Um garimpeiro e criador de gado que nasceu em Lizarda em 1926, mas saiu de casa há mais de 55 anos e deixou um bilhete escrito à mão para a esposa, no qual conta os planos de viver com ela em Pedro Afonso, terá a morte registrada em cartório por decisão judicial. A sentença que declara a morte dele é da juíza Aline Marinho Bailão Iglesias, da Comarca de Novo Acordo, publicada nesta segunda-feira (27/5).
A decisão tem por base artigos do Código Civil que tratam da morte presumida, um conceito jurídico previsto para situações em que não haja provas concretas da morte da pessoa e o corpo não tenha sido encontrado.
Conforme a “ação declaratória de morte presumida”, apresentada por filhos do garimpeiro, o pai escreveu uma carta a punho, com local de origem em Pedro Afonso no dia 15 de julho de 1968, com a intenção de se despedir da esposa, com quem havia se casado em 1951.
No bilhete, apresentado pela família na ação judicial, o homem prometia buscar a esposa junto com os 5 filhos do casal para morar em Pedro Afonso para educarem os filhos. O homem pede que a esposa separe 5 cabeças de gado para custear as despesas, nomeia um compadre que iria buscar a família de carro e se despede no texto como “seu velho e amo que não lhe esquece”.
A mudança não se concretizou, segundo os filhos que entraram com o processo em setembro de 2023. Na ação, afirmam que o pai “nunca mais foi visto ou deu notícias” e a mãe “sempre indagava conhecidos e parentes” sobre o paradeiro do marido, mas ficou sem respostas até sua morte, no dia 3 de agosto de 2015.
Os filhos também afirmam ter feito buscas ao longo de todos esses anos e nunca o localizaram, nem tiveram quaisquer notícias do pai, que, se estivesse vivo, estaria com 98 anos. “Levando-se em consideração as condições precárias de vida, costumava trabalhar em garimpo e era alcoólatra, possivelmente, já tenha falecido”, escrevem.
Assinam a ação, filhos e filhas com 59 e 70 anos de idade, que residem em Guaraí e outras cidades do Tocantins e de outros estados, além de três netos com idade de 33, 34 e 37 anos, descendem de um dos filhos do desaparecido que morreu de câncer e também respaldam o pedido.
Decisão baseada em julgados anteriores
Ao decidir o caso, a juíza afirmou que o Ministério Público se manifestou favorável ao pedido porque, além do abandono familiar, os filhos declaram que ele era alcoólico e trabalhador rural e as estatísticas apontam que a idade dele ultrapassou, “em muito a expectativa de vida do homem médio brasileiro, pois estaria hoje com quase cem anos”.
“Este panorama, contextualizado ao fato de que todas as buscas por seus registros retornaram negativos, dão vazão ao pedido de decretação da morte presumida” - juíza Aline Bailão.
Para a juíza, em razão do tempo passado desde o bilhete é eloquente a probabilidade de morte do garimpeiro e não é preciso um processo para definir a sucessão. “Considerando o tempo transcorrido, e a idade dos possíveis herdeiros, não se afigura razoável aguardar-se o transcorrer dos prazos para abertura de sucessão provisória e definitiva”, escreve, com base na jurisprudência, que respalda esse tipo de decisão quando a morte se mostra extremamente provável.
A juíza determinou a expedição de ofício ao cartório de registros para a elaboração da certidão de óbito extemporânea e a data da morte será 15 de julho de 1968, data do bilhete, por ser a última data em que o falecido teve seu paradeiro conhecido. (TJ/TO)