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Palmas

Foto: Valério Zelaya Antes de firmar parceria com a Oscip Ises para terceirização precária da mão de obra, prefeito Amastha comia com os servidores da limpeza urbana Antes de firmar parceria com a Oscip Ises para terceirização precária da mão de obra, prefeito Amastha comia com os servidores da limpeza urbana
  • Prefeito Amastha enfrenta fila do marmitex para almoçar com os servidores da limpeza urbana do município

A Prefeitura de Palmas pode ser condenada subsidiariamente como segunda reclamada em 56 processos trabalhistas que correram à revelia do Instituto Sócio Educacional Solidariedade (ISES) na 2ª Vara do Trabalho de Palmas/TO - Tribunal Regional do Trabalho 10ª Região. As causas individuais tem o valor de R$ 33.429,44 podendo chegar a um total de R$ 1.872.048,64 (um milhão oitocentos e setenta e dois mil, quarenta e oito reais e sessenta centavos) e o juiz Francisco Rodrigues de Barros reconheceu a responsabilidade subsidiária da Prefeitura de Palmas. O instituto é uma OSCIP – Organização de Sociedade Civil de Interesse Público.

A Procuradoria Geral da Prefeitura de Palmas chegou a se pronunciar nos autos pedindo a exclusão do município da lide, entretanto, segundo o juiz, a discussão a respeito da responsabilidade subsidiária não encontra mais margem de discussão jurídica, se encontrando consagrada na jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho por meio da Súmula 331. “Na presente hipótese vislumbro, manifestamente demonstrada a culpa do ente estatal, na medida em que, diante de evidente precarização das condições de trabalho, manteve-se inerte. Com efeito, é sabido por nós, a situação ora em discussão envolveu inúmeros trabalhadores contratados pela primeira reclamada e colocados à disposição da segunda, sem observância dos mínimos direitos, nem mesmo registro da CTPS, o que foi objeto de discussão em ação movida pelo Ministério Público do Trabalho.[...] Portanto, dúvida não resta quanto à culpa da municipalidade que foi conivente com a situação. Reconheço a responsabilidade do segundo reclamado, município de Palmas”, informa o juiz Francisco Rodrigues de Barros em sua decisão.

Segundo a Procuradoria Geral do Município, assim que for notificada pela Justiça do Trabalho, será apresentada a defesa da Prefeitura de Palmas.

Entenda

Em 12 de junho de 2014 o prefeito de Palmas, Carlos Amastha (PSB), firmou 5 termos de parcerias com a Oscip Ises: 1) Termo nº 001/2014 – Programa “Saúde, um bem comum” vinculado ao Fundo Municipal de Saúde; 2) Termo nº 002/2014 – Programa “Educando Cidadãos”; 3) Termo nº 003/2014 – Programa “Cuidando de quem Precisa”; 4) Termo nº 004/2014 – Programa “Gerindo por resultados”; 5) Termo nº 005/2014 – Programa “cidade limpa”. Pelas cinco parcerias a Prefeitura de Palmas previu transferir para os cofres da Oscip Ises nada menos que R$ 51.665.738,00 (cinquenta e um milhões, seiscentos e sessenta e cinco mil e trinta e oito reais) de dinheiro público em apenas 12 meses.

O promotor de justiça Edson Azambuja, entretanto, levou o Ministério Público Estadual a intervir no caso por meio de uma Ação Civil Pública (inquérito nº 001/2014) e recomendou ao prefeito Carlos Amastha a anulação das parcerias e suspensão dos pagamentos à Oscip Ises, entretanto, neste momento, já existiam centenas de pessoas contratadas para desempenharem atividades laborais para o instituto no âmbito do município.

