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Opinião

Foto: Divulgação

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A equipe econômica tem reiterado ultimamente que para a recuperação do País não está descartada a revisão do quadro fiscal e tributário, o que em linguagem comum quer dizer aumento das alíquotas atuais ou criação de novos impostos. Por se tratar de tema polêmico e extrema rejeição popular o governo tem sido reticente, mas é certo que esse caminho deve ser seguido como alternativa para reorganizar e equilibrar as contas públicas. Acredito que nesse bojo de possíveis novos tributos poderá vir a ser incluída a conhecida CPMF (Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira), com esse ou outro nome, mas com a mesma essência.

Caso isso se concretize, acredito ser a melhor saída; dos males o menor em se tratando de aumento da já pesada carga tributária, porque comparativamente a outros impostos tem algumas vantagens, como alíquota palatável para os pobres, mas significativa ao ser aplicada às grandes movimentações e fortunas; tem prazo de validade; gera considerável volume de arrecadação; não há como sonegá-la; é poderoso antídoto contra a corrupção. Tudo isso, como se verá na sequência desta análise.

A origem da CPMF remonta ao governo Itamar Franco, quando foi instituído o Imposto Provisório sobre Movimentação Financeira (IPMF). Criado em 13 de julho de 1993, vigorou de 1º de janeiro de 1994 até 31 de dezembro de 1994, durante a implementação do Plano Unidade Valor de Referência (U.V.R.). Tinha uma alíquota de 0,25% que incidia sobre os débitos lançados nas contas mantidas pelas instituições financeiras e transações gerais da economia. Mostrou-se mais eficaz que o Imposto de Renda, pois gerava muito mais recursos sem possibilidade de sonegação. Em 2007, o governo comemorou a arrecadação recorde de janeiro a agosto desse ano em R$ 23,7 bilhões, sendo este um dos argumentos para sua prorrogação, que acabou sendo vetada.

Em 1996, no governo Fernando Henrique Cardoso, foi instituída a CPMF, que passou a vigorar em 23 de janeiro de 1997.  A contribuição provisória foi extinta em 23 de janeiro de 1999, tendo sido substituída pelo IOF até seu restabelecimento em 17 de junho de 1999. A alíquota, que era originalmente de 0,25% foi elevada na época de seu restabelecimento para 0,38%. Em 17 de junho de 2000 foi reduzida para 0,30% e em 19 de março de 2001 novamente elevada para 0,38%. A proposta de prorrogação da contribuição foi rejeitada pelo Senado em dezembro de 2007.

Diferentemente do IPMF, a CPMF era uma contribuição destinada especificamente ao custeio da Saúde Pública, da Previdência Social e do Fundo de Combate e Erradicação da Pobreza. No começo, a totalidade da arrecadação era destinada ao Fundo Nacional de Saúde. A partir de 1999, com a Emenda Constitucional 21, a CPMF passou a destinar parte de seus recursos à Previdência Social e à erradicação da pobreza. No final de sua vigência, a Previdência Social e a erradicação da pobreza recebiam aproximadamente 26% e 21% da arrecadação, respectivamente. Na madrugada do dia 13 de dezembro de 2007, o Senado rejeitou a proposta de prorrogação da CPMF até 2011. A vigência da CPMF terminou no dia 31 de dezembro de 2007.

Para os críticos da CPMF, a grande desvantagem do imposto é que ele é regressivo, ou seja, penaliza as classes mais baixas. Isso ocorre porque quem mais faz transações financeiras são as empresas e elas tendem a repassar esse custo para o preço final dos produtos. As classes mais pobres têm pouco espaço para poupar e, em geral, gastam tudo que ganham. Por isso, impostos indiretos, que incidem sobre produção e consumo, acabam pesando proporcionalmente mais sobre os mais pobres. Enquanto impostos diretos sobre renda e propriedade (IR, IPTU e IPVA, por exemplo) atingem basicamente os grupos mais abastados. A CPMF foi considerada, entre todas as alternativas de tributos, o caminho que traria menores distorções na economia e menor impacto inflacionário. Esse é o imposto mais distribuído, incidindo de maneira equitativa entre todos os setores da economia.

Economistas que defendem a retomada da CPMF observam três vantagens principais: 1) é um imposto que tem uma alíquota baixa, mas, como incide sobre um número grande de operações, por isso gera uma resposta rápida em termos de arrecadação; 2) é fácil de cobrar e pagar, mas difícil de sonegar; 3) seu impacto na inflação tende a ser baixo em comparação com outros tributos que incidem diretamente sobre produtos, como por exemplo a Cide (taxa cobrada sobre gasolina e diesel).

