Um Projeto de Lei (PL 410/2022) que tramita no Congresso Nacional pode acabar com a inspeção para modificação de veículos e, com isso, incentivar o trânsito de carros, motocicletas, caminhões ou ônibus modificados irregularmente, incluídos aqueles recuperados de sinistros, trazendo maiores riscos de acidentes de trânsito. A autoria do PL é do deputado federal Luis Miranda (União-DF).
A modificação veicular vai além da customização do veículo pelo proprietário, como o rebaixamento da suspensão ou instalação de acessórios estéticos. É mandatória para veículos que necessitam se adequar a aplicações específicas, como um food trucks ou caminhões que trocam a carroceria aberta para uma caçamba basculante.
O tema está previsto no artigo 106 do Código de Trânsito Brasileiro (CTB) e regulamentado pelo Conselho Nacional de Trânsito (Contran). A emissão do certificado de segurança veicular (CSV) - por parte de instituições técnicas licenciadas pela Secretaria Nacional de Trânsito (Senatran) – e acreditadas pelo Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia (Inmetro) - assegura que as alterações promovidas seguem previsões técnicas e legais, salvaguardando a integridade física do proprietário do veículo, dos demais ocupantes e daqueles que trafegam pela mesma via do veículo modificado.
A direção da Federação Nacional da Inspeção Veicular (Fenive), entidade que reúne 240 empresas do Brasil, alerta para os riscos da aprovação desse projeto e se diz preocupada com uma declaração do deputado federal Luis Miranda, em um canal do Youtube.
“O deputado declara que a intenção não foi somente desburocratizar o processo de modificação veicular, mas deixar que os proprietários de veículos façam o que quiserem, sem qualquer tipo de controle por parte das autoridades de trânsito. Ele diz que não haverá mais a necessidade de inspeção pelo Inmetro, o que não é verdade, pois o projeto aprovado na CVT não diz isto. Fim de inspeções para regularização dos veículos modificados seria uma afronta à necessidade de aprimorar a segurança viária, reduzindo as mortes e lesões no trânsito”, conta o diretor-executivo da Fenive, Daniel Bassoli Campos.
Para Mauro Gil Meger, vice-presidente do Observatório Nacional de Segurança Viária (ONSV), a falta de controle pela autoridade de trânsito poderá facilitar o aumento no número de veículos irregulares, gerando riscos de acidentes por falhas mecânicas, causados por falta de manutenção ou alterações não previstas. “Caso esse projeto seja aprovado, é motivo de grande preocupação. Atualmente, o Brasil tem a frota de carros mais velha em 25 anos e qualquer situação de modificação no veículo, sem qualquer tipo de controle, pode trazer riscos”, destaca.
O vice-presidente da ONSV ressalta que a autorização prévia é uma garantia de segurança viária pois, depois que a alteração é feita no veículo, não há como saber se será realizada a inspeção posterior. “Muitos esperam ser abordados por autoridades para tomar atitude de inspeção”, comenta Mauro Gil Meger.
Como é hoje
O processo de regularização do veículo modificado se inicia com a escolha da lista das mudanças previstas no sistema pelo Departamento Estadual de Trânsito (Detran). Atualmente, esta escolha é feita no momento da emissão da autorização prévia, através de comunicação entre Detran e o Sistema de Certificação de Segurança Veicular e Vistorias (SISCSV).
A empresa de inspeção é a entidade mais apropriada para indicar ao sistema as alterações técnicas que podem ser realizadas, pois está em contato direto com o cidadão, que informa o que pretende fazer, evitando erros no processo, pois o proprietário não é um técnico da área. “Além disso, pode haver risco para o usuário, já que não haverá garantia que o veículo esteja sendo modificado corretamente, dentro das possibilidades permitidas pelo Contran e dos requisitos técnicos necessários. Se o cidadão realizar alteração insegura ou não permitida, corre o risco de ter a sua regularização indeferida pelo órgão de trânsito, com perda de tempo e dinheiro”, explica Bassoli.
A diretoria da Fenive dá outros exemplos de modificações que podem ser realizadas e afetam a sociedade. É o caso do aumento de decibéis emitidos por uma motocicleta ou de lotação em ônibus e microônibus. “Não defendemos o fato de o Detran interferir na vontade do cidadão em modificar o seu bem. Pelo contrário. Mas há necessidade de uma informação prévia do cidadão ao órgão de trânsito para que seja orientado corretamente sobre os requisitos técnicos e legais”, salienta o diretor-executivo da entidade.
Tramitação
O Projeto de Lei nº 410, de 2022, que altera a Lei nº 9.503, de 1997, para extinguir a prévia autorização exigida para a modificação de veículos, foi aprovado pela Comissão de Viação e Transporte da Câmara dos Deputados, com apresentação de um substitutivo por parte do relator, deputado Darci de Matos. O texto seguiu para a Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJ). A Fenive está entregando aos deputados federais um documento, solicitando que a CCJ e Senado não suprimam a autorização prévia, mas que o seu conceito seja alterado para “informação prévia”, com desenvolvimento de solução informatizada, sem cobrança de taxas pelos órgãos estaduais de trânsito. Além disso, solicita uma audiência pública na CCJ, na qual pretende demonstrar a importância da regulamentação das modificações veiculares e da atividade de inspeção de segurança veicular.
“Este assunto requer debate amplo entre as partes interessadas na segurança viária, com apoio de especialistas. Não entendemos o porquê da celeridade na aprovação deste projeto, que deveria passar por audiências públicas e pelo plenário da Câmara.”, comenta Daniel Bassoli Campos.