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Opinião

João Badari é advogado especialista em Direito Previdenciário

João Badari é advogado especialista em Direito Previdenciário Foto: Divulgação

Foto: Divulgação João Badari é advogado especialista em Direito Previdenciário João Badari é advogado especialista em Direito Previdenciário

A advocacia acordou no último dia 6 de junho de 2022 com uma inesperada notícia: o não pagamento dos precatórios federais destacados para 2022. Estes pagamentos ocorreriam nos próximos meses, porém o Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) informou que os mesmos não seriam pagos.

Já era esperado que todos os precatórios federais não fossem pagos neste ano, tal redução de pagamentos foi amparada pelas emendas constitucionais 113 e 114, originadas pela PEC dos Precatórios.

A aprovação da PEC dos Precatórios estabeleceu um limite para o pagamento e foi uma das formas encontradas pelo Governo Federal para furar o teto de gastos e enviar o dinheiro devido para o pagamento de outras despesas, como o Auxílio Brasil.

Mas afinal, o que são precatórios? De uma forma bem simples: os precatórios são dívidas públicas decorrentes de processos judiciais. Se a União perde uma ação judicial e passa a ter como credor um particular, se o valor exceder 60 salários-mínimos ele se torna um precatório, que é o termo utilizado para definir a dívida.

E a consequência prática do não pagamento de uma dívida é a perda confiança do mercado com relação ao devedor. Isto traz um sério abalo na credibilidade do país com relação a sua responsabilidade financeira, de maneira nacional e fora do Brasil. Arcar com as próprias dívidas é pressuposto básico de credibilidade.

Estes valores que não serão pagos vão trazer terríveis consequências na vida dos idosos brasileiros, que aguardam por anos (alguns, décadas), o pagamento do seu processo judicial que a União foi derrotada. São pessoas de idade avançada que estavam contando com este valor para custear gastos básicos como plano de saúde, remédios, alimentação, higiene, moradia e vestuário. 

E com essa nova medida da Justiça Federal, tivemos mais um capítulo desta assombrosa novela, onde os precatórios que serão pagos no ano de 2022, a parte contratual destacada pelos advogados não será paga este ano. E não existe previsão para o pagamento.

Quando o advogado ajuíza uma ação contra o INSS, na maioria dos casos ele faz um contrato de risco, onde só irá receber valores se o cliente vencer a causa. Após a vitória o advogado possui contratualmente direito a uma porcentagem, limitada pela tabela da OAB, ao valor que venceu. O destaque de precatório é a possibilidade prevista em lei de peticionar o seu contrato de prestação de serviços no processo e pedir para o juiz dividir a sua parte. Simples assim.

Portanto, o valor é o mesmo, ele não se diferencia do valor principal, onde o magistrado apenas já divide o que é devido a quem. E agora, surpreendentemente, temos a divulgação de que os honorários destacados não serão pagos este ano.

Esta decisão foi tomada pelo TRF da 4ª Região, e entendemos ser ilegal, não apenas pelo caráter alimentar deste recebimento, mas também pelo motivo do valor destacado não poder ser diferenciado do valor do seu cliente.

Os advogados que por anos batalharam por seus clientes não irão receber pelo fruto da sua conquista, e advogado vive de honorário, é com estes valores que custeia seu escritório e também a sua vida pessoal, por isso o cunho alimentar da obrigação.

O TRF4 incluiu de maneira indevida os honorários advocatícios no quinto escalão de recebimentos, junto das dívidas da Fazenda Nacional de caráter não alimentar. O próprio CPC de 2015 estabelece em seu artigo 85, §14, que os “honorários constituem direito do advogado, e tem natureza alimentar, com os mesmos privilégios de créditos oriundos da legislação do trabalho”. Este também é o entendimento do Superior Tribunal de Justiça ao julgar o Tema 637.

Não existe diferenciação entre um honorário destacado e os sucumbenciais, nem mesmo com relação ao destinatário, seja ele uma sociedade advocatícia ou um advogado pessoa física. Ambos têm como finalidade alimentar o seu recebedor.

A Resolução 458 de 2017 do Conselho da Justiça Federal estabelece que o destaque de honorários não implica a emissão de ordens de pagamentos distintas, condicionando este recebimento ao pagamento do principal. Como não podem ser diferenciadas, as ordens de pagamento devem ocorrer conjuntamente, demonstrando clara ilegalidade o entendimento contrário.

 Como existe a preferência no pagamento dos honorários sucumbenciais e contratuais que possuem o reconhecido caráter alimentar, não se pode desconsiderar a preferência dos honorários destacados. Isso causa até mesmo uma quebra no princípio da isonomia, pois o advogado que venceu demanda contra a União e não destacou seus honorários irá receber preferencialmente, porém o colega que venceu a mesma demanda, e utilizou a prerrogativa legal de destacar sua parte, não irá.

A situação é tão teratológica que teremos advogados, dentro de um mesmo processo, que pediram para destacar a sua parte, levando ao juiz o seu contrato e a concordância do cliente, que não irão receber e o outro colega que irá, pois não pediu para separar os valores. É isso mesmo, dentro do mesmo processo esta situação irá ocorrer.

Os honorários advocatícios destacados são parte integrante do valor devido a cada credor, como estabelecido pela Resolução 670 de 2020 do Conselho da Justiça Federal, não sendo considerado outra espécie de precatório ou crédito acessório do valor principal.

E aqui trazemos para o debate a questão da informalidade e do recolhimento de impostos. Os advogados que destacam seus honorários mostram claramente para a Receita Federal o quanto receberam e recolhem os tributos referentes a este recebimento. Prejudicar quem faz o correto é estimular a informalidade e sonegação de impostos.

Frisamos: a verba a ser paga é a mesma, onde o precatório destacado é parte do precatório total. De forma obrigatória, jurisprudencial, legal, principiológica e conceitual um não se desvincula e acompanha o outro. O precatório principal e o destacado não são frutos diferentes da mesma arvore, e sim o mesmo fruto, onde o destacado é a parte do advogado que foi quem plantou esta arvore e a regou. Nada mais justo que se alimente deste fruto no mesmo momento que seu cliente.

Esperamos que os Tribunais Regionais Federais não adotem tal procedimento, e que o TRF4 revise esta orientação, pois a mesma se mostra evidentemente ilegal, indo contra o Estatuto da OAB, Resoluções do CJF e tema julgado pelo STJ. A preferência de pagamento da verba alimentar deve ser respeitada, pois é fruto de árduo trabalho e é a subsistência do advogado.

*João Badari é advogado especialista em Direito Previdenciário e sócio do escritório Aith, Badari e Luchin Advogados.