos fisiológicos representados até por políticos latifundiários e escravagistas. Converteu-se ao toma lá dá cá, tão criticado durante a gestão dos tucanos. O PT terminou por perder muitos dos seus militantes históricos desiludidos com os novos rumos do partido.
Na atual conjuntura Lula faz um jogo dúbio. Diz que não quer o terceiro mandado, mas quer a alteração constitucional para mudar de 4 para 5 anos o tempo de mandato presidencial, eliminando-se a reeleição. Isto é desfaçatez, ele sabe muito bem o que quer, esperamos quemantenha a postura democrática forjada no movimento sindical e reconheça que a democracia precisa de estabilidade, e a alternância de poder é salutar.