Segundo apuração do Ministério Público, os termos de parceria tinham como finalidade “uma verdadeira terceirização ilícita de mão de obra” e servidores municipais foram exonerados para, imediatamente após, serem contratados pela Oscip Ises. Nesta esteira, servidores como o Sr. Bento Lopes da Cruz, que trabalhava na poda de gramas em canteiros e jardins das rotatórias desde a gestão do ex-prefeito Odir Rocha (17 anos) declararam em depoimento ao Ministério Público que foram demitidos pela Prefeitura de Palmas depois de vários anos de atividade e contratados pela Oscip Ises em 2014. Ainda segundo o ex-servidor, diferente de quando era contratado pela Prefeitura, a Oscip Ises não repassava equipamentos de proteção e segurança no trabalho como óculos, luvas e caneleiras, configurando a precarização do trabalho e riscos aos trabalhadores.

Segundo o que ficou constatado pelo Ministério Público, parte dos trabalhadores contratados pela Oscip Ises eram pessoas simples e humildes, trabalhadores braçais que sequer sabiam o nome da empresa que estava contratando-os, “tendo ciência apenas do seu trabalho cotidiano prestado da mesma forma ao município de Palmas ao longo de vários anos”, afirmou o promotor de justiça Edson Azambuja naquela ocasião, em sua representação junto à Vara da Fazenda e Registros Públicos da Comarca da capital.

Laranja?!

Ainda segundo o Ministério Público, chamou atenção da Superintendência Regional do Trabalho e Emprego do Tocantins (SRTE/TO) - órgão do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) -, na ocasião, o fato de o presidente da Oscip Ises, José Wellington de Oliveira, aparentemente não possuir histórico profissional alinhado com as responsabilidades de gestor da Oscip, que, naquela oportunidade, tinha abrangência nacional com cerca de 4 mil trabalhadores a ela vinculados nos últimos cinco anos, com movimentações financeiras na casa de dezenas de milhões de reais. Conforme a fiscalização do MTE, verificou-se nos dados cadastrais do CAGED e na RAIS que, José Wellington de Oliveira, nascido em 1980, se tratava de um homem com pouca escolaridade que trabalhava como lavrador safrista em diversas empresas rurais antes de ser nomeado presidente da Oscip Instituto Sócio Educacional Solidariedade (ISES).

O Ministério Público também apurou que, conforme fiscalização do MTE, observou-se que nos contratos de prestação de serviço e em diversos documentos da Oscip Ises, as assinaturas do presidente do Instituto se tratavam de imagens eletrônicas “clonadas ou coladas”, antes da impressão.

Prejuízo aos cofres públicos

Em que pese a intervenção do Ministério Público visando o cancelamento das parcerias que resultariam no pagamento de um total de R$ 51.665.738,00 (milhões) ao longo de 12 meses ao instituto, ainda assim, a Oscip Ises chegou a receber da Prefeitura de Palmas o montante de R$ 15.322.218,85 (quinze milhões, trezentos e vinte e dois mil, duzentos e dezoito reais e oitenta e cinco centavos). Tal prejuízo aos cofres públicos fica claro em despacho do Superintendente de Contabilidade do Município, Tiago Rodrigues de Morais, que, no dia 10 de abril de 2015, informou ao procurador do município o valor acima para que o mesmo prestasse esclarecimento em atendimento à solicitação do Ministério Público.

O promotor de justiça Edson Azambuja afirmou ao Conexão Tocantins que deve entrar com uma Ação de Improbidade Administrativa contra o prefeito de Palmas visando discutir o ressarcimento dos valores aos cofres da Prefeitura. “Pedi primeiro a suspensão e depois a rescisão do contrato. Agora, cabe uma ação de improbidade para discutir essa questão do ressarcimento”, salientou.

