Após informações coletadas em audiência pública realizada na Câmara Municipal de Ponte Alta em outubro deste ano, o promotor de Justiça Milton Quintana e o procurador da República Fernando Antonio Alves de Oliveira Jr. visitaram três escolas na zona rural do município e comprovaram nos locais a situação de total precariedade em que se encontram os equipamentos para provimento da educação básica às crianças e adolescentes. As ações fazem parte da implementação do projeto Ministério Público Pela Educação (MPEduc) em Ponte Alta, cidade que obteve um dos piores desempenhos no Ideb no Tocantins. O índice avalia o desempenho dos alunos da educação básica em todo o País.
Foram visitadas as escolas dos distritos de Barreiros, Santa Tereza e Extrema. Em comum a todas, as salas multisseriadas, com alunos de séries diferentes tendo aula com apenas um professor, representa uma dificuldade a mais para os profissionais que já trabalham em condições inóspitas. Outro aspecto que abrange todas as escolas refere-se ao transporte escolar. Com relatos frequentes de falhas devido a veículos sem condições de tráfego, foi constatado o avançado processo de sucateamento da frota destinada ao transporte de alunos. Os ônibus, segundo os próprios motoristas, trabalham sem manutenção até quebrar, e chegam a ficar semanas parados enquanto são encontradas formas alternativas para prover o serviço. Enquanto isso, os alunos ficam sem acesso às salas de aula. Foram constatados ônibus trafegando sem amortecedores, com folgas na direção, com para-brisas e janelas quebrados, com pneus carecas e sem estepe e com extintores vencidos ou mesmo inutilizados. Em uma das linhas, o veículo trafegava com excesso de alunos.
Mas as particularidades das escolas também são desanimadoras. Na escola do Barreiro, todos os vidros das janelas e portas das salas de aula estão quebradas,assim como as portas dos dois banheiros e a maior parte das carteiras. Não há ventiladores nas salas e nem bebedouros, apenas filtros de barro com apenas um copo. O alambrado está totalmente destruído, assim como o portão de acesso. Não há local adequado à prática de esportes.
Na escola do distrito Santa Tereza, as salas multisseriadas são separadas por divisões de madeirite, o que permite a interferência sonora entre os dois professores que trabalham na mesma sala. Não há geladeira na cantina e nem bebedouros, assim como ventiladores nas salas. A precariedade dos móveis é total, sendo o estado da mesa do professor apontado até pelos alunos menores. Há diversas carteiras sem encosto. Na cantina, livros e equipamentos como mimeógrafos são estocados junto com alimentos e utensílios para alimentação.
No distrito de Extrema, a escola provisória construída com teto e paredes de telhas de amianto pelos próprios moradores da região provoca grande calor dentro das salas. Os ventiladores instalados há cerca de três meses são resultado da reversão de penas alternativas em benefício da educação, obtida a pedido do Ministério Público. Na captação de água da nascente que abastece a escola, o reservatório está sem tampa e é acessível a animais silvestres, que utilizam o local para beber ou mesmo tomar banho. Amostras da água foram coletas pela Vigilância Sanitária para análise, pois existem suspeitas de que alunos tenham adoecido em função da má qualidade da água servida.
No distrito de Extrema, uma situação ainda mais surreal. Devido à distância entre algumas localidades e a escola, os alunos cumprem a carga horária estudando em dois períodos durante uma semana, e permanecem em casa na outra. Enquanto estão na escola, dormem em alojamentos precários e com janelas quebradas, que permite entrada de água quando chove. Os alunos menores dormem em colchões no chão das salas de aula, acompanhados dos professores. Até a interferência do Ministério Público, há cerca de três meses, os alunos não contavam nem ao menos com bolas para jogar ou qualquer tipo de entretenimento, como DVD para assistir filmes, embora passem boa parte do tempo fora de sala no local. Devido à suspeita de contaminação do poço artesiano que abastecia a escola, a água hoje é retirada de um córrego próximo e servida sem tratamento. Foi graças à provocação do Ministério Público que um filtro foi instalado no bebedouro, há cerca de três meses.
Consequências funestas
A condição encontrada nas escolas da zona rural de Ponte Alta estão diretamente relacionadas ao baixo desempenho dos alunos no Ideb. Milton Quintana, do Ministério Público Estadual, afirma que a educação é tema recorrente nas demandas apresentadas pela população à Promotoria de Justiça no município. “É urgente que os gestores tomem consciência que todos os grandes problemas do Brasil têm origem em um sistema educacional falido. Não se concebe o desenvolvimento do estudo nestas condições”, disse.
Para Fenando Antonio Oliveira, que atualmente responde pela Procuradoria Regional dos Direitos do Cidadão (MPF), é necessário responsabilizar judicialmente os gestores que tratam a educação com desleixo em seus municípios. “Faremos as recomendações para que as falhas sejam sanadas com urgência, e se necessário tomaremos as medidas cabíveis junto ao Judiciário”, finalizou. (Ascom MPF)