O cidadão comum tem natural resistência a qualquer novo tributo, com a CPMF não é diferente. Mas, se as empresas nada perdem porque repassam o ônus ao consumidor, então por que os empresários são contra? Talvez pelo fator que comento em seguida ao falar da importância dessa contribuição obrigatória no combate à sonegação e à corrupção.

Há pouco mais de uma semana o governo divulgou o chamado “rombo fiscal” para o ano que vem: R$ 139,5 bilhões. Alguns dias antes o Sindicato acional dos Procuradores da Fazenda(Sinprofaz)  implantava em Porto Alegre o ‘sonegômetro’, registro pontual dos valores que são sonegados no Brasil – algo semelhante, mas no sentido oposto, ao ‘impostômetro’, das Associações Comerciais. Pasmem! Diz a entidade que  calote aos cofres públicos passou de R$ 304 bilhões, mostra o placar online da sonegação fiscal, acrescentando que isso daria para construir 10.566.231 postos de saúde equipados. Basta simples comparação para se concluir onde realmente está o rombo financeiro do governo. O Sinprofaz destaca que não é só o volume do prejuízo que importa, mas a relação direta entre sonegação fiscal e corrupção.

Vale lembrar que está em curso a Operação Zelotes, da PF (iniciada em março deste ano), que desbaratou esquema de corrupção no Conselho de Administração de Recursos Fiscais (CARF), órgão colegiado do Ministério da Fazenda, responsável por julgar os recursos administrativos de autuações contra empresas e pessoas físicas por sonegação fiscal e previdenciária. Pelo menos 70 empresas estão sendo investigadas, destacando-se alguns dos maiores grupos empresariais do Brasil, entre os quais  Gerdau, BankBoston, Mundial-Eberle, Ford, Mitsubishi, Banco Santander, Bradesco, Banco Safra e o Grupo RBS, afiliado da Rede Globo no Rio Grande do Sul. O Partido Progressista também está sendo investigado.

Voltando aos dados do Sinprofaz, o valor estimado de sonegação tributária é superior a tudo que foi arrecadado em 2011 de Imposto de Renda (R$ 278,3 bilhões). Para chegar ao índice de sonegação, o estudo selecionou tributos que correspondem a 87,4% do total da arrecadação tributária no Brasil, entre eles os impostos de Renda, sobre Produtos Industrializados (IPI), sobre Operações Financeiras (IOF) e  sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS); as contribuições ao Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins) e sobre o Lucro Líquido (CSLL), além do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS). É de se perguntar: com um tributo que pega toda a movimentação financeira haveria tanta sonegação? Para quem sonega é bom que não haja CPMF.

Da sonegação, passemos à sua irmã gêmea, a corrupção. Creio ser desnecessários relembrar os endêmicos escândalos de corrupção, antigos, passados, recentes e recentíssimos que saquearam o erário e empresas estatais. Dizia-se que a impunidade incentivava, porém, nota-se que o mal é tão forte que condenações no Mensalão não inibiram, surgiram novos agentes e outros reincidentes, a corrupção é uma metástase...

Vem a interrogação natural: como elevadas quantias de dinheiro vivo passam de mão em mão, fortunas são desviadas para o exterior sem que sejam detectadas? Chega-se à conclusão que se houvesse mecanismo fiscal e tributário atuando na raiz tais operações seriam inibidas e até flagradas. Acredito que a CPMF poderia ser esse mecanismo. Todavia, sua implantação depende de lei e o instituto legal deve ser claramente definido, desde a destinação específica da arrecadação até o prazo de vigência se for contribuição “provisória”, ou a substituição de todos os demais tributos de natureza fiscal e financeira, como o IOF, por exemplo.

Finalizando, concordo que apesar das divergências, prós e contras, a CPMF não é uma solução definitiva para o problema fiscal e é necessário implantar reformas que reduzam o ritmo de crescimento do déficit ocasionado por despesas obrigatórias – como as aposentadorias – e que se adotem medidas para o país retomar o crescimento econômico. Mas, se for para enfrentarmos um novo imposto que seja então a CPMF, que tem aspectos positivos.

Luiz Carlos Borges da Silveira é médico, ex-ministro da Saúde, ex-secretário de Ciência e Tecnologia do Governo do Estado do Tocantins e ex-secretário do Desenvolvimento Econômico, Ciência e Emprego do Município de Palmas-TO