Indenizações Trabalhistas

O Conexão Tocantins indagou ao promotor de justiça Edson Azambuja para saber qual procedimento o Ministério Público Estadual irá tomar para evitar mais um prejuízo aos cofres da Prefeitura de Palmas com indenizações trabalhistas pela responsabilização subsidiária do município na contratação dos servidores da Oscip Ises e o promotor informou que ainda não estava sabendo das decisões judiciais, mas que iria tomar ciência para estudar providências. “Estou sabendo agora por essa informação tua. Eu acompanhei essa demanda até certo ponto e na nossa concepção foi exitosa. A gente instaurou um inquérito aqui na promotoria, 30 ou 40 dias depois da contratação dessa empresa, que soube pela imprensa. Instaurei o procedimento, e fiz estudo minucioso pela contração em si e expedimos a recomendação ao município para que ele suspendesse os contratos [...]. O município firmou cinco termos de parceria e desses cinco, um de cara já derrubamos que foi o da saúde, que estava ilegal. Ouvi todos os secretários, fiz até um inquérito civil bastante produtivo e encaminhei para o Ministério do Trabalho para fazer uma inspeção na ação fiscal, em razão dessa denúncia de que trabalhadores estariam em uma série de situações, que não tinham carteira assinada e tal”, afirmou o promotor.

Segundo Edson Azambuja, logo após a contratação da Oscip Ises pela Prefeitura de Palmas em junho de 2014, ele expediu a recomendação visando o cancelamento das parcerias, mas, na ocasião, já havia mais de mil trabalhadores contratados. “O que eu fiz? ajuizei a ação anulatória, uma ação com a finalidade de anular os contratos e quando foi em dezembro eles rescindiram os contratos. Agora, está respingando. O que que acontece? Quando contrata mal vem as consequências e a Ises, os promotores (de justiça) lá de Aracajú (SE), ajuizaram uma ação para dissolver, extinguir a Oscip Ises em razão de que ela estava sendo usada para fins ilícitos, especialmente para abocanhar dinheiro público de prefeituras da Bahia, do Tocantins e do próprio Estado deles, do Sergipe”, explicou o promotor. 

Edson Azambuja informou que vai instaurar um procedimento para apurar a possível responsabilidade do município em relação aos processos trabalhistas.

Atuação da Oscip e operação da Polícia Federal

A Oscip Ises já foi alvo de uma operação na Polícia Federal, segundo o promotor Edson Azambuja. “Houve intervenção, o poder judiciário lá de Sergipe decretou intervenção a pedido do Ministério Público e além disso, houve uma operação da Polícia Federal que entrou na sede da Oscip e de várias outros órgãos e prefeituras para recolher material porque estava havendo notícias de duplicidade de pagamento, aqui em Palmas não houve isso, cuidei disso, me atentei bem”, afirmou o promotor de justiça.  

A Oscip Ises atuou também neste período em outros municípios do Tocantins a exemplo de Guaraí e Araguaína onde também responde a processos trabalhistas.

Outro município tocantinense onde a Oscip Ises atuou foi Porto Nacional, contratada pelo atual prefeito Otoniel Andrade (PSDB). Depois dos problemas com a justiça a Prefeitura de Porto Nacional também encerrou a parceria com a Oscip no final do ano passado.

Quebra de sigilo Bancário e Fiscal

Em Sergipe, atendendo ação do Ministério Público daquele Estado que argumentou que a Oscip Ises não teria capacidade operacional e financeira para cumprir temos de parcerias firmados com municípios sergipanos, o juiz Cristiano José Macedo Costa, da 10ª Vara Cível de Sergipe, identificou irregularidades em contratos firmados com prefeituras sergipanas e determinou a quebra de sigilo fiscal e bancário e o bloqueio das contas da Oscip Ises.

Além do bloqueio das contas e a quebra do sigilo, o juiz também proibiu a entidade de firmar novos contratos com o Estado e com todas as prefeituras de Sergipe.

Foi nomeada pelo juiz como interventora na Oscip Ises, a contadora perita e auditora Sandra Elvira Gomes Santiago. Na sentença, o juiz solicita informações à Receita Federal, sobre movimentações contábeis da entidade durante o período de 2009 a 2014 e pede informações ao Ministério da Justiça sobre a regularidade da qualificação de Oscip federal do Ises.

O site Conexão Tocantins tentou entrar em contato nos telefones divulgados pela Oscip Ises para obter posicionamento sobre a decisão da entidade de deixar os processos trabalhistas correrem à revelia, mas nenhuma ligação foi atendida. O site continua disponível para o posicionamento do instituto.