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Opinião

Foto: Divulgação

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A Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Pandemia está provocando grandes polêmicas pelos corredores do Congresso Nacional. Determinada pelo ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal (STF), no último dia 8 de abril, com objetivo de apurar eventuais omissões do Governo Federal no combate a crise sanitária provocada pela Covid-19, a comissão virou uma batalha nos bastidores políticos. O presidente do Senado Federal, Rodrigo Pacheco decidiu, após idas e vindas, unir os requerimentos apresentados pelos senadores Eduardo Girão e Randolfe Rodrigues e, assim, além da comissão investigar o governo federal, irá avaliar o uso de recursos da União repassados a estados e municípios.

Na visão do presidente do Senado as propostas de CPI tratam de "assuntos conexos" e que há precedente para a unificação de objetos determinados de dois pedidos distintos. Segundo o parlamentar, o segundo requerimento quer apurar possíveis irregularidades no uso de recursos transferidos pela União para combate à pandemia. Os alvos serão administradores federais, estaduais e municipais, que serão avaliados por prováveis contratos irregulares, fraudes em licitações, superfaturamentos e desvios. O presidente Rodrigo Pacheco observou que a comissão ficará restrita a operações efetuadas com recursos transferidos pela União. 

A ampliação da CPI é polêmica tanto do ponto de vista político, quanto legal. Embora não seja vedada pelo texto constitucional, a instalação de uma CPI ampla encontra obstáculo no Regimento Interno do Senado, que, em seu artigo 146, diz: 
Não se admitirá comissão parlamentar de inquérito sobre matérias pertinentes: 

I - à Câmara dos Deputados;  
II - às atribuições do Poder Judiciário;  
III - aos Estados.

Dessa forma, o texto legal do regimento interno da Casa é claro sobre o impedimento de um CPI sobre matérias pertinentes aos Estados. Importante destacar que a apuração sobre como os recursos financeiros são gastos por governadores e prefeitos, e se houve desvios, é uma prerrogativa das assembleias legislativas e câmaras municipais realizarem investigações. Ou seja, resta claro que a CPI que ocorrerá no Senado Federal não poderá apurar quaisquer fatos relativos a Estados.

Caberá aos senadores apurarem a atuação do Governo Federal e os desdobramentos dos fatos que envolvem recursos federais encaminhados a Estados e municípios. Os fatos relacionados às verbas federais podem ser alvo de inquérito, mas não se pode investigar necessariamente Estados e municípios em uma CPI federal.

O pedido de ampliação da CPI possui também outro vício, pois segundo o artigo 58, parágrafo 3º, da Constituição Federal, a CPI deve obrigatoriamente ter um objeto determinado. Isso não quer dizer, nas palavras do próprio STF, que a CPI deve cuidar-se de um único fato. Pode haver mais de um fato. Entretanto, esses fatos devem estar muito bem delineados, sob pena de se tornar inconstitucional.

Questionável do ponto de vista constitucional, a nova versão da CPI, que é pretendida pelo presidente Jair Bolsonaro e seus aliados, não deve ter sucesso. Bolsonaro, em uma mensagem de desespero político, teve uma conversa, nada republicana, vazada pelo senador Jorge Kajuru (Cidadania-GO), na qual cobrava que senadores aliados ampliassem o objeto da CPI e peticionassem o Supremo pedindo o impeachment de ministros da Corte, fatos que poderiam travar a comissão.

Cumpre relembrar que a CPI da Pandemia tem por alvo apurar omissões do governo federal durante a crise sanitária, especialmente no episódio de falta de oxigênio no Estado do Amazonas. Destaque-se que há fortes indícios que o Ministério da Saúde teve informações e solicitações de auxílio mais de 10 dias antes da eclosão do caos no referido estado. Mas uma questão há que ser feita: evidenciada a omissão do governo federal, quais consequência decorrerão da CPI? Poderá punir o presidente? Não, apurados os fatos supostamente ilegais a Comissão Parlamentar de Inquérito encaminhará ao Ministério Público para que tome, se assim entender, medidas judiciais cabíveis, tanto na seara cível como criminal. Na atual composição do Senado Federal qual a chance da conclusão da CPI seja pelo reconhecimento da omissão de Bolsonaro?

*Marcelo Aith é advogado especialista em Direito Público e professor convidado da Escola Paulista de Direito (EPD).